19 Janeiro 2018
Quando German Fernandez ficou sabendo, na semana passada, que o governo Trump planeja acabar com o Status de Proteção Temporária para ele e cerca de 200.000 outros imigrantes de El Salvador, um pesadelo tornou-se realidade.
"Quando vi a notícia, fiquei sem palavras", disse ele. "O SPT me protege há 18 anos."
A reportagem é de Jack Jenkins, publicada por Religion News Service, 18-01-2018. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Quando o programa que permite que imigrantes salvadorenhos ilegais morem e trabalhem nos Estados Unidos terminar, no próximo ano, muitos estarão correndo risco de serem deportados para um país atormentado por uma violência terrível entre gangues.
Mas antes de se desesperar, muitos salvadorenhos — que em grande parte são cristãos — estão encontrando esperança, apoio e empoderamento em igrejas que estão trabalhando com grupos de defesa e coalizões religiosas para oferecer assistência.
German Fernandez, que tem enviado dinheiro que ganha nos Estados Unidos à sua família em El Salvador, encontrou apoio na Paróquia de St. Matthew, uma igreja Episcopal no subúrbio de Hyattsville, em Washington, onde cerca de 40% de cerca de 800 membros da congregação são salvadorenhos que têm SPT.
"Minha fé é importante para mim, porque estou me sentindo sozinho", disse Fernandez, que disse que o apoio que ele e outros fiéis estão recebendo da igreja "é muito importante".
Ele disse que conversou com muitos amigos sobre o anúncio do SPT "e eles choraram, porque conheciam a realidade do que está acontecendo". Ele e outros membros da igreja estão planejando cruzar o país inteiro em poucos dias para um grande protesto em Sacramento, na Califórnia.
A grande Washington contém a maior concentração de salvadorenhos do país, de acordo com o Pew Research Center. E há muita indignação na diocese de St. Matthew.
"No domingo, vou pregar para a comunidade que se trata de uma triste realidade — é uma vergonha por parte do governo dos EUA. É absurdo, desumano, injusto, não cristão”, disse o Rev. Vidal Rivas, que também é salvadorenho, ao RNS na semana passada.
Vidal Rivas falou em espanhol, em pé, ao lado de uma estátua de Oscar Romero — o mártir salvadorenho reverenciado que atualmente está a caminho da santidade na Igreja Católica — que adorna a frente de seu santuário.
Trump, acrescentou, "tem que entender que as leis não são feitas para abusar dos pobres, mas para favorecê-los. Mas na verdade ele está favorecendo os ricos, o que é um insulto ao povo de Deus."
Ana Langerak, sacerdote associada da igreja, disse que a congregação tem preparado para o provável fim do SPT há meses, com alguns fiéis entristecidos pedindo orações na missa de domingo. Ela disse que a igreja trabalhou com grupos locais de defesa para organizar seminários com advogados de família e de imigração, nos quais os paroquianos fizeram perguntas difíceis, como o que fazer caso os pais forem subitamente arrancados de seus filhos pelo governo federal.
O ativismo de imigração também se tornou parte frequente da diocese, como quando os líderes trouxeram membros da congregação para participar de uma vigília de protesto em Washington, em outubro passado. Mas os líderes da igreja estão ajudando Fernandez e outros a falarem diretamente ao poder: Em dezembro, a diocese fez uma parceria com uma igreja Menonita local para realizar reuniões com a equipe de dois senadores democráticos de Maryland: Chris Van Hollen e Benjamin Cardin. Eles foram co-autores da lei de novembro que permitiria que muitos detentores do SPT solicitassem residência legal permanente, e Ana Langerak disse que funcionários do Senado perguntaram ao grupo sobre como atingir episcopais ou menonitas republicanos para angariar apoio ao projeto de lei.
"Nós tentamos canalizar (nossa ansiedade), não é?", disse ela. "Temos voz e somos uma comunidade de fé. Temos força espiritual".
Outras igrejas também estão lutando para cuidar das pessoas afetadas pela decisão. Maria Swearingen, co-pastora da Igreja Batista do Calvário, no centro de Washington, disse que a comunidade ainda está chocada.
"Nosso líder administrativo é de El Salvador e tem SPT. O próprio funcional da nossa igreja é afetad por esta decisão", disse Swearingen por e-mail. "Nossa amada comunidade está se reunindo para apoiar, orar e planejar mediante as novas informações esta semana. Estamos aumentando o apoio, a defesa e o cuidado pastoral."
Swearingen disse que a sua congregação também é membro de uma rede de "santuário". Membros da rede, geralmente comunidades de adoração de todas as religiões, colaboram para fornecer assistência legal e de defesa para imigrantes. Alguns chegam a prometer oferecer "santuário" físico para aqueles em risco de deportação, um passo raro que se baseia na política interna do governo federal de evitar invasões em "locais delicados”, como igrejas.
Há redes como essas em todo o país, e elas são anteriores à eleição de Trump. Porém, defensores dizem que os números aumentaram drasticamente depois que ele assumiu o poder, e Swearingen fala de uma urgência espiritual em responder às políticas de imigração do governo.
"A Escritura está cheia de histórias de líderes e governantes cuja ganância, narcisismo e sede de violência e caos fez com que caíssem de tronos frágeis em castelos de areia", afirmou. "Donald Trump não está imune aos atos de justiça e piedade de Deus no mundo."
Os salvadorenhos obtiveram o SPT em resposta a dois terremotos que atingiram El Salvador em 2001, e suas autorizações foram renovadas em cerca de 18 meses desde então. A secretária de Segurança Interna dos EUA, Kirstjen M. Nielsen, disse, num comunicado na semana passada, que "as condições iniciais causadas pelos terremotos de 2001 deixaram de existir. Assim, pelo estatuto aplicável, a atual designação de STP deve ser encerrada."
Noel Andersen, coordenador das bases do Serviço Mundial da Igreja dos EUA, disse que os principais grupos religiosos marcaram uma reunião com ela três dias antes do anúncio sobre o SPT para salvadorenhos (o governo já havia encerrado o Igreja para cerca de 59.000 haitianos semanas antes).
Representantes do Serviço Mundial da Igreja, as Irmãs da Misericórdia, a Conferência dos Bispos Católicos dos EUA, a American University e outros apoiaram a permanência do SPT, argumentando que mandar os cidadãos que têm SPT de volta para El Salvador é perigoso por vários motivos — principalmente considerando que o país tem uma das maiores taxas de homicídio do mundo.
Segundo Andersen, funcionários do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos não parecem influenciados, pois contra-argumentam dizendo que El Salvador tem capacidade de lidar com o fluxo migratório. Ainda assim, acredita que a luta não acabou e que algum progresso ainda é possível.
"Acredito que uma nova porta se abriu com a comunidade religiosa", afirmou.
Outros grupos religiosos também estão se posicionando. O Presidente da Comissão sobre a migração da USCCB emitiu uma declaração chamando a decisão de "devastadora"; o American Friends Service Committee, do grupo Quaker, considerou como "mais uma ação contra os imigrantes e que desrespeita os direitos humanos"; o Conselho para as Relações Americano-Islâmicas declarou-o "sem coração"; e o Centro de Ação Religiosa para a Reforma do Judaísmo, condenou-o como "o mais recente ato do padrão vergonhoso e perigoso de desinteresse dos Estados Unidos aos que necessitam”.
Enquanto isso, Fernandez e seus aliados religiosos planejam continuar lutando. Para ele, a chance de ficar não significa apenas evitar a violência e a pobreza em uma terra distante, mas trata-se também da chance de viver sem ser deportado e sem ter que viver nas sombras.
"Gostaríamos de ter uma chance de sobreviver do jeito certo, como cristãos, como seres humanos", declarou.
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EUA. Salvadorenhos em risco de perder o status de imigração encontram apoio em igrejas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU