05 Dezembro 2017
“A viagem do Papa Francisco a Myanmar e Bangladesh é a primeira que começa explicitamente a partir do novo papel que a China quer desempenhar – e já está desempenhando – no contexto internacional.”
A análise é do jesuíta italiano Antonio Spadaro, diretor da revista La Civiltà Cattolica, em artigo publicado por CyberTeologia, 04-12-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
A viagem do Papa Francisco a Myanmar e Bangladesh é a primeira que começa explicitamente a partir do novo papel que a China quer desempenhar – e já está desempenhando – no contexto internacional.
Um fato que o próprio papa resumiu na coletiva de imprensa voltando para Roma com estas palavras precisas: “Pequim tem uma grande influência sobre a região, porque é natural: Myanmar tem não sei quantos quilômetros de fronteira lá. Também nas missas havia chineses que vieram... Acho que, nesses países que cercam a China, também o Laos, o Camboja precisam de boas relações, são vizinhos. E isso eu acho sábio, politicamente construtivo, se for possível seguir em frente. Porém, é verdade que a China hoje é uma potência mundial: se a vemos a partir desse lado, pode mudar de panorama”.
E o fato de que, nesta viagem, ele viajou ao redor da China não está ligado apenas ao fato de que Myanmar faz fronteira com esse grande país em 2.200 quilômetros. Como o papa observou, havia um grupo de fiéis chineses com a bandeira da República Popular a esperá-lo na Catedral de Yangon depois do encontro com os bispos.
Não só isso: no dia 27 de novembro, o Global Times – um tabloide produzido pelo jornal oficial do Partido Comunista Chinês, o Diário do Povo – publicou online, na seção “Diplomacia”, um post fotográfico de Francisco abraçando uma jovem vestida com os trajes tradicionais, com o simples título de “Abraço caloroso” (Warm hug) [1].
E o mesmo jornal, no dia 29 de novembro, dedicou pela primeira vez um artigo a uma viagem papal – com uma grande foto – fazendo uma avaliação positiva do que Francisco disse e fez em Myanmar. O título na edição impressa foi: Respect each ethnic group: Pope [2].
Mas a viagem de Francisco foi precedida, no dia 25 de novembro, por um artigo publicado no China Daily – o jornal chinês mais difundido em inglês, com sede em Pequim – totalmente dedicado aos jesuítas que “deixaram uma marca indelével na nação”. O título do artigo é claro: Men on a mission, “homens em missão” [3].
Mais dois dados: a conselheira de Estado e ministra das Relações Exteriores de Myanmar, a Sra. Aung San Suu Kyi, depois de receber o Papa Francisco, está voltada para Pequim.
E o próprio papa revelou na coletiva de imprensa no voo que, precisamente nestes dias, ocorreria em Pequim uma sessão da Comissão Mista que estuda as relações entre China e Santa Sé. E não escondeu os seus desejos a propósito de uma eventual visita à China: “Eu gostaria, não é algo escondido. As negociações com a China são de alto nível cultural”.
Mas acrescentou: “Depois, há o diálogo político, especialmente para a Igreja chinesa, com aquela história da Igreja patriótica e da Igreja clandestina, que é preciso seguir passo a passo, com delicadeza, como se está fazendo. Lentamente”.
E concluiu: “As portas do coração estão abertas, e eu acho que fará bem para todos uma viagem à China. Eu gostaria de fazê-la...”.
Notas:
[1] http://www.globaltimes.cn/content/1077488.shtml
[2] http://www.globaltimes.cn/content/1077697.shtml
[3] http://usa.chinadaily.com.cn/life/2017-11/25/content_34980286.htm
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Papa Francisco e a China: sobre a viagem ao coração da Ásia. Artigo de Antonio Spadaro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU