13 Março 2018
Nesta terça-feira, é o quinto aniversário da eleição do Papa Francisco. Os dados de novas pesquisas destacam, para mim, um grande principal para os bispos, o clero e os líderes leigos da Igreja Católica nos Estados Unidos: há uma campanha organizada para tirar os méritos do Papa dentro da comunidade católica, e vem apresentando algum sucesso.
Mas hoje eu também gostaria de observar o quanto Francisco comove profundamente muitos católicos dos EUA através das lentes do discurso de terça-feira do presidente da AFL-CIO, Richard Trumka, na Seton Hall University.
A reportagem é de Michael Sean Winters, publicada por National Catholic Reporter, 09-03-2018. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Os dados de pesquisas do Pew Research Center mostram que, embora a taxa de aprovação de Francisco permaneça robusta, conservadores católicos nos EUA estão menos entusiasmados com o Papa do que três anos atrás. Por exemplo, 55% dos católicos republicanos e simpatizantes dizem que o Papa está "muito liberal", em comparação com apenas 23% há três anos. A porcentagem de todos os católicos estadunidenses que acham que Francisco representa uma "grande mudança para melhor" caiu de 69% para 58%. Não é difícil encontrar a fonte desse declínio: entre os católicos republicanos e simpatizantes, a queda é ainda maior, de 60% em 2014 para 37% em 2018.
Comentando os dados, Greg Smith, diretor do centro de pesquisas, disse a Jack Jenkins, do Religion News Service: "Os católicos que são republicanos ou simpatizam com os republicanos ficaram mais negativos em relação ao Papa Francisco. Acho que esta pesquisa evidencia de forma muito clara que as atitudes católicas sobre o Papa Francisco ficaram muito polarizadas nas linhas partidárias."
Depois de anos referindo-se aos católicos liberais com uma variedade de nomes depreciativos, como "católicos de lanchonete" ou "católicos só no nome", e insistindo que eles eram "católicos em primeiro lugar", parece que muitos republicanos são na verdade republicanos em primeiro lugar e católicos em segundo, assim como os liberais que eles antes acusavam. Todo mundo parece estar na fila desta cafeteria.
Bill Donohue, líder da Liga Católica, afirma estar no papel de cavaleiro resplandescente para a Santa Madre Igreja e não perde tempo de ofender. Mas não questionou os números do Pew Research Center nem salientou que a verdade de uma reivindicação religiosa não é determinada por sondagem ou quaisquer dados de ciências sociais, como poderia se esperar de um conservador.
"Não vai ser fácil o Papa mudar estes números. Se um terço dos católicos o veem como 'liberal demais' e um quarto como 'ingênuo', as perspectivas de reverter esse quadro não são as melhores", disse Donohue, em um comunicado, sem uma única palavra de defesa para o pontífice. Há muito tempo eu achava Donohue um convencido. Agora ele se demonstra uma fraude. Os novos números do Pew Research Center me lembram de um diálogo entre o cardeal de Chicago Blase Cupich e E.J. Dionne, na Universidade de Chicago, em novembro do ano passado, em que o cardeal disse: "Eu não acho que as pessoas estejam escandalizadas pelo Papa. Acho que estão dizendo para elas ficarem escandalizadas. Existe uma diferença."
Bingo. Quando a programação noturna do EWTN e as páginas do National Catholic Register estão cheias de hostilidade constante a Francisco, não é de surpreender que o número de votos comece a cair entre as pessoas que recorrem a esse tipo de imprensa.
É um desafio para os bispos dos Estados Unidos. Reitero meu desafio especificamente para o bispo auxiliar de Los Angeles, Robert Barron: seja qual for o motivo para fazer um anúncio no Register, tendo em conta esses números que demonstram desaprovação ao Papa, por que ele não insiste que retirem esse anúncio?
Barron não é burro. Ele sabe como e por que os números das pesquisas são o que são. Por que ele permite que o seu bom nome e escritório apostólico sejam associados à tentativa perturbara — que tem certo sucesso — da mídia católica conservadora de derrubar Francisco?
Não importa o que esteja acontecendo nos círculos conservadores, quem foi ao Seton Hall em South Orange, Nova Jersey, na palestra de Trumka sobre o Papa Francisco na terça-feira à noite, viu qual é o sentimento da classe trabalhadora em relação ao Papa.
(Transparência total: tive certa participação ao ajudar os organizadores deste evento, pelas relações com o trabalho organizado que fiz quando estava ajudando Stephen Schneck nas conferências "Erroneous Autonomy" [Autonomia Errônea, tradução livre], co-patrocinadas pela AFL-CIO e pelo Instituto de Pesquisa de Políticas e Estudos Católicos, cujo direto visitante do Centro Greenberg de Estudos de Religião na Vida Pública do Trinity College.)
Todos os três palestrantes no evento de 6 de março — Trumka, o cardeal de Newark Joseph Tobin, Nova Jersey, e Phil Murphy, governador de Nova Jersey — foram aplaudidos várias vezes no meio de sua fala, ao citarem diferentes declarações do nosso Santo Padre. Entre os observadores da Igreja mais experientes da imprensa, concordava-se amplamente que Trumka compreende Francisco melhor do que a metade dos bispos e muitos teólogos.
Essa compreensão é mais profunda do que a hostilidade compartilhada aos paradigmas e às políticas da economia neoliberal. Trumka entende o significado espiritual do trabalho, de uma forma que os nossos mercados não entendem. Ele e os trabalhadores que representa sabem o que é a verdadeira solidariedade, o que é preciso para construí-la e o quanto ela está ameaçada pelos ricos e poderosos e as ideias que apoiam.
No jantar pós-evento, ouvi uma mistura de risos e resmungos quando lembrei um palestrante de um evento do Instituto Napa/Faculdade de Administração da Universidade Católica que citava as recepcionistas do Walmart como um exemplo de solidariedade no local de trabalho. Mas a falta de solidariedade em nossa sociedade não é um tema engraçado, e as reflexões de Trumka sobre Francisco trataram a necessidade de gerar mais solidariedade com a inteligência intelectual e moral que o assunto exige. Todos deveriam ler o texto completo das observações de Trumka, disponível aqui. Duas partes da palestra não apenas apontam para como o movimento operário estadunidense e o Papa estão cantando a mesma música, mas também atestam a liderança moral de Trumka. Quinze anos atrás, não se escutava um líder sindicalista falar em defesa dos imigrantes de forma tão apaixonada, nem um mineiro falar da urgência moral de ser uma economia de baixo carbono. Ao contrário dos libertários, cujo livro revisei na quarta-feira, Trumka não tem procurado fazer sua tradição religiosa conformar-se a qualquer ideologia política. Em vez disso, ele permite que sua fé desafie as conclusões que seus políticos ditaram anteriormente.
Tenho certeza que Trumka não quer fazer do movimento operário um braço da Igreja Católica. Não se trata disso. Na diversidade da nossa sociedade, sempre haverá áreas em que seu compromisso com os trabalhadores vai lhe colocar em desacordo com a Igreja Católica em determinadas questões. A questão é que ele demonstra uma vontade de reavaliar seus próprios pressupostos característicos de uma pessoa moralmente séria de uma maneira que muitos católicos conservadores e libertários já não são.
Observo que quem recebeu a maior ovação da noite foi Tobin, quando disse que estava muito orgulhoso que os bispos dos Estados Unidos apresentaram um amicus curiae apoiando o direito de organizar no caso Janus e AFSCME. Os leitores devem se lembrar que Ed Whelan, presidente do Instituto de Políticas Públicas e Ética, sugeriu que uma declaração do bispo de Springfield, Illinois, Thomas Paprocki, repudiando o documento era uma evidência que o dossiê tinha sido feito pela própria equipe da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA, que eles foram precipitados, que o texto não refletia a vontade dos bispos.
Tobin é o quarto cardeal que assisti interagindo com Trumka: os cardeais Cupich, Sean O'Malley e Donald Wuerl já participaram de conferências Erroneous Autonomy com Trumka. Como sugere o título dessas conferências, “Autonomia Errônea”, suas conversas não demonstraram qualquer simpatia com a visão de mundo que informa o processo de Mark Janus perante o Supremo Tribunal.
Leitores habituais sabem que eu navego nestas águas das relações entre Igreja e trabalho regularmente. As ideias discutidas na noite de terça-feira, pelos três, eram familiares para mim devido ao meu trabalho diário. Mas quando entramos no carro para a longa viagem para casa, um amigo que me acompanhava disse: "foi muito inspirador."
E foi. Em tempos de desunião e indecência na nossa vida pública, trabalhadores e trabalhadoras, bem como líderes intelectuais do Seton Hall e líderes religiosos do norte de Nova Jersey, reuniram-se para refletir sobre o profundo impacto de Francisco e os desafios que ele traz.
Por uma noite, a conversa não era sobre tweets e interferência russa nas eleições dos EUA ou a mais recente demissão na Casa Branca. Havia esperança e um senso de direção. Às vezes eu fico deprimido por causa da política na era Trump. O evento no Seton Hall foi uma forte repreensão a qualquer sentimento de resignação perante os desafios da nossa cultura.
Os trabalhadores da área do comércio e do transporte e os membros dos setores público e de construção ouviram a mensagem do Papa e ficaram extremamente entusiasmados. Pode não aparecer na pesquisa, e duvido que Bill Donohue se importaria, mas penso que estamos testemunhando o início de algo importante, à medida que o movimento dos trabalhadores e a Igreja Católica fazem um esforço consciente para fortalecer sua parceria histórica novamente.
Há solidariedade para construir, e a construção já começou.
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Apesar da campanha para tirar seus méritos, Francisco mobiliza os trabalhadores - Instituto Humanitas Unisinos - IHU