22 Mai 2014
"Os paulistanos vêm sendo confrontados com imagens desalentadoras de leitos de represas rachados que remetem a memória ao semiárido brasileiro. No entanto, elas são do Sistema Cantareira, no estado de São Paulo, um dos maiores sistemas de abastecimento de água do mundo, responsável por atender mais de 12 milhões de habitantes nas Regiões Metropolitanas de São Paulo (RMSP) e Campinas. Nesse momento, o sistema opera com pouco menos de 15% de sua capacidade [1], o menor nível registrado desde que foi criado no início da década de 70", escreve João Campari, Ph.D. em Economia Ambiental e Diretor de Programas de Conservação da TNC, e Samuel Barrêto, especialista em Recursos Hídricos e Coordenador do Movimento Água para São Paulo (MApSP) da TNC, em artigo publicado pelo sítio The Nature Conservancy e reproduzido pelo sítio Mercado Ético, 21-05-2014.
Eis o artigo.
Os moradores da maior cidade do Brasil estão apreensivos com a possibilidade de terem que enfrentar um racionamento de água prolongado, provocado pela baixa recorde no volume do Sistema Cantereira, um conjunto de represas que abastecem a Grande São Paulo. A discussão sobre as possíveis soluções para o abastecimento na capital paulista é urgente e precisa envolver toda a sociedade, por isso, a TNC tem contribuído com esse debate, ao propor alternativas práticas e ambientalmente responsáveis para o problema.
Em março, um dos mais importantes jornais do país, O Estado de S. Paulo, publicou o artigo abaixo, que resume a visão da TNC para a segurança hídrica da capital paulista. Confira e participe do debate você também, por meio do Facebook e do Twitter da TNC.
Os paulistanos vêm sendo confrontados com imagens desalentadoras de leitos de represas rachados que remetem a memória ao semiárido brasileiro. No entanto, elas são do Sistema Cantareira, no estado de São Paulo, um dos maiores sistemas de abastecimento de água do mundo, responsável por atender mais de 12 milhões de habitantes nas Regiões Metropolitanas de São Paulo (RMSP) e Campinas. Nesse momento, o sistema opera com pouco menos de 15% de sua capacidade [1], o menor nível registrado desde que foi criado no início da década de 70.
Estas imagens que são o símbolo da crise atual também têm evidenciado que a água não tem origem nas torneiras que chegam em nossas casas. As soluções que chamam a atenção dos usuários para a racionalidade do uso da água são respostas necessárias, mas estão longe de ser suficientes para resolver o problema. Fechar a torneira não basta. É necessário cuidar da oferta de água onde ela nasce. Assim, uma resposta sistêmica passa pelo manejo de bacias hidrográficas e recuperação dos seus mananciais que, em grande parte, encontram-se degradados, poluídos e cujo entorno foi severamente desmatado. Apenas o Sistema Cantareira perdeu 70% da sua cobertura florestal original agravando o assoreamento dos rios e represas, diminuindo a vida útil desses ambientes. A degradação da vegetação nativa potencializa ainda o efeito das secas.
A interação de todos esses fatores leva a uma situação de risco extremo e representa uma ameaça ambiental, social e econômica. Esse cenário é ainda mais alarmante pois a RMSP e Campinas, juntas, são responsáveis por mais de 22% do PIB do país. Portanto, é mais do que prioritário haver uma resposta estratégica e robusta aos problemas crescentes e urgentes de acesso e fornecimento de água em quantidade e qualidade nos centros urbanos.
É premente irmos além das intervenções convencionais, tais como obras de engenharia. Faz-se necessário respostas sistêmicas; e estas não são de responsabilidade exclusiva dos governos. Existe corresponsabilidade das empresas e da sociedade civil na busca de soluções, pois estas criam valor compartilhado. Assim, é correto que o governo exerça papel de protagonista para fomentar e implementar soluções múltiplas que atinjam diversos setores de uma vez.
A sociedade civil organizada deve ajudar a criar voz cívica para alertar sobre o problema e trazer ao conhecimento de governos e empresas seus melhores exemplos de projetos. ONGs ambientalistas têm o dever de reportar os resultados de seus projetos inovadores para informar a construção de políticas públicas e também para orientar empresas nos seus esforços de responsabilidade social corporativa para o meio ambiente. Uma das frentes mais importantes de colaboração para se chegar a um equilíbrio entre oferta e demanda de água em São Paulo se dará com o fortalecimento dos Comitês de Bacias Hidrográficas.
Damos ênfase ao investimento necessário à recuperação da “infraestrutura verde”, que ocorre por meio da restauração florestal de áreas degradadas, assim como, com a conservação dos remanescentes florestais. Tais iniciativas asseguram a saúde de uma bacia hidrográfica. Essa intervenção, quando bem manejada, minimiza o risco de eventos extremos e reduz a vulnerabilidade de populações a enchentes e estiagens prolongadas. Além disso, reduz a erosão e o assoreamento dos rios e represas e melhora substancialmente a integridade do solo, retendo e armazenando a água. Ou seja, as florestas prestam um serviço ambiental de regulação e segurança hídrica à população.
Nova Iorque ilustra bem essa equação. Há décadas a administração da cidade optou por purificar a água filtrando-a naturalmente pelas florestas, a um custo inicial de US$ 1 a 1,5 bilhão no período de dez anos. Esse valor foi sete vezes menor que os US$ 6 a 8 bilhões que seriam gastos na forma tradicional de tratar e distribuir água potável, mais US$ 300 a 500 milhões anuais em custos operacionais.
Estudo recente da ONG ambiental The Nature Conservancy (TNC) revelou que recuperando-se 12 mil hectares de áreas desmatadas e corrigindo processos erosivos em 2 mil hectares nas bacias dos rios Piracicaba, Capivari, Jundiaí e Alto Tietê, o nível de sedimentos que corre para os rios diminuiria em 50%. Ou seja, a capacidade dos reservatórios aumentaria, ao passo que diminuiria os investimentos feitos em dragagem e tratamento para remoção de sedimentos.
A oportunidade de aprendermos com a crise atual está posta. Se tivermos discernimento para atuar de forma sistêmica e capacidade política e interinstitucional, poderemos reduzir os riscos de um desabastecimento. E mais do que isso, temos a oportunidade de promover a integridade das bacias hidrográficas e a segurança hídrica para os seus diferentes usuários, fatores indispensáveis para a estabilidade social e econômica de São Paulo.
Para saber mais e participar da TNC e dos programas de segurança hídrica acesse a página da campanha “De Onde Vem a Sua Água?”
[1] Nota de atualização: Desde que o artigo foi publicado, o nível de água do sistema Cantareira caiu ainda mais, para cerca de 10% da capacidade.
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O Sistema Cantareira: risco ou oportunidade? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU