16 Novembro 2016
"Um elemento central de sua proposta consiste em mostrar como os interesses financeiros de meia dúzia de pessoas precisam antes de tudo “colonizar nosso espírito” antes de assaltar nosso bolso e direcionar os recursos de toda a sociedade, por meios legais ou ilegais, para uma elite mesquinha, indiferente ao destino do país. Esta elite é uma elite financeira que comanda os grandes bancos e fundos de investimento"
O comentário é de Manfredo Oliveira, doutor em Filosofia pela Universität München Ludwig Maximilian de Munique, Alemanha, e professor da Universidade Federal do Ceará – UFC.
Eis o artigo.
Quem vive em sociedades extremamente complexas como as nossas sabe quanto é difícil alcançar uma compreensão dos movimentos e acontecimentos de nossa vida coletiva. Hoje se tem consciência de que o mundo nos é mostrado em fragmentos de tal modo que nossa compreensão tende a ser unilateral, frequentemente confusa, personalizada, incapaz de nos fazer perceber os interesses em jogo. Ultrapassar esta situação, ir além de uma leitura superficial do mundo é uma tarefa árdua que certamente não é tarefa de uma pessoa, mas de debates em que diferentes vozes são muito bem-vindas.
O sociólogo Jessé Souza acaba de publicar com o título “Radiografia do Golpe” uma destas propostas com o objetivo de esclarecer as pré-condições do que recentemente aconteceu entre nós. Seu esforço interpretativo pretende desvelar os mecanismos que possibilitaram à elite do dinheiro ser a “mandante” da destituição do governo realizada por outros sem que ela seja sequer mencionada. Em segundo lugar, trata-se de situar estes acontecimentos no contexto dos novos conflitos de classe que surgiram com a ascensão social dos setores populares e serviram de pano de fundo para viabilizar o impedimento.
Um elemento central de sua proposta consiste em mostrar como os interesses financeiros de meia dúzia de pessoas precisam antes de tudo “colonizar nosso espírito” antes de assaltar nosso bolso e direcionar os recursos de toda a sociedade, por meios legais ou ilegais, para uma elite mesquinha, indiferente ao destino do país. Esta elite é uma elite financeira que comanda os grandes bancos e fundos de investimento. Todas as frações dos endinheirados ganham sobretudo com as taxas de juros exorbitantes, uma espécie de taxa extra associada aos preços do mercado. Desta forma, todas as outras classes pagam esta taxa a esta ínfima classe o que evidentemente não aparece na mídia em que os articulistas econômicos são pagos diretamente ou não por esta elite para legitimar esse saque. Esta taxa de juros, embutida em tudo que consumimos, precisa ficar oculta. Diferentes propostas teóricas são apresentadas para sua justificação, por exemplo, a tese de que ela é necessária para o controle da inflação, escondendo o interesse de poucos que se contrapõe a um interesse geral. É aqui para o autor que se situa o verdadeiro assalto e a verdadeira corrupção. A mídia neste contexto é fundamental para que a população, submetida a distorções sistemáticas da realidade, não perceba realmente o que está verdadeiramente em jogo.
Não tendo a compreensão adequada deste processo não é possível compreender por que e como essa elite do dinheiro fácil nos faz a todos de imbecis. Primeiro domina nossa inteligência por meio das universidades e das escolas. Depois pelo controle direto ou indireto dos meios de comunicação procura distorcer e fraudar sistematicamente a maneira como a sociedade percebe a si mesma e os interesses que na realidade contam. São as ideias que assimilamos sem refletir e em relação às quais não temos distanciamento crítico que nos escravizam e nos levam a agir contra nossos próprios interesses.
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