13 Março 2018
As urnas mandaram neste domingo dois recados à Força Alternativa Revolucionária do Comum, o partido surgido da antiga guerrilha FARC depois do acordo de paz do ano passado com o Governo de Juan Manuel Santos. Os colombianos comemoram o fato de pela primeira vez em mais de meio século terem podido votar com tranquilidade. A mesma sensação que tiveram os ex-combatentes, agora candidatos, quando chegaram desarmados às seções eleitorais. Mas, ao final da jornada, a segunda mensagem ficou clara na sede dos Los Comunes, o quartel-general da organização: ainda resta um longo caminho a percorrer até a completa reconciliação nacional.
A reportagem é de Ana Marcos, publicada por El País, 12-03-2018.
A FARC só conseguiu 52.532 votos para o Senado, superando apenas um partido composto por militares e uma pequena organização da sociedade civil. A cifra não impede que cinco membros da antiga guerrilha ocupem assentos na Câmara Alta do Congresso. Durante mais de quatro anos, aquela que foi a insurgência mais antiga da América Latina e representantes do Governo pactuaram que a transição das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia para a vida política seria reforçada com uma representação parlamentar fixa, independentemente dos votos obtidos.
O ex-comandante rebelde Iván Márquez, chefe da delegação das FARC no processo de paz, lidera a lista para o Senado e dividirá a bancada partidária com Carlos Antonio Lozada, Pablo Catatumbo, Victoria Sandino e Sandra Ramírez. Alguns deles decidiram abandonar o cognome da guerrilha e recuperar seu nome original, aquele que aparece na carteira de identidade.
“Dia histórico para a nossa Colômbia! Em meus 64 anos de vida é a primeira vez que exerço meu direito ao voto, e me sinto muito contente e comovido por tê-lo feito pela paz e a reconciliação do nosso povo”, escreveu Pablo Catatumbo em sua conta do Twitter.
Todos os novos senadores participam da liderança política do novo partido e estiveram durante décadas em postos de alto escalão da guerrilha. As FARC abandonaram as armas em agosto de 2017, organizaram um congresso político e acataram as normas da democracia colombiana, mas não abandonaram suas raízes. Mantiveram a sigla, apenas alterando o significado das palavras que a compõe, quatro letras que muitos colombianos continuam associando à guerra civil. “Queremos conceber o caráter do nosso partido como um partido revolucionário”, disse Márquez em setembro do ano passado, durante a apresentação oficial da agremiação.
Tampouco renovaram suas lideranças, que apenas guardaram a farda camuflada e vestiram paletó e camisa social. Rodrigo Londoño, mais conhecido como Timochenko, o comandante máximo, permaneceu à frente da organização política até que, há uma semana, uma doença cardíaca o obrigou a renunciar à disputa da eleição presidencial de 27 de maio.
Em busca de votos, a FARC inscreveu seus candidatos nas regiões mais populosas: Bogotá, Antioquia, Vale do Cauca, Atlántico e Santander. O partido tem outras cinco vagas asseguradas na Câmara de Representantes (deputados), mas mesmo assim optou por se apresentar nos grandes departamentos (Estados), em detrimento de áreas onde tradicionalmente exerceram o poder, como o sul da Colômbia.
Na Câmara Baixa do Congresso, o partido soma 32.636 votos, na lanterna dos resultados eleitorais. Seus candidatos são também ex-líderes guerrilheiros, rostos que grande parte da população identifica com os piores crimes da guerra. Os mesmos que, graças à demora na tramitação legislativa, não foram submetidos aos tribunais da Justiça Especial para a Paz, o organismo previsto no acordo de paz para julgar os crimes do conflito armado.
Os ex-combatentes entram num Congresso liderado pela direita, em que o Centro Democrático, do ex-presidente Álvaro Uribe, principal opositor da paz com as FARC, dominará ambas as câmaras, seguido pelo Mudança Radical e pelas duas forças políticas mais tradicionais da Colômbia, os Liberais e os Conservadores. “Vamos utilizar nossas vagas parlamentares como trincheiras de luta”, disse o candidato a deputado Byron Yepes, ciente de que sua formação não terá força para modificar leis durante os próximos quatro anos, mas conseguirá influenciar o debate parlamentar.
O consolo que restava à FARC na noite de domingo era o crescimento de quatro formações de esquerda ou de tendências mais progressistas: Os Verdes, o Polo Democrático, a Lista da Decência (do candidato presidencial Gustavo Petro) e o MIRA. “Há derrotas que não são desonrosas, e esta é uma delas”, declarou o candidato a senador Lisandro Duque ao site La Silla Vacía.
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Urnas punem FARC por meio século de guerra - Instituto Humanitas Unisinos - IHU