17 Janeiro 2018
"Não posso deixar de expressar a dor e a vergonha que sinto perante os danos irreparáveis causados a crianças por ministros da Igreja. É justo pedir perdão e apoiar, com todas as forças, as vítimas". As primeiras palavras do Papa Francisco no Chile foram um pedido de perdão pelos abusos sexuais cometidos por sacerdotes e um compromisso com aqueles que sofreram nas mãos de predadores revestidos de autoridade. Isso é suficiente para as vítimas?
A reportagem é de Jesús Bastante, publicada por Religión Digital, 16-01-2018. A tradução é de André Langer.
Parece que não. E ainda mais depois que os organizadores da visita papal ao Chile não deixaram espaço para um encontro do Papa com as vítimas da pedofilia, muito ativas em suas mobilizações, especialmente no caso do bispo Juan Barros Madrid. Um Barros que, por sinal, participou da missa no Parque O'Higgins. O polêmico bispo de Osorno foi visto várias vezes durante a transmissão.
Enquanto isso, a comunidade de Osorno conseguiu entregar uma carta ao Papa Francisco, através do presidente da Câmara dos Deputados, Fidel Espinoza, em que lhe pedem para reverter a nomeação episcopal de Barros, por acobertar os abusos de Fernando Karadima.
O parlamentar entregou a carta ao Papa através do secretário de Estado, Pietro Parolin, durante a cerimônia no Palácio de La Moneda, e ressaltou que são necessárias "ações mais concretas". Para o deputado, Francisco "está mal informado sobre a comunidade de Osorno", que convocou vários protestos em Santiago, assim como em Temuco e Iquique, esperando que Bergoglio rompa o protocolo e ouça seus pedidos.
A verdade é que as vítimas de abusos não se convenceram da sinceridade das palavras do Papa. Assim, para Juan Carlos Cruz, uma das vítimas de Fernando Karadima, trata-se de "outra manchete barata". "O Papa pede perdão por abusos em La Moneda. Outra boa manchete que arranca aplausos e fica nisso. Outra manchete barata. Chega de perdões; queremos mais ações. Os bispos acobertadores continuam aí. Palavras vazias. Dor e vergonha, é o que sentem as vítimas", escreveu no Twitter.
O porta-voz dos leigos de Osorno, Juan Carlos Claret, por sua vez, disse que as palavras do Papa deixaram-no "com sabor de nada". Este grupo reuniu-se em diferentes lugares da passagem do papamóvel, com cartazes que dizem: "Nem esquerdistas, nem estúpidos. Osorno sofre. Dom Barros, acobertador".
Em declarações ao jornal La Tercera, Claret disse que "o Papa pediu perdão, mas não há mudanças. Os bispos não estão sendo removidos". "Estamos protestando com um grande sacrifício de tempo e dinheiro para que não nos ocultem. Tentou-se deliberadamente encobrir essa realidade", criticou.
Finalmente, a esposa do ex-presidente Eduardo Frei qualificou como "vergonha" o fato de que o bispo Osorno participasse da missa papal. Em sua conta no Twitter, Marta Larraechea juntou-se às críticas. "Barros participa da cerimônia no Parque O'Higgins, que vergonha! Do que o Papa pede desculpas?", disse Larraechea. "Não acredito em nada do que ele diz; ele diz uma coisa e faz outra".
O bispo de Osorno, por sua vez, disse no final da missa que "muitas mentiras foram ditas sobre mim", e apontou que mantém um bom relacionamento com o Papa Francisco. Barros disse não conhecer a carta do Papa na qual recomendava que tomasse um ano sabático, e sublinhou que "a verdade é muito importante e deve prevalecer (...) Eu continuo a serviço da Igreja". Na sua opinião, a visita do papa "não será manchada" por esse escândalo.
Por outro lado, pelo menos 20 pessoas foram presas durante a "Marcha dos Pobres" realizada em Santiago, que tentava chegar ao Parque O'Higgins, onde o Papa Francisco presidiu uma missa campal com a presença de centenas de milhares de fiéis, informaram fontes oficiais.
Com cartazes que diziam "Papa: os pobres marcham contra as migalhas desta democracia" ou "Um cúmplice que ajuda e protege o estuprador não pode dar a paz", a manifestação, convocada para as 9h local, foi interceptada pela polícia quando avançava pela Avenida Matta, em direção ao local de celebração da missa.
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Chile. As vítimas respondem ao Papa: "Outra manchete barata. Chega de perdões; queremos mais ações" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU