21 Fevereiro 2018
Um embrião com uma porção vermelha, bem identificável, correspondente ao componente celular humano, nos mostra na prática do que somos capazes. Um animal quimérico composto por células humanas e não-humanas. Da última vez havia sido criado um embrião de porco. Agora, os cientistas da Universidade da Califórnia conseguiram, depois de um ano, fazer a mesma coisa com uma ovelha. Os embriões foram destruídos após quatro semanas - o limite máximo permitido por lei - mas o resultado é um passo no sentido da possibilidade de criar órgãos humanos nos animais.
A reportagem é de Edward Boncinelli, publicada por Corriere della Sera, 20-02-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
As células humanas foram coloridas em vermelho para poder acompanhá-las, tanto para identificar a parte totalmente humana, como para visualizar aquelas espalhados no embrião. Isso permite perceber quantas são, apesar de tudo. No caso do porco eram uma em cem mil, na ovelha fala-se de uma célula humana em dez mil. Conseguimos, portanto, produzir uma quimera que tem um número suficientemente elevado de células humanas, que deve servir para reduzir a rejeição do órgão na pessoa transplantada.
Porque essas estranhas quimeras foram produzidas precisamente para construir órgãos em abundância que possam ser implantados no organismo que os recebe.
Sobre essas coisas a ficção científica muitas vezes já tratou. Agora, porém, estamos diante da realidade. O século passado foi, entre outras coisas, também o século dos transplantes. As técnicas fizeram progressos cada vez mais espetaculares, mas existe sempre um problema de números: os órgãos para o transplante nunca são suficientes para as nossas exigências. Daí a necessidade de contornar o obstáculo, criando novos órgãos no laboratório. Estes devem ser de um organismo comparável ao humano em tamanho e fisiologia. E se quisermos que o transplante seja aceito, deve ter também algo humano, ou, pelo menos, nada escandalosamente diferente. Logo se pensou em xenotransplantes, órgãos de animais compatíveis com a sua utilização No primeiro momento, optou-se pelos porcos que por diversos motivos apresentam vantagens, mas era necessário atender dois requisitos: abundância de órgãos disponíveis e tolerância por parte do hospedeiro humano.
Pensou-se então na formação de híbridos genéticos homem-animal, um objetivo não difícil de atingir, depois da ovelha Dolly e experiências similares. Misturam-se células de uma espécie e da outra e se dá início ao desenvolvimento correspondente do embrião, exceto por interromper sua gestação quando poderia ir longe demais. Grandes investimentos foram feitos em tais tecnologias, especialmente nos EUA, mas nunca se passou para a fase operacional.
Agora chegamos à ovelha, que apresenta várias vantagens teóricas e práticas em relação ao porco: é necessário um número menor de embriões para conseguir uma gravidez e também menos tempo para construir os órgãos para o transplante. O primeiro experimento foi bem sucedido na Universidade da Califórnia. Entre uma grande descoberta científica e sua aplicação prática sempre decorrem pelo menos vinte anos. E é fácil prever que, neste caso, vai demorar ainda mais.
Será a verdadeira glória? Difícil dizer, e podemos apenas esperar e acompanhar com interesse. As perspectivas são certamente emocionantes, mesmo para o progresso concomitante de todas as técnicas genéticas e celulares. Se o objetivo prático não for tão fácil de atingir, pelo menos teremos aprendido algo sobre a biologia e a biologia mais profunda e viva. Afinal, esse é o verdadeiro papel da ciência: aprender, difundir e aprender mais. Se resultar também uma vantagem prática, melhor. Normalmente, as aplicações práticas nunca faltam, mesmo se elas muitas vezes vêm da direção de onde não se esperava que viessem.
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O embrião híbrido ovelha-homem. Uma virada no futuro dos transplantes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU