17 Novembro 2012
Poços do pré-sal são mais profundos que aqueles do Golfo, e um desastre ambiental em função da extração petrolífera seria devastador. Empresas que lucraram com o derretimento do Ártico agora querem explorar seus combustíveis fósseis, alerta a especialista.
“Empresas petrolíferas como a Shell, BP, Exxon, Gazprom, Rosneft, entre outras, querem arriscar um derrame de petróleo devastador no Ártico para usufruir de poços que serão exauridos em apenas três anos. As mesmas empresas de energia suja que causaram o derretimento do Ártico agora querem lucrar com o desaparecimento do gelo. Lidar com o derramamento de petróleo em águas congeladas é quase impossível e erros inevitáveis iriam destruir o frágil ambiente do Ártico”. A declaração assustadora é da conselheira de políticas oceânicas do Greenpeace, Nathalie Rey, em entrevista exclusiva à IHU On-Line, concedida por e-mail.
E continua: “Tendo em conta o interesse crescente de petróleo no Ártico, é importante olhar para os profundos e contínuos impactos do derramamento da Exxon Valdez, em 1989, no Golfo do Alasca, para dar um exemplo arrepiante do que um futuro derramamento de petróleo no Ártico poderia significar para o ecossistema. Após o encalhamento do petroleiro da Exxon Valdez, em março de 1989, 2 mil km imaculados da costa de Alasca estavam contaminados e os efeitos continuam a ser sentidos em ambientes marinhos e costeiros, duas décadas depois. O impacto imediato do Exxon Valdez em mamíferos marinhos e aves marinhas foi devastador. Mortalidade em massa de animais marinhos foram registradas logo após o acidente, incluindo 250 mil mortes de aves marinhas, documentados nos dias após o derramamento”.
Além da extração do petróleo, o uso dos combustíveis fósseis constitui ameaça severa aos oceanos, pondera a ambientalista. “O Greenpeace está atualmente em campanha para salvar o Ártico, clamando pela proibição de perfuração de poços de petróleo e pesca industrial no Ártico e para que um santuário global seja estabelecido em torno do polo norte”.
Ela critica a abordagem predominante na Rio+20: “A batalha pelos oceanos, apesar dos EUA e seus comparsas, que impediram um avanço formal do acordo, foi crucialmente reforçada no Rio de Janeiro e deu à questão um novo nível de destaque e apoio sincero, tanto politicamente quanto na mídia”.
Nathalie Rey é conselheira de políticas oceânicas do Greenpeace Internacional. Para analisar a extração do pré-sal no Brasil, a assessora de políticas públicas do Greenpeace, Renata Camargo, foi convidada a colaborar no debate que propomos.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Qual a sua opinião sobre as decisões tomadas em relação aos oceanos na Rio+20? Elas lhe surpreenderam ou esses resultados já eram esperados?
Nathalie Rey – O Futuro que queremos, o documento final, pouco progrediu em relação a compromissos já existentes sobre os oceanos. Business as usual foi, de longe, a abordagem predominante na Rio+20. Enquanto alguns parágrafos sobre os oceanos incluíam algum texto positivo, a maior decepção foi que o evento não conseguiu dar luz verde para o lançamento de um novo acordo da ONU para proteger a vida marinha em alto-mar. A ausência de prazos em relação à eliminação gradual de subsídios prejudiciais a pesca, além da ausência de prazos em relação à eliminação da pesca ilegal, não regulamentada e não declarada destaca a falta de ambição dos Estados em dar um passo extra no Rio de Janeiro.
O Greenpeace estava cético em relação ao tipo de texto que seria entregue pela conferência e ao nível de comprometimento político que os governos teriam de chegar para que tivéssemos o futuro de que precisamos. Para o Greenpeace, o comprometimento em iniciar as negociações para um novo acordo sob a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, que protegeria a biodiversidade marinha em alto-mar e habilitaria o estabelecimento de reservas marinhas, foi um dos poucos resultados razoáveis. No entanto, um grupo de países – EUA, Canadá, Venezuela, Rússia e Japão – bloqueou esse plano de resgate de oceanos.
Campanha contínua
A batalha pelos oceanos, apesar dos EUA e seus comparsas, que impediram um avanço formal do acordo, foi crucialmente reforçada no Rio de Janeiro e deu à questão um novo nível de destaque e apoio sincero, tanto politicamente quanto na mídia. A grande maioria dos governos ativamente pronunciou-se em prol de um plano de resgate de oceanos, incluindo o Brasil, país-sede, a União Europeia, África do Sul, Índia e os Estados de Ilha do Pacífico. Um grande número de presidentes e ministros, incluindo a presidente Dilma Rousseff, primeira-ministra Julia Gillardm, da Austrália, e muitos líderes europeus falaram da necessidade de proteção do alto-mar durante suas intervenções na Cúpula do Rio. A presidente Dilma corajosamente afirmou em seu discurso de encerramento que iríamos negociar um acordo sobre a biodiversidade marinha.
A Rio+20 não entrará para a história como a Cúpula dos Oceanos, como especularam alguns meios de comunicação brasileiros. Contudo, a Rio+20 deu proeminência ao alto-mar como um desafio global central, e forneceu uma clara data de término – final de 2014 – para quando um acordo sobre biodiversidade de alto-mar deve ser decidido pela Assembleia Geral das Nações Unidas. O Greenpeace vai continuar sua campanha para a proteção dos oceanos do mundo. Instamos os governos a garantir que, em 2014, a luz verde finalmente seja dada para um plano de resgate de oceanos de alto-mar, e que ações sejam tomadas para proteger os nossos oceanos.
IHU On-Line – Quais são as mudanças significativas na conservação dos oceanos que se estabeleceram na Rio+20, em comparação com a Eco 92?
Nathalie Rey – Os compromissos assumidos na Rio+20, em sua maioria, apenas reiteraram os compromissos assumidos no Rio de Janeiro, em 1992, ou na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável de Joanesburgo, em 2002. Infelizmente, um grande número de compromissos não foi cumprido – por exemplo, a implementação de avaliações de impactos ambientais, a eliminação da pesca pirata e a eliminação gradual dos subsídios.
Ao contrário do Rio de Janeiro em 2012, A Cúpula da Terra de 1992 assistiu ao lançamento de um processo que levou a um acordo da ONU para proteger unidades populacionais de peixes altamente migradores – o Acordo sobre Estoques Pesqueiros das Nações Unidas (UN Fish Stocks Agreement), que levou ao estabelecimento de um número de organizações de gestão regional de pesca. Na Rio+20 teve-se a oportunidade de lançar um acordo semelhante para proteger a biodiversidade de alto-mar, mas a chance de fazê-lo foi perdida.
IHU On-Line – Qual é o impacto da extração de petróleo e derramamento de petróleo sobre o ecossistema marinho?
Nathalie Rey – A perfuração de petróleo exploratório e de produção em larga escala tem graves consequências para o ambiente natural, devido aos produtos químicos que são liberados em consequência da perfuração, bem como os impactos devastadores de derramamentos de óleo. Dois anos após o desastre de Deepwater Horizon, no Golfo do México, os impactos do derramamento de óleo ainda são claramente visíveis. Formações de corais bastante abaixo do leito marítimo e a quilômetros de distância do poço rompido foram danificadas pelos efeitos do petróleo e dos produtos químicos liberados durante o desastre – e ainda contêm os restos do petróleo derramado. Pescadores também relataram números preocupantes de frutos do mar que foram deformados e transformados por produtos químicos liberados durante o derramamento de óleo, ilustrando um preocupante impacto sobre o ecossistema marinho da região.
Tendo em conta o interesse crescente de petróleo no Ártico, é importante olhar para os profundos e contínuos impactos do derramamento da Exxon Valdez, em 1989, no Golfo do Alasca, para dar um exemplo arrepiante do que um futuro derramamento de petróleo no Ártico poderia significar para o ecossistema. Após o encalhamento do petroleiro da Exxon Valdez, em março de 1989, 2.000 km imaculados da costa de Alasca estavam contaminados e os efeitos continuam a ser sentidos em ambientes marinhos e costeiros duas décadas depois. O impacto imediato do Exxon Valdez em mamíferos marinhos e aves marinhas foi devastador. Mortalidade em massa de animais marinhos foi registrada logo após o acidente, incluindo 250 mil mortes de aves marinhas, documentados dias após o derramamento. Um estudo dos impactos sobre o ecossistema em longo prazo concluiu que óleo tem persistido em quantidades surpreendentes e em formas tóxicas, tendo impactos em longo prazo sobre o ecossistema marinho. Tais impactos sobre a vida selvagem, como salmão, patos e lontras do mar foram também aparentes ao longo das décadas seguintes. Populações de espécies de mamíferos marinhos também foram grandemente impactadas com as populações de baleias assassinas reduzidas em 40%.
Não só a exploração do petróleo tem impactos negativos sobre o mundo marinho, mas também os efeitos das alterações climáticas decorrentes do uso de combustíveis fósseis é talvez a mais significativa ameaça para os oceanos. O Greenpeace está em campanha para salvar o Ártico, clamando pela proibição de perfuração de poços de petróleo e pesca industrial no Ártico e para que um santuário global seja estabelecido em torno do polo norte.
IHU On-Line – Como o Greenpeace vê a descoberta do chamado petróleo pré-sal pelo Brasil? Quais impactos a extração do petróleo naquela profundidade pode causar na vida marinha?
Nathalie Rey e Renata Camargo – O Greenpeace vê com bastante preocupação a exploração do petróleo na camada de pré-sal. Por ser um combustível fóssil, o pré-sal é como uma bomba de carbono. Segundo o nosso mapa de emissões, se os 80 bilhões de barris de petróleo das reservas de pré-sal se consolidarem, o Brasil despejará 197% a mais de CO2 na atmosfera até 2020. Num cenário de 40 anos, serão 35 bilhões de toneladas de CO2. Nessa toada, o Brasil ficará entre os três maiores emissores de gases do efeito estufa, mesmo se zerarmos o desmatamento.
Além disso, por estar em águas profundas, a biodiversidade marinha está totalmente vulnerável. Para se ter ideia dos impactos da vida marinha, basta ver os resultados de vazamentos no Golfo do México em 2010. Os poços do pré-sal são mais profundos que os do Golfo, e nós sequer temos Plano Nacional de Contingência para lidar com acidentes na indústria de petróleo e gás. O acidente da Chevron, na Bacia de Campos, foi um alerta de que o país não está pronto para lidar com a exploração do pré-sal.
IHU On-Line – Por que o mar Mediterrâneo é o mar mais poluído do planeta? Existe uma explicação para isso?
Nathalie Rey – O mar Mediterrâneo é semifechado com troca de água limitada que faz com que o mar seja muito sensível ao aumento de poluentes. Ele sofre os efeitos da poluição, da indústria, da agricultura e dos centros urbanos na maioria dos países da região. Assim como as fontes de poluição litorais, outras fontes situam-se no interior e os poluentes são transportados pelos muitos rios que drenam para o mar. A multiplicidade de produtos químicos usados para criar uma vasta gama de produtos de uso domésticos e industriais, incluindo plásticos, plastificantes, materiais de embalagem, pesticidas, fertilizantes, solventes, e um grande número de outros produtos perigosos, representa uma grave ameaça para a região. Um grande número de indústrias localizadas ao longo da costa joga regularmente milhares de toneladas de resíduos tóxicos diretamente nas águas do Mediterrâneo.
O turismo tem um grande impacto sobre seu estado de conservação. A grande sazonalidade do turismo na região significa que a maioria dos visitantes está presente durante os meses de verão, produzindo grandes quantidades de resíduos sólidos e águas residuais que não podem ser tratados adequadamente devido à infraestrutura insuficiente de pequenas cidades e aldeias costeiras, cujos serviços foram originalmente construídos para servir apenas a uma pequena população permanente.
Finalmente, o mar Mediterrâneo é uma das regiões mais movimentadas do mundo em termos de transporte e um mar no qual a indústria do petróleo é altamente ativa, aumentando o risco de acidentes. Em média, há cerca de 60 incidentes por ano, dos quais 15 envolvem navios, e 60% ocorrem perto de instalações petroquímicas. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA estimou, em 2002, que nos quinze anos anteriores cerca de 55 mil toneladas de óleo tinham sido acidentalmente derramadas no Mediterrâneo com três acidentes graves, representando 75% de um total de 58 acidentes.
IHU On-Line – Quais outros ecossistemas marinhos sofrem devido à poluição?
Nathalie Rey – Muitos ecossistemas estão pagando o preço da poluição, de uma maneira ou de outra. Um exemplo extremo é o vórtice de lixo do tamanho do Texas no Pacífico Norte, onde há um montante estimado em seis quilos de plástico para cada quilo de plâncton natural, juntamente com outros tipos de lixo de degradação lenta. Assim, formou-se um redemoinho que engolfou peixes mortos, mamíferos marinhos e aves. Alguns plásticos presos no redemoinho não irão se degradar durante a vida dos netos daqueles que jogaram tais plásticos fora.
Artigos maiores como garrafas de plástico não degradam como materiais naturais. Sob a influência da luz solar, a ação das ondas e a abrasão mecânica eles simplesmente quebram esses artigos em partículas cade vez menores. Uma única garrafa de um litro poderia ser fragmentada em partículas pequenas o suficiente para que um pedaço dela fosse parar em cada milha de praia em todo o mundo. Estas partículas menores juntam-se em bolotas (ou bolinhas) de plástico, a forma em que muitos novos plásticos são comercializados hoje, que podem ser lançadas no mar pelo tambor de carga ou mesmo através da perda de cargas de contêiners inteiros.
Artigos maiores são consumidos por aves marinhas e outros animais que os confundem com presas. Muitas aves marinhas e seus filhotes foram encontrados mortos, seus estômagos cheios de artigos de plástico de médio porte, tais como partes superiores de garrafa, isqueiros e balões. Uma tartaruga encontrada morta no Havaí tinha mais de mil peças de plástico em seu estômago e intestinos. Estima-se que mais de um milhão de pássaros marinhos e 100 mil mamíferos marinhos e tartarugas marinhas sejam mortos anualmente pela ingestão de plásticos ou por ficarem presos a eles.
IHU On-Line – Por outro lado, há verdadeiros “santuários” de conservação marinha. Quais são os principais em termos de conservação e o que significam para a biodiversidade em águas oceânicas?
Nathalie Rey – Consistente com a ciência, o Greenpeace está em campanha para que 40% dos oceanos sejam preservados em uma rede global de reservas marinhas. Reservas marinhas, ou santuários no mar, são áreas altamente protegidas, que estão fora dos limites para todos os usos de extração e destruição, incluindo a pesca. Onde reservas marinhas foram implementadas no mundo, elas trouxeram uma gama de benefícios de conservação e, em muitos lugares, benefícios de pesca também foram encontrados. Elas têm resultado em aumentos rápidos, de longa duração e em abundância na diversidade, tamanho e produtividade da vida marinha dentro das reservas, bem como tem tido efeitos poderosos em áreas vizinhas. A pesquisa também mostrou que quanto maior o tamanho da reserva, mais benefícios elas têm.
As reservas marinhas mais notáveis são a Grande Barreira de Corais na Austrália, onde mais de 33% do Parque Marinho da Grande Barreira de Corais está agora em áreas chamadas de no-take (“não se pega”) onde todas as formas de pesca e coleta são proibidas. Em 2006, o governo dos EUA estabeleceu o Papahānaumokuākea (Ilhas Havaianas do Noroeste), o Monumento Nacional Marinho, englobando quase 140 mil km2 de águas dos EUA, incluindo o habitat que abriga mais de 7 mil espécies. O governo dos EUA eclipsou esta designação três anos mais tarde pela restrição de pesca, mineração e outras atividades extrativas nas águas do Pacífico da Mariana de Trench, Ilhas do Pacífico Remoto e Atol de Rose que, em seu total, englobam uma massa de 195.274 milhas quadradas. Em 2006, Kiribati declarou sua intenção de criar a Área de Proteção das Ilhas Phoenix. Com um tamanho de 408.250 km2 (ou milhas quadradas) este é o maior esforço de conservação marinha desse tipo por um país em desenvolvimento.
No entanto, uma rede global de áreas protegidas no oceano ainda fica bem atrás daquelas existentes em terra. Atualmente, apenas 4% dos oceanos são protegidos dentro das zonas econômicas de 200 milhas náuticas exclusivas dos países. Já o alto-mar, com menos de 1% de suas áreas sob proteção, é a parte menos protegida do planeta. Numa época em que nossos oceanos, incluindo recifes de coral, montanhas submarinas e outros habitats sensíveis, podem estar chegando a um ponto crítico, o estabelecimento de redes de reservas marinhas em larga escala é necessário para restaurar a saúde dos nossos oceanos. Protegendo 20-30% dos oceanos globais através de uma rede de MPAs poderia-se criar um milhão de postos de trabalho e sustentar uma captura de peixes marinhos no valor de US$ 70 bilhões/ano. Eventualmente, para reverter o excesso de pesca e o impacto de outras atividades industriais, a rede global de reservas marinhas deve cobrir 40% dos oceanos.
IHU On-Line – De acordo com o Centro Nacional de Dados sobre Neve e Gelo dos Estados Unidos, a extensão de gelo marinho no Ártico no verão atingiu o mínimo mais alto de todos os tempos. O que o derretimento deste gelo significa para as várias formas de vida nos oceanos e outros ecossistemas?
Nathalie Rey – A região do Ártico sustenta alguns dos mamíferos mais conhecidos do mundo, como baleias, ursos polares e focas, além de milhões de aves residentes e migratórias (15% de todas as espécies do mundo passam sua época de reprodução no Ártico) e uma rica e diversificada vida marinha, incluindo alguns dos maiores oceanos de pesca do mundo. A perda de gelo do mar já está gerando graves consequências para a vida selvagem, impactando na migração, alimentação e padrões de acasalamento. Por exemplo, o declínio do gelo do mar está comprometendo a capacidade de ursos polares para caçar comida e, como resultado, algumas populações de ursos polares estão em declínio. Outras espécies dependentes de gelo também estão sendo afetadas por essas grandes mudanças em seu habitat, tais como a morsa. Em áreas onde o gelo do mar está recuando, morsas são forçados a caçar em águas ainda mais profundas para alimentar, onde o acesso à alimentação é muito mais difícil.
O Ártico não apenas abriga essa vida selvagem rica e diversificada, como também desempenha um papel fundamental na regulação do clima global, e é aqui que as mudanças na região poderiam ter graves implicações para o resto do planeta. Interações do ar e da água na região influenciam os padrões de circulação dos oceanos e o reflexo do gelo e da neve polar limita a quantidade de luz solar e calor absorvidos pela terra, agindo como um condicionador de ar global. As camadas de peat (turfa) e permafrost (pergelissolo) no Ártico também armazenam grandes quantidades de carbono.
Risco ambiental e energia suja
O recuo do gelo do mar também está abrindo a pesca ártica. A frota Barents de pescadas já está se arriscando mais ao Norte do que nunca antes, pois o derretimento do gelo ártico está abrindo novas rotas de transporte, como as passagens Noroeste e Nordeste. Novos acessos para o transporte trazem consigo o risco de impactos ambientais ainda mais prejudiciais, perigo mais evidente sendo um derramamento de óleo de um petroleiro. Dado o parco mapeamento da área, a capacidade de busca e salvamento insuficientes e pelo fato de que não existem recursos para lidar com qualquer tipo de derramamento significa que estas novas rotas de transporte estão colocando o Oceano Ártico, sua vida selvagem e as pessoas que dependem deles em risco.
O derretimento do gelo do mar também está abrindo novas áreas para perfuração de poços de petróleo, iniciando uma nova corrida por petróleo ártico. Empresas petrolíferas como a Shell, BP, Exxon, Gazprom, Rosneft, entre outras, querem arriscar um derrame de petróleo devastador no Ártico para usufruir de poços que serão exauridos em apenas três anos. As mesmas empresas de energia suja que causaram o derretimento do Ártico agora querem lucrar com o desaparecimento do gelo. Lidar com o derramamento de petróleo em águas congeladas é quase impossível e erros inevitáveis iriam destruir o frágil ambiente do Ártico.
Para perfurar no Ártico, as companhias de petróleo têm que afastar icebergs do caminho de seus equipamentos de perfuração e usar mangueiras gigantes para derreter o gelo flutuante com água morna. Nós vimos os enormes danos causados pelos desastres da Exxon Valdez e da Deepwater Horizon – não podemos deixar isso acontecer no Ártico. Para protege-lo do aumento das temperaturas e a ameaça de perfuração de petróleo, temos de reduzir a nossa dependência do petróleo.
Ciência e cifrões
As reservas marinhas são importantes como ferramentas para proteger os oceanos, mas também é necessário garantir que a pesca sustentável aconteça fora desses santuários. O excesso de pesca está custando à humanidade cerca de US$ 50 bilhões por ano, roubando peixes de comunidades costeiras vulneráveis em todo o mundo. No Rio de Janeiro, os governos devem focar nos benefícios de longo prazo para as sociedades, e não ser influenciados pelos interesses de curto prazo de suas indústrias de pesca. Os Estados devem fortalecer seus esforços para manter e restaurar pesqueiros em níveis sustentáveis e criar planos, promovendo decisões baseadas na ciência, não em cifrões.
Dada a capacidade da frota de pesca do mundo, estão sendo capturados 2,5 vezes a quantidade de peixes considerada sustentável pelos cientistas. Estima-se que, se as populações de peixes fossem reconstruídas, as capturas marinhas atuais poderiam ser alcançadas com quase metade do esforço de pesca global atual. O fato é que existem muitos barcos grandes pegando muitos peixes. É preciso reduzir o número de navios a fim de garantir que a pesca excessiva não continue. Esforços deverão incidir dando acesso prioritário à pequena pesca de baixo impacto para pesqueiros. Dados de 2003 estimam que US$ 25 bilhões são gastos em subsídios de pesca. Os governos continuam a drenar bilhões de dólares para a indústria de pesca todos os anos, sustentando negócios não rentáveis e que promovem a pesca excessiva. Os governos devem agir para eliminar esses subsídios prejudiciais, tanto do ponto de vista ambiental quanto social e isso inclui aqueles que vão para a pesca.
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A sede pelo petróleo e a destruição dos oceanos. Entrevista especial com Nathalie Rey - Instituto Humanitas Unisinos - IHU