14 Janeiro 2016
O primeiro iPhone, lançado em 2007 pela Apple, ainda sob o comando de Steve Jobs, consolidou duas tendências no mundo das telecomunicações: a convergência digital e o limiar da chamada internet das coisas. Cinco anos depois, as redes 4G ampliaram esse horizonte. Em 2020, espera-se uma nova quebra de paradigma, com a previsão da entrada em funcionamento nos Estados Unidos e na Ásia do 5G.
A reportagem é de Roberto Rockmann, publicada por CartaCapital, 06-01-2016.
De montadoras a fabricantes de eletrodomésticos, várias linhas de pesquisa de novos produtos baseiam-se na adaptação de produtos tradicionais, entre eles automóveis e geladeiras, ao comando via máquinas. As inovações se estenderão às redes de energia, que permitirão o uso de aparelhos nos horários em que o preço ao consumidor é mais barato. Em julho, Dilma Rousseff experimentou o carro do Google. Fez um percurso em um veículo equipado por um sistema de direção inteligente, sem motorista, pelas ruas no entorno da sede da empresa em Mountain View, na Califórnia.
Um estudo da Cisco prevê que a internet das coisas terá um valor econômico de 14,4 trilhões de dólares em uma década no mundo. Desse total, cerca de 50% do maior valor econômico presente está nas conexões máquina a máquina. De olho nesse mercado, recentemente, a empresa mostrou o Brillo, novo sistema para conectar dispositivos como carros, eletrodomésticos e eletrônicos. A empresa também anunciou o Weave, mecanismo para integrar a comunicação entre esses diversos aparelhos.
Há pouco mais de dez anos, existiam algo em torno de 200 milhões de aparelhos conectados à internet. Hoje, com a expansão de tablets e smartphones, o número ultrapassa os 10 bilhões de dispositivos, o qual, a partir da convergência digital, continuará a experimentar crescimento exponencial. “A internet das coisas é uma tendência que ganhará espaço no Brasil e no mundo, seja com casas e carros conectados, seja com as redes de distribuição de energia. E isso poderá ter sua velocidade acelerada com a implementação da rede 5G, que traz maior velocidade. Essa possibilidade de oferecer conectividade aos objetos terá impacto sobre as operadoras também”, afirma Eduardo Tude, presidente da Teleco, consultoria que se debruça neste momento sobre o mercado no Brasil e suas projeções de investimento. O estudo deverá ser divulgado em março de 2016.
As inovações não apenas mudarão o trabalho e o lazer dos seres humanos. Terão impacto sobre a organização das concessionárias de serviços públicos de energia e de telecomunicações. No caso das operadoras de telefonia, a tendência é se tornarem provedoras de soluções e agregadoras de serviços. Uma área que poderá ser fortalecida é a criação de aplicativos, hoje praticamente nas mãos de grandes empresas de tecnologia, entre elas, o Google e o Facebook.
Segundo Márcia Ogawa, responsável pelas soluções de analytics da Deloitte no Brasil, a internet das coisas traz oportunidades para o País. Hoje, a média de idade do parque industrial é de 16 anos, acima dos dez anos verificados nos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e dos quatro anos verificados no Japão e na Alemanha. “As aplicações na indústria com máquinas que conversam entre si podem crescer e elevar a produtividade, em indústrias intensivas em capital, mas tudo isso dependerá de banda larga oferecida.”
Ainda existem oportunidades de investimento em novas fronteiras, a começar pela adoção das redes inteligentes de energia, experiência que começa a dar os primeiros passos no Brasil. A implementação das redes possibilitará que cada eletrodoméstico tenha o consumo avaliado em tempo real pelo proprietário, que poderá ter à sua disposição tarifas diferenciadas por horário e gerenciar o funcionamento de eletrodomésticos.
Os investimentos poderiam contribuir para a criação de um polo industrial dinâmico no Brasil, a exemplo do exitoso programa de energia eólica. Essa mudança teria o poder de atrair investidores, tanto para abastecer o mercado interno quanto para exportar os equipamentos. O mercado é promissor. No Brasil hoje existiriam cerca de 80 milhões de medidores e menos de 5% são inteligentes. Estima-se que em 2020 o nicho poderá movimentar 1,3 bilhão de reais no ano. Para as redes inteligentes saírem do papel, seria preciso construir condições econômicas para as concessionárias investirem em equipamentos e tecnologias que permitam gestão remota das redes. A nova tecnologia é mais cara. “Com demanda firme e sinal econômico para a adoção das redes, o Brasil poderia criar um polo local de produção”, afirma o diretor de engenharia da CPFL Energia, Paulo Bombassaro.
Outra área promissora é a chamada economia criativa, com destaque para o desenvolvimento de aplicativos, diz Ogawa, da Deloitte. O uso crescente de smartphones e a maior conectividade rendem bons negócios. Em 2012, o empresário Carlos Mira vendeu a participação na transportadora criada por sua família. Inscreveu-se em cursos do Instituto Endeavor e teve uma ideia: desenvolver um aplicativo que funcionasse com uma plataforma na qual empresas pudessem selecionar caminhoneiros e os caminhoneiros pudessem oferecer seus serviços. Assim foi criada em 2012 a TruckPad.
No ano passado, a empresa venceu uma competição nos Estados Unidos e recebeu investimentos de uma aceleradora norte-americana. Mira passou seis meses na Califórnia. Antes da virada do ano ele embarca novamente para os EUA, onde se reunirá com potenciais investidores. A startup brasileira prepara-se para iniciar sua internacionalização em 2016, com investimentos nos mercados da Índia, Turquia e México. “Também estudamos a entrada nos Estados Unidos”, afirma Mira, que sonha em ser a primeira empresa nascente brasileira a valer 1 bilhão de dólares. Hoje, o aplicativo é usado por 300 mil caminhoneiros no Brasil e cerca de 5 mil empresas recorrem à plataforma para contratar serviços de logística.
Em novembro, a TruckPad mediou 400 mil ofertas de carga, com preço médio de pouco mais de 3 mil reais, economia de 25% em relação ao sistema tradicional. O empresário estima existirem no País cerca de 2 milhões de caminhoneiros autônomos. Metade é dona do próprio caminhão. Desse total, outra metade possui smartphone, porcentual que tende a aumentar e alcançar 90% em dois anos. “Esse é nosso público-alvo.” Além da plataforma de serviços, oferecida gratuitamente aos usuários, como forma de fidelização, a empresa pretende ganhar dinheiro com a venda de pesquisas de inteligência. Por conta da base de usuários, a TruckPad tem condições de realizar pesquisas sobre a intenção de compra dos motoristas de qualquer produto que as fabricantes de autopeças tenham interesse. “Temos uma base de dados e de inteligência bastante valiosa.”
O caso da TruckPad não é único. A enxurrada de e-mails recebida diariamente por quem acessa a internet foi a base para a criação da Goboxi. Nascida, em Santos, litoral paulista, a empresa desenvolveu um sistema inteligente de gestão de e-mails, que reduz a quantidade de mensagens eletrônicas a serem respondidas e identifica agendamentos ou outras tarefas. Em agosto, depois de dois anos de aperfeiçoamentos, o produto, desenvolvido pela equipe de criação no Brasil, foi lançado em versão ainda gratuita na Califórnia, onde a empresa mantém seu principal escritório de negócios. Nos Estados Unidos, um profissional gasta 28% do seu tempo, em média, para ler e responder e-mails e dedica cerca de 600 horas por ano na administração de sua caixa eletrônica. Trata-se de um mercado com muito potencial.
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No limiar da internet das coisas, as máquinas “conversam” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU