19 Julho 2007
A liberação das obras para a construção das usinas hidrelétricas do Rio Madeira gerou uma nova crise entre Brasil e Bolívia. O Brasil comprometeu-se a fornecer informações técnicas sobre as licenças ambientais prévias em relação às obras, mas garante que o assunto não vai transformar-se num caso político-diplomático. O Ministério das Relações Exteriores brasileiro deixou claro que “não aceitará barganhas nem discutirá o tema em nível ministerial”. No entanto, é preciso lembrar que essas usinas serão instaladas a cerca de 30 km da fronteira entre Brasil e Bolívia, o que certamente gerará impactos no país vizinho.
A IHU On-Line entrevistou, por e-mail, o assunto com Javier Aramayo Caballero, presidente do Fórum Boliviano Meio Ambiente e Desenvolvimento. Na entrevistou, Javier fala das reações à aprovação da construção das usinas do Rio Madeira, da influência do presidente boliviano Evo Morales e do uso dos recursos energéticos em seu país. Para Javier, “toda decisão prepotente e imperialista, como a adotada pelo presidente Lula, é inaceitável e deve ser condenada pelo povo”.
Javier Aramayo Caballero é advogado e presidente do Fórum Boliviano Meio Ambiente e Desenvolvimento – Fobomade. Trabalha assessorando as organizações sociais de povos indígenas e campesinos na Amazônia e no Oriente do Grande Chaco.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Que tipos de reações à aprovação da construção das usinas do Rio Madeira podem vir dos movimentos sociais contrários às obras?
Javier Aramayo Caballero – Toda decisão prepotente e imperialista, como a adotada pelo presidente Lula, é inaceitável e deve ser condenada pelo povo. Assim, acredito que o Movimento Social pela Defesa da Bacia do Rio Madeira deva assumir posições por meio de medidas de pressão social. Também é necessário pontuar, para que a opinião pública saiba, que os movimentos sociais não estão se opondo a nenhuma obra, mas sim a uma catástrofe socioambiental eminente, patrocinada pelos interesses econômicos, que estão confiscando a vida para conseguir os benefícios do luxo e da opulência de uns poucos frente à pobreza e às enormes necessidades que suportam os seres humanos.
IHU On-Line – Como o senhor analisa as ações do governo Evo Morales em relação às Usinas do Rio Madeira?
Javier Aramayo Caballero – O governo Evo Morales tem virtudes e debilidades no cenário internacional. A Bolívia vive uma conjuntura de transição política e social. No entanto, é conveniente ter claro que este conflito internacional não pode ser tratado sobre a base de uma agenda bilateral, pois isso não salvaria a Bacia do Madeira. Em todo o caso, não deveria se descartar a intervenção de um organismo internacional competente, imparcial e objetivo, e isso não pode ser feito apenas pelo governo da Bolívia.
IHU On-Line – Que impactos vocês prevêem na fronteira em razão da construção das usinas?
Javier Aramayo Caballero – Os impactos potenciais podem ser visualizados nos próprios estudos de avaliação de impacto ambiental, mas que na minha opinião são inexatos e incompletos. Um dos aspectos é a destruição da base econômica produtiva, que, de forma ecológica e natural, existe e pode se potencializar sem agravantes, quer dizer, não somente se perde a integralidade territorial como também a viabilidade como Estado Soberano e independente. São de conhecimento, entre outros aspectos, prováveis problemas relacionados à saúde, como a multiplicação de doenças e o agravamento da base alimentícia da população, por exemplo.
IHU On-Line – A Bolívia está satisfeita com suas formas de trabalhar os próprios recursos energéticos?
Javier Aramayo Caballero – As empresas transnacionais ainda controlam o excedente econômico, com exceção dos hidrocarbonetos, que foram recuperados, por exemplo, da própria Petrobras, que por muitos anos assaltou o tesouro do Estado boliviano. Atualmente, a Bolívia transita por um processo de transformação social e democrático com muitas dificuldades, que deveria ser aprofundada pela Assembléia Constituinte até um novo texto constitucional.
Os recursos energéticos da Bolívia constituem um enorme potencial que, desde a visão integral e sustentável de desenvolvimento, devem atender ao interesse nacional e ao ser humano tendo o Estado o controle dos recursos naturais. Logo, sua debilidade teve como conseqüência a aplicação das denominadas "políticas de ajuste estrutural" receitadas pelo Banco Mundial e pelo Fundo Monetário Internacional, o que significou o desmantelamento do Estado e o nefasto papel exercido pelas empresas transnacionais, em particular a partir do ano de 1985.
IHU On-Line – Que tipos de exigências ambientais precisam ser inseridas no projeto para que as usinas do Rio Madeira criem o menor número de problemas para as populações que vivem dele?
Javier Aramayo Caballero – A alternativa é deixar que corram livremente as águas e seus afluentes, até que estabeleçam um novo modelo de desenvolvimento frente ao evidente fracasso praticado pelo Brasil e, fundamentalmente, pelo livre comércio através do atual projeto.
IHU On-Line – Em sua opinião, qual é o verdadeiro interesse em relação à construção das usinas do Rio Madeira?
Javier Aramayo Caballero – Percebemos que as elites políticas e econômicas vinculadas ao capital transnacional estão interessadas nesse tipo de projetos-catástrofes. São as mesmas que pretendem assegurar os governantes brasileiros junto aos Estados Unidos, na previsão de que uma diminuição das reservas energéticas no mundo afete a matriz energética.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Usinas do Rio Madeira: Decisão prepotente e imperialista. Entrevista especial com Javier Aramayo Caballero - Instituto Humanitas Unisinos - IHU