26 Março 2019
Da economia estimada de 1 trilhão de reais, 75% virão da subtração de direitos dos pobres. E não do corte de privilégios das corporações.
Embora não tenha os votos suficientes no Congresso – e embora as últimas disputas entre aliados dificultem a tramitação do projeto -, o governo Bolsonaro promete aprovar a reforma da Previdência no primeiro semestre. Entenda o que está em jogo.
O artigo é de Eduardo Fagnani, doutor em economia e professor do Instituto de Economia da Unicamp, publicado por CartaCapital, 25-03-2019.
Ajustar periodicamente as regras da Previdência é necessário. Países desenvolvidos o fazem sem destruir a proteção social. Aqui nem sequer se trata de alguma ‘reforma’ para ajustar. Na ausência de diagnóstico e de debate, procura-se impor transformações estruturais cujo propósito – não manifestamente declarado – é sepultar o pacto social de 1988 e destruir a Seguridade Social, transitando-se para o Seguro Social e para o assistencialismo.
A proposta é uma nova peça do projeto ultraliberal em implantação, cujo único objetivo é introduzir diretrizes transitórias até que a verdadeira reforma seja feita por meio de dezenas de leis complementares, mais fáceis de serem aprovadas no Congresso.
Enquanto uma Emenda Constitucional exige o apoio de 308 deputados e 49 senadores, em duas votações em cada Casa, uma legislação complementar demanda 257 votos de deputados, em duas votações, e 41 de senadores, em uma votação. Portanto, busca-se apenas “desconstitucionalizar” as regras atuais, o que deve ser rechaçado com contundência. Caso contrário, mudanças futuras poderão ser feitas por atos normativos do Executivo e por Medidas Provisórias.
A “reforma” é a ventania que antecede a tormenta. O que é ruim pode ficar muito pior.
A proposta fixa regras severas para o Regime Geral da Previdência Social e desconsidera a realidade do mercado de trabalho. A População em Idade Ativa é composta de 170 milhões de brasileiros. Desse total, cerca de 40 milhões são adultos e estão fora da força de trabalho.
A População Economicamente Ativa contempla 105 milhões de trabalhadores, estando mais de 12 milhões em situação de desemprego (aberto) e cerca de 35 milhões trabalham sem carteira ou têm vínculo precário. Portanto, aproximadamente 90 milhões de brasileiros que já não contribuem terão mais dificuldade para cumprir as novas regras previdenciárias e, provavelmente, ficarão sem qualquer proteção na velhice. Em 2017, quase a metade dos trabalhadores ocupados recebia, em média, 747 reais por mês, 19,5% abaixo do salário mínimo vigente. O rendimento médio real domiciliar per capita era de 1.242 reais
A “reforma” fixa regras excludentes para o regime geral:
O governo estima uma economia de 1,165 trilhão de reais em uma década. Desse montante, 75,6% decorrem da subtração de direitos dos “privilegiados” do INSS (rural e urbano), do BPC e do Abono Salarial. Ou seja, dos mais pobres.
Além de crescimento econômico, é necessário buscar equidade na contribuição das classes, restringindo-se os privilégios concedidos ao poder econômico e às camadas de alta renda. É preciso que se desmonte, no Brasil, o maior programa mundial de transferência de renda dos pobres para os ricos.
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Entenda como a reforma da Previdência aprofunda as desigualdades - Instituto Humanitas Unisinos - IHU