Por: Jonas | 21 Outubro 2014
Michael Löwy (foto) é um dos mais importantes pensadores marxistas atuais. Sua extensa obra, desde A teoria da revolução no jovem Marx (1970) até a sua última A jaula de aço: Max Weber e o marxismo weberiano (2014), abarca temáticas muito diversas como o romantismo, a sociologia marxista ou o ecossocialismo. O sociólogo e filósofo de origem brasileira recebeu uma parte da equipe de Marxismo Crítico em seu apartamento, em Paris, para discutir sobre seu enfoque romântico-revolucionário em Marx e sua proposta ecossocialista.
Fonte: http://goo.gl/L2amgP |
A entrevista é de Diana Fuentes e Víctor Neves, publicada por Marxismo Crítico, 13-10-2014. A tradução é do Cepat.
Eis a entrevista.
Gostaríamos de começar destacando o trabalho que há muito tempo você vem realizando, que entre outras obras apresentou no livro “Revolta e Melancolia. O romantismo na contramão da modernidade”, escrito com Robert Sayre, há mais de 20 anos, e onde você aborda uma questão que, em nosso modo de ver, apresenta uma fértil leitura de Marx. De que maneira podemos pensar que Marx é um romântico? Marx é um romântico?
Refletido dessa forma simples e direta, a resposta seria não. Marx não é um romântico. Na realidade, a posição de Marx em relação ao romantismo é muito bem resumida por ele em uma passagem dos Grundrisse, fundamentos para a crítica da economia política de 1857-1858, primeiro manuscrito de O Capital que ficou inacabado. Nele, Marx expõe que no passado existiam formas de vida social muito mais cheias de autenticidade, do ponto de vista da plenitude da vida, e que desejar voltar a essa plenitude, como os românticos concebem, é um absurdo. Não podemos voltar ao passado. Porém, ficar no vazio presente como propõem os ideólogos da burguesia é insuportável. Quando a crítica dos românticos à civilização burguesa tem sua legitimidade em nome do passado, os burgueses não tem como contestá-la. Por isso, a crítica romântica continuará existindo como uma sombra da burguesia até que esta desapareça. Acredito que aí está dito tudo.
Marx reconhece ao mesmo tempo a legitimidade da crítica romântica da burguesia e a distância crítica em relação à ilusão romântica de poder voltar ao passado, junto ao fato que enquanto existir o capitalismo e a sociedade burguesa, existirá sua crítica romântica. Esta é a ponderação acertada que define bem a posição de Marx.
Então, Marx não é um romântico. É alguém que procurou em sua obra desenvolver uma superação dialética no sentido da Aufhebung hegeliana, uma superação dialética da oposição entre romantismo e ilustração. Ou seja, toma elementos dos dois, critica suas limitações e procura propor uma alternativa superior, representada pela dialética marxista. Isto como primeiro elemento de resposta. Marx não é um romântico, mas reconhece a legitimidade da crítica romântica da sociedade burguesa. Por isso, Marx se apropria do pensamento dos críticos românticos do capitalismo, desde os reacionários até os mais progressistas, que também existem. Não são todos reacionários, existe uma esquerda romântica, socialista, anarquista ou comunista. Uma esquerda romântica que não quer voltar ao passado, mas, sim, deseja dar uma volta pelo passado em direção ao futuro.
No entanto, Marx também se interessa pelos críticos reacionários e assume deles a parte crítica, ao passo que rejeita suas concepções regressivas em relação ao passado. Há um montão de exemplos deste tipo. Para começar, na economia política: Sismondi, a quem Marx se refere em diversos momentos. No Manifesto Comunista há um capítulo sobre Sismondi, no qual o chama de pequeno-burguês, reacionário, etc., mas no qual diz que foi Sismondi o primeiro a dizer que o capitalismo significa crise, pauperização dos camponeses, destruição das pessoas pela divisão do trabalho, etc. Faz uma lista de críticas ao capitalismo que são quase todas as que serão retomadas pelo próprio Marx. Há uma espécie de homenagem em vários escritos de Marx, como em sua história das teorias da mais-valia, onde irá retomar Sismondi se distanciando de suas ilusões pequeno-burguesas e de sua reivindicação pela volta ao artesanato do passado, interessando-se pela crítica ao capitalismo.
O mesmo vale para escritores como Balzac, que era um reacionário, legitimista, que queria restaurar a monarquia absoluta, mas a maneira como analisa a sociedade burguesa é muito importante para Marx e para Engels. Os dois dizem que aprenderam mais sobre o que era a sociedade burguesa lendo Balzac do que em muitos tratados de economia política e em estatísticas. Então, há também uma homenagem a Balzac.
Primeiro elemento a ser considerado: o romantismo, ou a crítica romântica do capitalismo, é uma das fontes do marxismo, junto com a economia política inglesa, o socialismo francês e a dialética hegeliana. Foi uma fonte ignorada, normalmente se fala das outras três, mas há também uma quarta. Em segundo lugar, é preciso destacar que na própria obra de Marx e Engels há algo que eu chamo de o momento romântico ou dimensão romântica, isto é, uma série de argumentos pelos quais Marx, para citar o exemplo de uma passagem famosa de Miséria da Filosofia, apresenta como coisas que no passado eram compartilhadas ou agraciadas entre indivíduos como o amor, a amizade, a honra, a solidariedade, a fraternidade, etc., que agora no capitalismo se tornaram mercadorias que chegam ao mercado para serem vendidas pelo seu preço; é o que se pode chamar a venalidade universal: tudo se transformou em mercadoria. Trata-se de uma crítica que se refere ao passado. No passado pré-capitalista houve valores humanos que agora estão desaparecendo, o que não significa que Marx queira voltar ao passado, mas é claramente uma crítica que se apoia no passado. Ou, então, quando Engels, em A origem da família, da propriedade privada e do Estado, fala da dignidade do homem na comunidade primitiva. Todos esses elementos estão presentes em Marx e Engels, claro, seria demorado desenvolvê-los agora, pode-se simplesmente apontar que há uma veia, um momento romântico, que é parte do pensamento de Marx e Engels e do marxismo e que, lamentavelmente, deixou-se de lado.
Não é a único enfoque, nem o menor, mas, sim, está articulado com elementos que vem da ilustração, da racionalidade e da ciência. Duas abordagens se encontram; é o que Ernst Bloch chama de corrente fria e corrente quente do marxismo. A corrente fria faz referência à ciência, à análise implacável da realidade capitalista. A corrente quente é a utopia, o sonho, o momento romântico. Bloch apresenta a necessidade das duas, mas situando a corrente fria e a análise científica a serviço da corrente quente, do sonho e da utopia.
Que validade nós podemos dar, hoje, para este enfoque? De que modo pode se apresentar no momento atual, em que há uma espécie de retorno ao marxismo, com a atualização de certas discussões nos círculos de pesquisa marxista e questionamento de outras? Ou seja, que sentido tem hoje enfatizar este enfoque, partindo da menção de Bloch à corrente quente do marxismo e, especialmente, naquilo que tem a ver com o romantismo?
Primeiro, acredito que este enfoque é importante para resgatar na história do marxismo a presença de uma corrente marxista quente. Não podemos entender a história do marxismo no século XX e até hoje sem levar em consideração que existiu, dentro do marxismo, uma corrente que reivindica o romantismo, que se autodefine romântico-revolucionária. Essa corrente inclui Ernest Bloch, Walter Benjamin, José Carlos Mariátegui, entre outros. Então, o primeiro passo seria tomar consciência dessa corrente dentro do marxismo do século XX.
Segundo, porque acredito que esta crítica romântica é importante na luta política, cultural, ideológica e ética que realizamos contra o capitalismo. É um erro limitar a crítica do capitalismo, como muitas vezes a esquerda faz, unicamente ao fato da exploração da mais-valia. Este elemento é importante, mas o capitalismo não é apenas isso. Também somos anticapitalistas porque o capitalismo é destruidor, destrói tudo, a comunidade humana, os valores éticos, a solidariedade, o conteúdo humano da vida social, a natureza. E são os românticos que enfatizaram estas dimensões. Em minha opinião, para que o anticapitalismo mantenha sua força ética e cultural deve levar em conta estas críticas.
Além disso, acredito que o romantismo nos ajuda a entender uma série de questões muito atuais. Por exemplo, a crítica da visão ilustrada da civilização do progresso, que a partir de vários pontos de vista, começando pelo ambiental, é um desastre. Para entender a razão pela qual o progresso dentro do capitalismo e da civilização moderna é um desastre, é preciso se valer dessa perspectiva romântica.
E, por último, para dar um exemplo latino-americano, se queremos entender a luta dos indígenas contra o neoliberalismo, as multinacionais e o capitalismo agrário, que é um elemento muito importante das lutas sociais, hoje em dia, na América Latina, temos que partir desse enfoque, que está em Marx e Engels, sobre a valorização da comunidade primitiva, das formas de vida pré-capitalistas comunitárias, que estão na raiz dessas lutas indígenas tão importantes.
Tudo isso configura um conjunto de temáticas importantes para pensar o marxismo no século XXI, que tem a ver com essa corrente quente ou romântico-revolucionária dentro do marxismo.
A respeito deste ponto, para aprofundar, é muito interessante analisar se isto também contribui para pensar este horizonte do qual você fala, ou seja, o caso latino-americano e os movimentos indígenas. O apaixonante da questão é que este romantismo que você expõe não significa um retorno ao passado ou uma sobrevivência de um passado que não foi atingido pelo longo processo que implicou na modificação do estilo de vida e das relações sociais no capitalismo. Gostaríamos que aprofundasse esta questão. Como esta visão romântica nos ajuda a entender e a nos aproximar destes fenômenos sociais e de resistência ao capitalismo, sem que por isso pensemos que se trata de uma espécie de retorno a um passado intacto?
José Carlos Mariátegui já havia concebido isso de maneira muito acertada. É preciso voltar a ler Mariátegui na América Latina. Ele dizia que no passado pré-capitalista, pré-colombiano, anterior à conquista, existia algo que ele chama de comunismo inca. Foi muito criticado por essa definição, sendo chamado de populista, de romântico. É necessário levar em consideração que a expressão “comunismo inca” pode ser encontrada em Rosa Luxemburgo, em seu livro sobre Introdução à Economia Política fala do comunismo inca. O que quer dizer isto? Na civilização inca, para além da estrutura absolutista, do poder inca e de sua oligarquia, existiam na base, nas comunidades indígenas, formas comunitárias de vida, de trabalho, com propriedade comum da terra, etc. A isto ele chama de comunismo inca. E Mariátegui diz que apesar dos séculos de conquista e de liberalismo capitalista, sobreviveram nas comunidades indígenas essas práticas coletivistas comunitárias, esse espírito comunitário, e que nós, socialistas, comunistas, revolucionários marxistas, devemos nos apoiar nessas tradições, nesse espírito coletivista dos camponeses e indígenas para desenvolver nosso trabalho socialista ou comunista moderno. Não para voltar ao Tahuantinsuyo, ao Império Inca, mas, sim, para construir o socialismo moderno, o comunismo, inclusive com as conquistas técnico-científicas, mas resgatando esse espírito comunitário tão enraizado nas comunidades indígenas. Esse é o pensamento de Mariátegui que, para mim, parece muito certo e muito atual.
O que nós vemos é um fato surpreendente, quase um século após Mariátegui, os indígenas continuam se rebelando, brigando, lutando a partir de suas comunidades, de seu espírito comunitário e práticas de ajuda mútua e de sua relação comunitária com a natureza. Atualmente, voltamos a encontrar isso sob uma forma nova, que Mariátegui não tinha como prever, naquilo que podemos chamar de lutas socioambientais. Lutar pela defesa do meio ambiente, da natureza, das florestas, da água, da terra, contra as multinacionais do petróleo, da mineração, do ouro, por exemplo, do agronegócio, etc.
Quando os camponeses do Peru, da região de Cajamara, rebelam-se contra uma multinacional da mineração com o lema: “Água sim, ouro não”, é a partir da comunidade indígena, de sua relação com a natureza, de seu espírito comunitário, que estão resistindo ao capitalismo, ao neoliberalismo e às multinacionais imperialistas. Estão na vanguarda das lutas e isso se traduziu, por exemplo, em Cochabamba, Bolívia, na Conferência Mundial dos Povos contra a Mudança Climática e o Neoliberalismo, com a participação de dezenas de milhares de delegados indígenas, ambientalistas, de esquerda, sindicais, etc., onde se decidiu lutar para defender a mãe terra contra o caráter destruidor do capitalismo. E gosto sempre de recordar que nos anos 1930, Walter Benjamin dizia, falando de Bachofen e da discussão sobre a comunidade primitiva, que as comunidades primitivas consideravam a natureza como uma mãe generosa, ao passo que o capitalismo é um sistema não apenas de destruição, mas, sim, de assassinato da natureza. Corresponde quase literalmente à resolução da Conferência de Cochabamba.
Pensando em Walter Benjamin e nesta veia do pensamento quente, poderíamos dizer que a crítica que se inscreve na discussão do romantismo abona a ideia de que no próprio marxismo, em Marx mesmo e em Engels, não há uma temporalidade linear? Porque não poderíamos compreender tais resistências ao capitalismo e os movimentos abertamente contestatórios sob uma perspectiva linear progressista de acumulação de experiência política. Sua exposição me faz pensar que no próprio Marx também podemos perceber que existe a possibilidade de compreender estas resistências sob uma ideia de temporalidade distinta, e que também poderia estar presente nesta discussão sobre o romantismo. E por isso para aprofundar nesta ideia do por que insistir na crítica romântica, gostaríamos que você relacionasse isto com a sua proposta sobre o ecossocialismo, sobre como toda esta discussão sobre sua leitura da obra de Marx, o romantismo e sua própria análise se projetam nesta proposta.
Eu acrescentaria outro problema que tem a ver com tudo isto. Quando pensamos em uma corrente quente e uma corrente fria, que se combinam para superar o capitalismo, nos exemplos que você nos trouxe sobre as comunidades indígenas e a defesa da mãe terra, não faria falta, aí, uma análise fria da crítica da economia política capitalista? Como a partir do marxismo podemos, por exemplo, por meio da proposta ecossocialista, aproximar as duas perspectivas?
O ecossocialismo que se refere à herança marxista procura incorporar as duas correntes. A crítica de Marx à Economia Política capitalista, que inclui os três volumes de O Capital e tudo o que Marx realizou como análise científica do capitalismo, juntamente com o que se fez depois, com a análise do imperialismo, etc. Temos que nos apropriar de toda a tradição marxista de análise científica do que é o capitalismo, o imperialismo, a globalização, etc. E isso também está presente, inclusive, na declaração de Cochabamba, em sua análise do neoliberalismo e o capitalismo.
Devemos integrar as duas correntes. O ecossocialismo procura justamente associar a crítica ambiental ao produtivismo, consumismo e caráter destruidor das forças produtivas capitalistas à análise marxista de como funciona o sistema capitalista. O ecossocialismo toma da crítica romântica ao capitalismo a ideia de que o capitalismo não é simplesmente um progresso. É ao mesmo tempo progresso e regressão. Do ponto de vista de certas conquistas científicas e técnicas, é um avanço, mas do ponto de vista humano e da relação com a natureza, é desastroso. É preciso romper com essa visão linear da história como progresso, segundo a qual o desenvolvimento das forças produtivas nos levará ao socialismo. Pensar que quanto mais se avança a produtividade e as formas mais sociais da produção, mais nos aproximamos do socialismo, é uma ilusão. O ecossocialismo rompe com esta visão que está presente, se não em Marx e Engels, em boa parte da tradição marxista. O ecossocialismo concebe que o caráter destruidor do capitalismo, que Marx já havia previsto, mas não havia desenvolvido, hoje em dia é um dos problemas mais importantes da luta revolucionária, porque o capitalismo está conduzindo a uma catástrofe ecológica. A mudança climática, em especial, sem precedentes na história da humanidade, é uma ameaça à própria existência da vida no planeta e, portanto, isso recoloca a questão da luta anticapitalista em termos novos, mais radicais. O que é necessário conceber é a superação de uma visão muito estreita que existiu na esquerda marxista, no passado, segundo a qual a revolução tem como tarefa transformar as relações de produção para permitir o livre desenvolvimento das forças produtivas. Isso não funciona assim. Do ponto de vista ecossocialista, sabemos que as próprias forças produtivas, o aparato produtivo, são capitalistas, estão ao serviço do capitalismo e possuem uma dinâmica destruidora do meio ambiente, da natureza, dos equilíbrios ambientais.
O aparato produtivo, da forma como existe, baseado nas energias fósseis, nos pesticidas, nos produtos químicos, etc., é o que está nos levando ao desastre. Temos que pensar a transformação revolucionária não apenas das relações de produção, mas também do aparato produtivo, do padrão de consumo que é totalmente artificial e insustentável, dos meios de transporte, etc. É toda a civilização que deve ser mudada desde a sua raiz, de seus fundamentos. A visão da transformação revolucionária que o ecossocialismo propõe é muito mais radical do que certa visão tradicional da esquerda que se limitava a apresentar a questão da propriedade privada, que obviamente é muito importante porque o primeiro passo é romper com a propriedade privada, mas a transformação não termina aí, mas, sim, inicia-se. Uma mudança que implica transformar o conjunto da civilização, romper com o paradigma da civilização industrial-capitalista ocidental moderna e apresentar uma nova civilização ecossocialista baseada em outros valores: no valor de uso e não no valor de troca, na solidariedade e não na concorrência, no planejamento democrático e não no mercado selvagem. Trata-se de uma abordagem radical.
Vendo o panorama e todos os elementos que nos apresenta, acrescentamos um ponto final. Hoje em dia, estamos frente a uma espécie de “retorno do marxismo”, que nos permite refletir sobre todos os temas que você abordou, mas não podemos negar que, por outro lado, no espectro social generalizado se produz um aumento e aprofundamento do individualismo e da alienação. A partir deste marco geral, como poderíamos recuperar para esta discussão a insistência da perspectiva do romantismo sobre o sujeito autárquico, autônomo, sem colocá-lo em discussão com algo que está presente, por exemplo, em Luckács, em “História e consciência de classe”, e que tem a ver com o problema do coletivo e o sujeito? Ou seja, como não cair na perspectiva conservadora do romantismo, que insiste em um sujeito autônomo, autárquico, mas que o separa das relações coletivas e das relações sociais e que à sociedade contemporânea cai muito bem? Como lidar com isso que Luckács observava?
A crítica dos românticos ao capitalismo tem duas vertentes que não são contraditórias, mas, sim, distintas. Uma é a afirmação da singularidade dos indivíduos, a valorização do indivíduo em sua qualidade única e singular. Cada indivíduo tem uma singularidade que tem um valor humano profundo. Porém, o que faz o capitalismo? Uniformiza todos os indivíduos, destrói a singularidade, faz de todos cópias uns dos outros, todos consomem a mesma Coca-Cola, todos veem os mesmos filmes, todos se sentam diante de sua televisão. Produz-se uma homogeneização e uma uniformização mercantil que destrói essa qualidade singular dos indivíduos. Por outro lado, dizem os românticos, o capitalismo destrói os vínculos comunitários, as relações sociais coletivas, atomizando as pessoas, deixando os indivíduos atomizados, dissociados, então, o indivíduo já não vai ao sindicato, ao partido, nem ao café ou ao teatro, mas, sim, fica em sua casa com sua televisão individualmente. Essa atomização é uma característica do capitalismo.
Acredito que podemos recuperar esses dois elementos da crítica romântica. Ao mesmo tempo, valorizar o sujeito individual, em sua singularidade, em sua autenticidade e, por sua vez, valorizar as relações sociais, comunitárias, não apenas a comunidade tradicional sobre a qual falavam os românticos, mas, sim, novas formas comunitárias como podem ser o sindicato, o partido, o movimento social, o grupo de afinidade, etc. A luta de classes, em um sentido amplo, e todo o conjunto de lutas que tem a ver com o enfrentamento social são novas formas coletivas de comunidade fundamentais, porque não haverá mudança social sem organização coletiva. Nisso Luckács tem toda a razão.
Podemos reivindicar esta crítica romântica em suas duas dimensões, mas obviamente sabemos que a transformação social passa pela organização dos oprimidos e explorados. Trata-se de uma luta contra essa atomização individualista, essa guerra de todos contra todos do espírito do capitalismo. É uma luta que não sabemos se vamos ganhar, como dizia, Daniel Bensaïd, é uma aposta.
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“O caráter destruidor do capitalismo é um dos problemas mais importantes da luta revolucionária”. Entrevista com Michael Löwy - Instituto Humanitas Unisinos - IHU