10 Agosto 2013
“A cultura nativa da rede acaba entrando em conflito com a cultura secular do jornalismo na medida em que há, na rua, uma disputa, um confronto com a estrutura de poder existente”, aponta o pesquisador.
Foto de simulacoes.com |
Confira a entrevista.
Ao analisar as chamadas “coberturas coletivas” nas redes sociais e o conteúdo produzido pela mídia tradicional após as manifestações que ocorreram em diversas cidades brasileiras no último mês, o pesquisador da Universidade Federal do Espirito Santo, Fábio Malini, é contundente: “O que está em jogo é o poder midiático”. Para ele, “trata-se de duas ecologias em disputa”, personificadas “em figuras como Globo e Mídia Ninja. Ou seja, são elementos que se reduzem a duas formas que demonstram exatamente o conflito que estamos vivendo do ponto de vista de mídia”, pontua.
Na entrevista a seguir, concedida por telefone à IHU On-Line, Malini avalia a produção de conteúdo em rede, a exemplo da Mídia Ninja, que ganhou popularidade ao divulgar informações das manifestações em tempo real. “Essa é uma relação invisível, que gera uma potência da invisibilidade fantástica: a pessoa produz um vídeo de um protesto em Vitória, posta na rede via inbox, e envia para a Mídia Ninja publicá-lo, ou seja, conectar a invisibilidade com a visibilidade. A coordenação dessa rede é o elemento mais interessante da Mídia Ninja, mas ela está presente em muitas outras experiências”, menciona. E dispara: "Note que se não há 3G para todos, nada disso é possível acontecer".
Para Malini, as mídias que propõem produzir conteúdo independente enfrentam o drama do financiamento, que "se dá em torno de sua sustentabilidade, de como é possível viver dignamente com o trabalho, e veicular continuamente, o que exige dinheiro”. Segundo ele, propostas como a Mídia Ninja precisam recorrer ao financiamento para dar continuidade a esse trabalho, investindo no financiamento coletivo. “Quem se aventura a produzir mídia de maneira autônoma tende a recorrer ao primeiro caminho, ou seja, fazer com que o público financie o público, ou seja, o crowdfunding. MAs atenção porque isso faz com que essa experiência acabe se reduzido projetos - de reportagem, projeto de cobertura - alguma coisa que pode descambar para uma espécie de cultura de projetos pilotos, quando, na verdade, a ideia é de criar dinâmicas acopladas aos movimentos
sociais”, lamenta.
Fábio Malini é graduado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Espírito Santo, mestre em Ciência da Informação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, e doutor em Comunicação e Cultura pela mesma universidade. Atualmente é professor do Departamento de Comunicação da Universidade Federal do Espírito Santo, onde coordena o Laboratório de pesquisa sobre Internet e Cultura - Labic. Também leciona no Laboratório de Pesquisa em Comunicação Distribuída e Transformação Política – CIBERCULT, e é editor do site fabiomalini.com.
Confira a entrevista.
Foto de revistaforum.com.br |
IHU On-Line - Como avalia as chamadas “coberturas colaborativas” nas redes sociais? Trata-se de jornalismo?
Fábio Malini - Em geral há uma tendência a querer enquadrar essa forma de cobertura colaborativa como prática jornalística. Isso acontece por conta de dois processos: o primeiro busca legitimar essa cobertura como uma atividade de imprensa para dar reconhecimento ao trabalho de rua, e àqueles que criam narrativas sobre determinado acontecimento político. O segundo aspecto – corporativista - refere-se a uma tentativa de fazer com que essa prática se constitua como uma nova modalidade de jornalismo associado a uma matriz que vem a partir do cidadão que narra seus acontecimentos. Portanto, requerem o título de jornalismo na tentativa de fazer com que o jornalismo abarque qualquer tipo de narrativa, além de afirmar que se trata de um modo de jornalismo, ou seja, um jornalismo feito não por jornalistas, mas por cidadãos.
Vejo problemas nessas duas vias, uma grande ambiguidade, que se sustenta na concepção de que as pessoas produzem narrativas de rua reivindicando serem jornalistas. Isso não é verdade. As narrativas que têm acontecido nas ruas,fora do circuito da imprensa, são outra coisa e não necessariamente devem se resumir a uma atividade jornalística. Elas são, para além de tudo, narrativas monstruosas feitas de
testemunhos, análises, replicações, comentários, ou seja, estão muito distantes do elemento mais básico da atividade jornalística, que é a reportagem. Não vejo essas novas práticas de produção narrativa como novas práticas de produção de reportagem. A metáfora do Ninja é, no final das contas, a generalização da capacidade coletiva em contar - de modo multimedia - as histórias de rua e amplificá-las pela rede densa de perfis nas redes sociais.
Mídia tradicional x rede
A ecologia nativa da rede é de textos longos e curtos, de forte penetração da lógica do compartilhamento, da difusão. Então, essa cultura nativa da rede acaba entrando em conflito com a cultura secular do jornalismo na medida em que há, na rua, uma disputa, um confronto com a estrutura de poder existente. O tempo de narrar os acontecimentos também é diferente. Portanto, há uma disputa pelo tempo real, a qual já foi vencida pelas manifestações, pelos chamados midiativistas, responsáveis pela produção de conteúdo na rua, e sua reprodução na rede. Além disso, há uma disputa pelo pós-acontecimento, ou seja, a interpretação do fato. Esse, que era o objeto da reconversão dos jornais tradicionais - mais voltados para a análise -, acabou concorrendo com os analistas ou os novos colunistas, que em seus blogs e no Facebook dissecam o acontecimento.
Então, de um lado se tem uma estrutura de mídia tradicional, com incremento financeiro para poder gerar qualidade de imagem, remunerar bons profissionais, desenvolver novos produtos e, por outro, há um movimento formado por um coletivo de pessoas que dispõem de baixa tecnologia, produzem vídeos e os disponibilizam em canais como o Youtube. Trata-se de duas ecologias em disputa, porque estão de lados opostos. Essa disputa acaba se personificando em figuras como Globo e Mídia Ninja. Ou seja, são elementos que se reduzem a duas formas que demonstram exatamente o conflito que estamos vivendo do ponto de vista de mídia.
IHU On-Line - Que modalidades de poder e contrapoder passam a funcionar e se articular a partir do uso da internet e das redes sociais?
Fabio Malini – O que está em jogo é o poder midiático. A história da mídia no Brasil sempre foi de grande concentração e atrelamento aos governos. O nascimento da TV Globo está atrelado ao escândalo de, à época, a TV Globo receber capital privado, o que era algo bastante recusado do ponto de vista da Constituição. A TV Tupi e a indústria montada por Assis Chateaubriand, por exemplo, tinham extrema relação com os governos e recebiam financiamento deles. Mais recentemente, com a democratização, as chamadas concessões às emissoras de TV foram dadas pelo governo militar ou por resquícios do governo militar, no governo Sarney. Essa história de atrelamento da mídia brasileira a setores do poder gerou uma relação de perda da autonomia no processo de informação, basta ver as várias histórias de sonegação de informação por conta desse atrelamento.
É curioso observar que as estruturas de poder midiáticas, que deveriam ter o controle de fiscalização do poder, tornaram-se um elemento que compõe formas específicas de produção do poder com a ideia de que a comunicação deve ser produzida por poucos. A problemática do poder acontece por causa de um elemento endógeno à estrutura de mídia tradicional, a qual tem uma relação direta com grupos políticos que sempre a mantiveram. Mesmo os grupos de esquerda, a exemplo dos últimos anos, tiveram um caso de amor mal resolvido com a imprensa. Veja que o governo Lula foi marcado por fortes avanços sociais, mas o Ministério das Comunicações era conduzido por Hélio Costa, um ex-funcionário ligado à Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV. Então, esse caso de amor mal resolvido entre a esquerda e o poder acaba se tornando um elemento interessante, porque por um lado se critica e, por outro, se requer que as pautas desses governos estejam, de maneira menos conflituosa, dentro do espaço midiático. Os governos que tinham o objetivo de avançar não avançaram tanto assim no campo da comunicação. Então, há um elemento endógeno na própria estrutura e poder midiático, que é essa relação da mídia com o Estado.
Por outro lado, há uma relação de poder que é exógena, a exemplo da relação dessa estrutura de mídia com a internet, porque a rede mudou muito na última década. Abandonou-se um modelo de internet muito autoral, baseado no modelo do site, e migrou-se para um campo do modelo de perfil: você precisa seguir outros perfis, ter outros amigos para receber a informação a partir deles. Essa característica é capaz de gerar um nível de conversa e articulação que deriva diferentes movimentos: o movimento social de rua é um deles. Esse modelo se choca com a estrutura montada pelos poderes no campo midiático, baseado em poucos se comunicam para muitos se comunicam. Como muitos entram para a cadeia da comunicação, muitos olham o acontecimento de lugares diferentes.
Veja que essa lógica de muitos se comunicam também tem uma interpretação capitalística, porque há uma disputa que passa pelo telefone celular, e o volume financeiro que as empresas de telecomunicações movimentam tem muito a ver com a capacidade delas de fazer com que muitas pessoas se comuniquem. Isso revela ambiguamente uma disputa por capitais midiáticos e a relação de independência ou não que temos sobre os dispositivos, seja o celular ou os tabletes, os quais nos permitem comunicar e transmitir o que acontece na rua. Mas note que se não há 3G para todos, nada disso é possível acontecer.
IHU On-Line - Em termos jornalísticos e relações de poder com o Estado, o que distingue a Mídia Ninja de outros veículos?
Fábio Malini – Vamos pensar duas redes operando: a Globo e a Ninja, como duas metáforas. A rede Globo ainda é hierarquizada, onde o acontecimento passa por filtros, os quais, às vezes, reduzem o sentido da notícia, mas trata-se de um filtro da própria cadeia produtiva e da característica do jornalismo tradicional, ou seja, baseado na ideia de que um acontecimento precisa ser autenticado, checado, ter uma deontologia onde muitas possam falar. Por outro lado, se tem uma rede Ninja, que só surge porque já existe uma rede pronta, ou seja, relações que já foram estabelecidas anteriormente. A pessoa de Boa Vista está conectada com a pessoa do Rio de Janeiro, que está conectada com a pessoa de Recife, e que está conectada com a pessoa de Porto Alegre. Essa é uma relação invisível, que gera uma potência da invisibilidade fantástica: a pessoa produz um vídeo de um protesto em Vitória, posta na rede via inbox, e envia para a Mídia Ninja publicá-lo, ou seja, conectar a invisibilidade com a visibilidade. A coordenação dessa rede é o elemento mais interessante da Mídia Ninja, mas ela está presente em muitas outras experiências.
É importante lembrar que as duas mídias têm ritmos de tempo completamente diferentes. A mídia hierarquizada faz com que o acontecimento da rua só chegue muito tempo depois às pessoas, completamente filtrado a partir de um viés ideológico, que em geral critica as manifestações muito antes de criticar o governo. Na rede Ninja, o processo de produção acontece em tempo real, e a crítica e a análise são posteriores. Trata-se de uma recuperação do tempo “ao vivo”, mas de um “ao vivo” diferente, porque o tempo de produção é o mesmo tempo da reprodução. Portanto, os Ninjas dominam a narrativa do tempo real, por isso o ninja segue com o acontecimento, com as pessoas, com o ritmo do próprio movimento. Essa prática já vem acontecendo no Brasil há mais tempo, desde a cobertura do caso Pinheirinho, até no caso das manifestações dos indígenas, ou seja, desde que o streaming se tornou uma máquina de comoção pública. As manifestações do mês passado só visibilizaram o trabalho de pessoas que estão fazendo mídia de uma maneira autônoma, com pouquíssimos recursos, capazes de produzir informação de caráter público.
IHU On-Line - A Mídia Ninja se apresenta como produtora de jornalismo independente e pediu financiamento público para expandir seu trabalho. É possível fazer jornalismo independente com financiamento público?
Fábio Malini – Uma das grandes questões e dramas da Mídia Ninja se dá em torno de sua sustentabilidade, de como é possível viver dignamente com o trabalho, e veicular continuamente, o que exige dinheiro. Há três modos de fazer isso. O primeiro seria um financiamento coletivo em que seus próprios públicos financiam suas atividades; o financiamento privado – patrocínios; e, por fim, recursos públicos oriundos das estatais. Esse dilema é cheio de contradições. Quem se aventura a produzir mídia de maneira autônoma tenta recorrer ao primeiro caminho, ou seja, fazer com que o público financie o público, ou seja, a Mídia Ninja quer utilizar o crowdfunding [1]. Isso faz com que essa experiência acabe se reduzindo a um projeto de reportagem, a um projeto de cobertura, alguma coisa que pode descambar para uma espécie projetos pilotos, quando, na verdade, a ideia é de criar dinâmicas acopladas aos movimentos sociais.
IHU On-Line - Como vê essa proposta? O crowdfunding é uma alternativa possível de sustentar esse novo tipo de prática jornalística?
Fábio Malini – O financiamento coletivo tem uma relação direta com a interface que diz o que é um financiamento coletivo. As interfaces em geral exigem que um coletivo tenha um projeto, o qual será colocado num site, e as pessoas apostarão neste projeto. Um dos grandes dilemas é definir o que é um projeto que possa merecer um financiamento.
Eu acredito, sim, que o financiamento coletivo possa vir a sustentar uma rede. Não tenho nenhum tipo de dúvida em relação a isso, sobretudo, porque uma das características em relação ao sucesso do financiamento coletivo é o grau de rede que ele tem. No caso dos Ninjas, a rede é muito densa e muito propícia a um tipo de financiamento como esse. A questão é: será que a Mídia Ninja é capaz de cobrir uma partida de futebol? É propósito da Mídia Ninja cobrir uma partida de futebol? Essa é uma questão que parece simples e ingênua, ou mesmo irônica, mas é um elemento fundante, ou seja, até que ponto a produção independente vai estar na Copa do Mundo? Ou a produção da Mídia Ninja é exatamente, pelo que estou vendo, a cobertura daqueles que estão fora da Copa? Essa é uma questão pulsante: por um lado, estar dentro da Copa gera a possibilidade de fazer uma cobertura a partir de uma diferente perspectiva da que será feita pela Rede Globo. Mas, por outro, estando dentro há uma dificuldade e um certo distanciamento
da ideia inicial daqueles movimentos que discordam dos gastos públicos para
o Mundial de futebol. São elementos que têm muito a ver com o financiamento: quem financiaríamos, o cara que está dentro da Copa ou o cara que está fora?
O financiamento depende muito da dinâmica que será construída pelos atores que constituem uma iniciativa de mídia. A interpretação de mercado gira muito em função dessas escolhas. A grande potência dos Ninjas é mostrar que existem acontecimentos que podem ser financiados de maneira coletiva, mas que não estão regidos, nem regulados por essa estrutura de poder. Tem-se o caminho, mas a metodologia ninguém tem. Esse “fazer” pode produzir vários pecados, mas é a característica de quem está no mundo; o mundo tem suas contradições.
Se os Ninjas se afastarem de seu lastro político, que é de contestação desta estrutura hierarquizada e extremamente corrupta de poder, cujos gastos com publicidade são altos e feitos veiculados em mídias tradicionais sem filtros públicos, senão através empresa de publicidade que ganha a licitação e decide onde (em que veículo) irá aplicar o dinheiro, não farão um movimento importante. A questão passa pelas escolhas que eles irão tomar.
IHU On-Line - Em que consistiria uma discussão acerca de fazer jornalismo com qualidade? Nesse sentido, a mídia deve ser parcial ou imparcial? Que relevância tem a "imparcialidade" e a "parcialidade" na discussão entre a "velha mídia" e a "nova mídia"? O que os conceitos dizem de cada uma?
Fábio Malini – Essas marcações jornalísticas - objetividade, imparcialidade – acabam sendo muito redutoras. Para se ter uma ideia, temos um dado de 430 mil tuítes com a palavra #vemprarua. Deste total, mais de 100 mil imagens, das quais 95% delas não são feitas pela Mídia Ninja, mas mesmo assim são muito potentes e replicadas. Reduzir a discussão dessas narrativas à deontologia jornalística é requerer que o jornalismo seja praticado por todos conforme as regras do jornalismo. Ao contrário, o que essas narrativas mostram é que quanto mais subjetivo o sujeito no acontecimento, mais objetivo ele é. É só sendo muito subjetivo que você revela sua objetividade, o seu “lado”, por exemplo.
A questão não é somente ser objetivo e imparcial, ou subjetivo e parcial. As informações passam pela crítica, pela capacidade de a pessoa ser crítica, e aí a discussão se torna outra. Se não existe o elemento da crítica compondo a forma de narrar, acaba virando uma narração do poder. É como a Mídia Ninja entrevistando o Eduardo Paes. Se você não é crítico o suficiente para exigir uma coletiva e não uma exclusiva, acaba dando um
tiro no pé. Por outro lado, se você não é crítico o suficiente para escapar da reprodução do discurso do vandalismo ou dos arruaceiros que o poder quis colar na sociedade, o midiativista acaba se tornando um ente que não diz a verdade do ponto de vista distinto de várias fontes. Estes elementos compõem estes todos esses conflitos que estão sendo engendrados por todos nós.
IHU On-Line - Qual a importância da horizontalização dos meios de comunicação no sentido de garantir a informação ao cidadão como um direito e não como mercadoria?
Fábio Malini – A questão da horizontalidade só se vê na rede, pois é um dispositivo baseado em um jogo de parceria. Não existe público, só existem amigos, seguidores e parceiros. Essa dinâmica horizontal também tem elementos atravessadores, que querem muitos em seus poucos canais. Buscar a horizontalidade é algo transcendental.
A estrutura de mídia é baseada na concorrência, na estrutura capitalista. Penso que existe uma cultura livre na rede que é objeto de discussão, conflitos e captura. O melhor modo de constituir a horizontalidade na rede é fazer com que qualquer obra derivada de criação livre, seja livre. Esse é o elemento que constitui a dinâmica que alimenta a lógica horizontal. Qualquer empecilho de liberdade de uma informação a torna uma mercadoria. Talvez a coisa mais horizontal que a estrutura de mídia tradicional conseguiu fazer, foi construir seus canais de jornalismo cidadão, que no final das contas se revelaram como uma forma de dar vazão aos conteúdos que lhe interessam. Por exemplo, se há o desejo de bater na questão da dengue, convocam-se os usuários a produzirem algum material relativo ao tema para fazer com que esse material se revele como um decalque, uma cópia fajuta da estrutura editorial contada pelo outro lado.
Há essas duas modalidades: a horizontalidade marcada por canais de jornalismo participativo e com pouca capacidade de produção, e uma dimensão horizontal em que o grande conflito está na capacidade de a internet e as redes de produção de conteúdo se tornarem redes de informação de bem comum, em que as imagens, textos e vídeos não sejam monetizados pelo Google, mas que sejam livres para todos aqueles que querem criar, produzir e distribuir determinado conteúdo.
IHU On-Line - Em que consiste sua pesquisa intitulada “Cartografar as controvérsias na internet: uma cooperação científica entre pesquisadores que analisam as relações entre estéticas, poder e internet”?
Fábio Malini – Essa pesquisa já ocorre há um ano, e tem como objetivo fazer um processo de acompanhamento das interações na internet, entre os perfis de redes sociais e blogs. A proposta era traçar a dinâmica global de movimentos que aconteciam em países do Norte da África, na Espanha e nos EUA, pois não tínhamos clareza de que haveria momentos similares no Brasil.
O objetivo da pesquisa é mostrar que existem pontos de vistas políticos distintos sobre determinados acontecimentos, que são baseados em posicionamentos marcados nos compartilhamentos e menções que as pessoas fazem, desenvolvem e cumprem na rede. Além disso, compreender o universo semântico daquilo que é produzido na rede, ou seja, que tipo de conteúdo circula. Essa cartografia está chegando na metade, pois o trabalho será concluído em maio de 2014.
Temos mostrar essas posições, os impactos dos protestos na internet e como ela se tornou um espaço de amplificação desses movimentos e de novas agendas, ou seja, furou as armadilhas montadas pelas narrativas dos poderes, construindo outras narrativas de maneira colaborativa. Estamos, também, construindo um método científico que não seja apenas baseado na entrevista, na enquete, em formas de verificação baseadas no testemunho, mas a partir do que as próprias pessoas produzem na internet, ou seja, uma historiografia que seria impossível de ser feita. O que estamos tentando fazer é um novo método historiográfico que leve a estas informações políticas, além das indignações que as pessoas manifestam nas ruas e suas dinâmicas na internet.
NOTA:
[1] Crowdfunding: O termo inglês crowdfunding foi criado pelo empresário americano Michael Sullivan, entusiasta de projetos desse tipo, em 2006, mas o uso de financiamento coletivo tem um antigo precedente para arrecadação de fundos para filantropia. O financiamento coletivo (crowdfunding) consiste na obtenção de capital para iniciativas de interesse coletivo através da agregação de múltiplas fontes de financiamento, em geral pessoas físicas interessadas na iniciativa. O termo é muitas vezes usado para descrever especificamente ações na Internet com o objetivo de arrecadar dinheiro para artistas, jornalismo cidadão, pequenos negócios e start-ups, campanhas políticas, iniciativas de software livre, filantropia e ajuda a regiões atingidas por desastres, entre outros.
(Por Patricia Fachin e Ricardo Machado)
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Mídia Ninja. "A disputa pelo poder midiático''. Entrevista especial com Fábio Malini - Instituto Humanitas Unisinos - IHU