18 Novembro 2016
Assistir a reunião da Conferência dos Bispos dos EUA (USCCB) esta semana foi frustrante. A conferência parecia empacada. Quando os Estados Unidos mais precisam de uma voz moral forte, a voz dos bispos torna-se coadjuvante, preocupando-se com coisas que não importam e abordando parcamente o que importa. E, como ficou evidente para todos, as preocupações do Papa Francisco estão longe de ser as preocupações da USCCB.
A reportagem é de Michael Sean Winters, publicada por National Catholic Reporter, 16-11-2016. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Em sua atualização sobre o trabalho do Comitê para a Liberdade Religiosa ad hoc, o arcebispo William Lori disse que eles estavam fazendo a diferença. Será mesmo? O ponto central de sua campanha, a "Quinzena da Liberdade", chama pouca atenção. Na imprensa popular, a liberdade religiosa agora vem geralmente com aspas. Na mente popular, a causa da liberdade religiosa está ligada à discriminação contra gays e lésbicas, e não sem razão. Se isso será o abalo sísmico da defesa da liberdade religiosa nos próximos anos, eu tremo só de pensar em suas perspectivas.
Eu quase não ouvi nenhuma menção ao meio-ambiente ou ao Laudato Si' na reunião da USCCB. Pense nisso rapidamente. O Papa emite uma encíclica, a única emitida por ele até agora, que se dedica à questão do meio ambiente. E os bispos do país que mais causou danos ao meio ambiente não se manifestam. Como isto é possível? Se eles querem ser pró-vida, por que são tão despreocupados com uma questão que, assim como a proliferação nuclear, é uma das duas ameaças que poderiam matar a todos nós? Combater o aborto é moralmente válido, certamente, mas não faz sentido defender a vida antes do nascimento para que as crianças cresçam e vivam em um planeta cada vez mais inviável. Os bispos de outros países não são tão reticentes. O Cardeal Charles Maung Bo, de Mianmar, deu uma recente palestra, na Pontifícia Academia de Ciências, afirmando que: "A menos que os países ricos concordem em reduzir o aquecimento global, mais pessoas vão morrer. Isso para mim é um genocídio criminoso, quando os pobres e os fracos são expostos à natureza violenta criada pelo uso irrestrito de combustíveis fósseis por parte dos países ricos". Genocídio criminoso. E os bispos dos Estados Unidos não se incomodam com isso.
Não há nenhuma razão para evitar as ramificações políticas em torno dessa questão, mas mesmo se os bispos, por algum motivo, relutassem em se envolver com essa temática nesse nível, por que precisamos de outro relatório sobre atividades de liberdade religiosa e nenhum sobre o que os bispos estão fazendo em suas dioceses para promover o cuidado com a criação divina? Temo que a resposta seja que eles não estejam fazendo muita coisa. Por que nossos templos não instalam painéis solares? Por que nossas faculdades e universidades católicas não destacam o desenvolvimento de novas tecnologias mais sustentáveis? As pessoas gostam de menosprezar a "religião organizada", mas está é uma oportunidade de mostrar o que a "religião organizada" pode fazer, sendo pioneiros em infraestrutura de energia sustentável.
O trabalho de caridade da Igreja foi frequentemente mencionado. Mas nenhum bispo foi ao microfone para denunciar a "economia que mata". Os bispos dos Estados Unidos estão há anos-luz de distância do resto da Igreja no que tange a uma desconfiança sobre a nossa cultura capitalista, de consumo. É mais fácil atribuir a laicização da cultura a gremlins e poltergeists, ou ao presidente Obama, do que reconhecer que o seu agente é, na verdade, a nossa cultura de consumo, classificada como "vida de mercadoria" por Brad Gregory. Por que arriscar irritar todos aqueles gentis contribuintes? É melhor invocar vagamente a Virgem Maria do que reconhecer o desafio que ela indicou quando disse que Deus "mandaria os ricos para longe, de mãos vazias".
Também não houve discussão, pelo menos em sessão pública, sobre a Amoris Laetitia. Pelo menos nenhum dos bispos seguiu o exemplo do Cardeal Raymond Burke, que, em uma entrevista publicada ontem, mais uma vez afirmou que Amoris Laetitia não é um documento magisterial. Para alguém tão preocupado com escândalos, ele próprio com certeza causa os seus. Se diminuir a autoridade do Papa, para não falar da esmagadora maioria dos bispos reunidos em dois sínodos, não for um escândalo, o que é então?
E, claro, o maior problema imediato que os bispos enfrentam é a perspectiva da deportação em massa de muitos dos nossos paroquianos católicos. Na noite anterior à reunião, o número de pessoas que Donald Trump pretendia deportar flutuava em 3 milhões. Ele sugeriu que perseguiria apenas os criminosos. Se os bispos não resistirem a esta intimidação, e logo, antes que ele esteja em uma situação confortável, antes da posse, antes que mais gente em Washington esteja sob seu poder, será tarde demais. Ao longo das primárias, as pessoas diziam: "Ele não vai dizer o que quiser e sair ileso", mas saiu. Inúmeras vezes, as pessoas disseram: "Dessa vez ele foi longe demais", mas nunca era longe o bastante. Os anais da história estão cheios de pessoas e clérigos bem-intencionados pensando que as pessoas más não vão fazer o mal que disseram, e então é tarde demais para pará-lo. Os bispos precisam encontrar a sua voz, e rápido. O que foi dito em Baltimore nos últimos dois dias foi totalmente desproporcional à ameaça que uma presidência de Trump representa para milhões de nossos irmãos católicos. Não estou dizendo que só devemos nos preocupar com a situação dos católicos. Estou dizendo que, se não estivermos preparados para demonstrar que vamos proteger o nosso rebanho, Trump e sua equipe entenderão que podem fazer o que quiserem.
Um dia antes do início da reunião, uma igreja Episcopal em Silver Spring, Maryland, foi alvo de vândalos. Alguém pichou "nação Trump; nação branca" na Igreja. Os vândalos sabiam o que estavam fazendo quando escolheram uma Igreja. Eles sabem que a visão moral da Igreja cristã é contrária ao caminho de Steve Bannon e seu chefe. Não é aventurar-se na política quando suas Igrejas são vandalizadas. Infelizmente, temo que o país está prestes a ser moralmente vandalizado; na verdade, esse processo já começou. Há uma parábola do Evangelho sobre o vigia noturno precisar estar atento. Os bispos devem levá-la a sério.
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Conferência dos Bispos e Papa Francisco estão cantando em ritmos diferentes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU