14 Dezembro 2016
O mal do clericalismo, presente nos tempos de Jesus e ainda hoje na Igreja, é uma “prepotência e tirania” para com o povo fiel de Deus por parte dos sumos sacerdotes que, esquecendo-se de Abraão e de Moisés, instrumentalizaram a lei criando uma lei “intelectualista, sofisticada e casuística”. Disse-o o Papa Francisco na homilia que fez no dia 13 de dezembro, durante a missa matutina na Capela da Residência Santa Marta. Francisco destacou também que “o pobre Judas traidor e arrependido não foi acolhido pelos pastores”.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi e publicada por Vatican Insider, 13-12-2016. A tradução é de André Langer.
O povo humilde e pobre que tem fé no Senhor é a vítima dos “intelectuais da religião”, “os seduzidos pelo clericalismo”, que no Reino dos céus serão precedidos pelos pecadores arrependidos, disse o Pontífice argentino, segundo indicou a Rádio Vaticano.
Refletindo sobre o Evangelho do dia, no qual Jesus recordou qual era o papel destes últimos: “Eles tinham a autoridade jurídica, moral e religiosa”, “decidiam tudo”. Anás e Caifás, por exemplo, “julgaram Jesus”, eram os sacerdotes e os chefes que “decidiram matar Lázaro”, e Judas foi vê-los para “negociar” e assim “vendeu Jesus”. Um estado de “prepotência e tiraria para com o povo” ao qual chegaram, disse o Papa, instrumentalizando a lei: “Mas uma lei que eles refizeram inúmeras vezes: tantas vezes até chegar a 500 mandamentos. Tudo estava regulado, tudo! Uma lei cientificamente construída, porque essa gente era sábia, conhecia bem. Faziam todos estes matizes, não? Mas era uma lei sem memória: tinham se esquecido do primeiro mandamento, que Deus deu ao nosso pai Abraão: ‘Caminha na minha presença e seja irrepreensível’. Eles não caminhavam: sempre permaneceram nas próprias convicções. E não eram irrepreensíveis!” Eles, continuou o Papa, “tinham se esquecido dos Dez Mandamentos de Moisés”: “Com a lei feita por eles”, “intelectualista, sofisticada e casuística”, “anularam a lei feita pelo Senhor”; falta-lhes a memória “que conecta o hoje com a Revelação”.
Sua vítima, assim como foi Jesus, é o “povo humilde e pobre que confia no Senhor”, “aqueles que são descartados”, destacou o Papa, que conhece o arrependimento, embora não cumpra a lei, mas sofre estas injustiças. Sentem-se “condenados e abusados”, destacou Francisco, por quem é “vaidoso, orgulhoso, soberbo”.
E um “descarte dessas pessoas”, observou o Papa, também foi Judas: “Judas foi um traidor, pecou muito gravemente, eh? Pecou forte. Mas depois o Evangelho diz: “Arrependido, foi até eles para devolver as moedas”. E eles, o que fizeram? Mas você era o nosso sócio. Fica tranquilo… Nós temos o poder de perdoar tudo!’ Não! ‘Se vira. É um problema seu’. E o deixaram sozinho: descartado! O pobre Judas traidor e arrependido não foi acolhido pelos pastores. Porque eles haviam esquecido o que é ser um pastor. Eram os intelectuais da religião, aqueles que tinham o poder, que levavam adiante as catequeses do povo com uma moral feita pela sua inteligência e não a partir da revelação de Deus”.
“Um povo humilde, descartado e machucado por essas pessoas”. Também hoje, observou Francisco, na Igreja essas coisas acontecem. “Existe este espírito de clericalismo”, disse o Papa: “Os clérigos se sentem superiores, afastam-se das pessoas”, “não têm tempo para escutar os pobres, os sofredores, os encarcerados, os doentes”. “O mal do clericalismo é uma coisa muito triste! É uma nova edição desta gente. E a vítima é a mesma: o povo pobre e humilde, que tem esperança no Senhor. O Pai sempre procurou se aproximar de nós: enviou o seu Filho. Estamos esperando, uma espera alegre e exultante. Mas o Filho não entrou no jogo desta gente: o Filho foi com os doentes, os pobres, os descartados, os publicanos, os pecadores (e é escandaloso isso…), as prostitutas. Também hoje Jesus diz a todos nós e também a quem está seduzido pelo clericalismo: ‘Os pecadores e as prostitutas precederão vocês no Reino dos Céus’”.
Na missa dessa manhã na capela da Residência Santa Marta participaram os nove cardeais que auxiliam o Papa na reforma da cúria e no governo da Igreja universal, o chamado C9. Eles estão reunidos na 17ª reunião, que começou na segunda-feira e termina hoje, quarta-feira, com o Pontífice.
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“O clericalismo instrumentaliza a lei e tiraniza o povo” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU