08 Dezembro 2017
“Trump e Jerusalém não têm nada a ver com os problemas reais”, diz o escritor israelense Etgar Keret. “É ar quente: o papel de presidente também depende da densidade da pessoa, e Trump demonstrou ser um peso-pena. Isso afeta os símbolos, não a realidade.”
A reportagem é de Lorenzo Cremonesi, publicada por Corriere della Sera, 07-12-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Quais são os problemas substanciais?
Há poucos dias, em Tel Aviv e em outras cidades israelenses, dezenas de milhares de pessoas saíram às ruas para contestar a corrupção profunda do governo Netanyahu, como não ocorria há anos. Esse é um problema muito real. Como, aliás, é o crescimento da influência do Irã em toda a região. Estão sendo criadas as condições para uma próxima guerra regional. E, enquanto isso, a Rússia de Putin chega com as suas bases ao Egito. São assuntos muito graves para todos. Em 10 anos, falaremos disso. Não das palavras vazias de Trump sobre Jerusalém.
Jerusalém sempre esteve no coração de qualquer processo de paz...
Não há nenhum processo de paz, nenhuma perspectiva concreta há muito tempo já. Teria feito sentido se Trump, no seu discurso, tivesse proposto transferir a embaixada estadunidense para Jerusalém em troca do bloqueio total das colônias israelenses nos Territórios Ocupados. Mas não há nenhuma estratégia, nenhum plano de negociação concreto, senão o vazio falar de paz. Não há substância. Eu suspeito que Trump e Netanyahu têm agendas muito semelhantes a esse respeito. Trump se encontra, mais uma vez, tendo que justificar ao seu país as suas relações com a Rússia de Putin. Bibi corre o risco de ser processado pela sua desonestidade. Eles preferem desviar a atenção da opinião pública com o status da Cidade Santa.
O que podemos dizer sobre o discurso de Trump?
Com Trump, os Estados Unidos renunciam ao seu papel histórico de principal motor do diálogo entre israelenses e palestinos. Quando ele diz que se adapta à vontade dos dois povos, isso significa que ele se submete às suas escolhas, não as rejeita, não as condiciona. O que acontece se a direita israelense se opuser a qualquer compromisso? E se o Hamas declarar a guerra santa ao extremo? É pura demagogia, que tenta esconder o vazio de ideias e iniciativas.
Corre-se o risco de uma terceira intifada?
Se esse passo tivesse sido feito há cerca de 15 anos, quando as negociações estavam realmente em andamento, poderia ter tido um impacto forte. Mas não agora. Hoje, os palestinos têm o problema de se mover cotidianamente entre as colônias judaicas na Cisjordânia. Estão divididos entre eles, têm uma liderança fraca. E, em Israel, existe um governo composto por pessoas contrárias a qualquer concessão para o nascimento de dois Estados. É claro que, agora, poderia haver violência. E eu tenho medo delas. Mas, com Trump, eu adotaria a mesma atitude que a minha mãe aconselhava quando eu era criança com os agressores na escola: esqueça-os, ignore-os, porque, quanto mais eles se sentem ouvidos, mais estragos eles fazem.
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''Trump é agressivo, mas os problemas são outros.'' Entrevista com Etgar Keret - Instituto Humanitas Unisinos - IHU