14 Novembro 2024
Se avistar uma plantinha “Não-me-toque” não a perturbe. Seja cauteloso. Converse com ela antes de receber a autorização para tocá-la e dizer-lhe palavras bonitas. Tenha paciência com ela. Não a machuque. Ela também é um ser vivo que precisa de cuidados.
O comentário é de Rosângela Trajano, professora, ativista ambiental, escritora e poeta, em artigo publicado por EcoDebate, 11-11-2024.
Pessoas tímidas iguais a mim tremem de medo quando alguém se aproxima delas. Gaguejam no falar em público e ficam coradas ao receber um elogio de estranhos, assim também acontece com as plantas. Muitas delas até demonstram as suas timidezes se fechando todas quando são tocadas e a ciência pode até querer explicar com a razão e o método científico isso que acontece com elas, mas eu fico com a explicação poética e divina que as musas me deram e que aqui me trazem hoje.
Sim, eu não sei se vocês já perceberam ou até mesmo se já aconteceu com vocês de tocar numa plantinha e ela se encolher toda. Parece uma menina em apuros. Na verdade, ela está tão tímida e assustada diante de você que não sabe como se comportar, é preciso dizer à plantinha que não tenha medo e de que você não vai machucá-la porque a todo toque seu mais assustada ela vai ficar, correndo o risco até mesmo de morrer.
Há plantas que demonstram isso claramente, mas eu quero dizer para você que a maioria delas, mais de 90% das plantas são tímidas. Poucas são as que gostam de ser ousadas e amostradas com as suas folhas a se balançarem junto com os galhos. As plantas gostam mesmo é de ficar quietinhas nos seus jardins e detestam vasos apertados.
Se você for uma das pessoas que gosta de criar plantinhas dentro de casa cuide delas com carinho. Primeiro, respeite a sua individualidade e subjetividade não a tocando sem ter permissão para isso. Sim, as plantas podem nos permitir que as toquemos porque elas também têm sensações e emoções.
As plantas são capazes de adoecerem se tiverem a sua privacidade invadida, pois cada uma delas tem seus segredos e jeito de ser que não gostariam de mostrar para qualquer um, por isso se receber uma visita em sua casa não saia mostrando as suas plantas sem antes pedir-lhes licença. Respeite-as e se respeite também já que as plantas são cuidadas por você e a visita pode achar que elas estão feias e amedrontadas por falta de cuidados quando tudo isso não passa de timidez acima do normal.
A timidez não é uma doença. Faz parte do jeito de ser de cada pessoa ou, no nosso caso, plantinha. Se fechar para o mundo ao primeiro toque de alguém não quer dizer que você não queira ser amada ou receber elogios, claro que não! Quer dizer que você se preocupa consigo, com o que o outro pensa de você e com as suas intenções.
Muitas plantinhas vivem nos canteiros das ruas das grandes cidades em total abandono, parecidas com as pessoas em situação de rua, sequer têm o que comer ou onde dormir. Não são protegidas do sol ou da chuva. Vivem ao Deus dará. Seus espinhos as machucam e vai ou vem alguém as pisam com força. Essas plantas são as que mais precisam de cuidados e são as mais tímidas e assustadas porque seus traumas são tantos que não se corrigem com uma simples limpeza de homens não treinados para lidar com plantinhas assustadas. É preciso cuidar, saber respeitar, experimentar o carinho no momento exato e a permissão de ser tocada. Você não gostaria de ser tocado sem permitir.
Estou querendo falar, na verdade, da plantinha conhecida popularmente como dormideira, dorme-dorme, sensitiva, maria-fecha-a-porta, não-me-toques ou dorme-joão, você já deve ter cruzado com uma plantinha que se fecha ao encostar nela. Estou falando da Mimosa pudica L., uma espécie subarbustiva, nativa da América do Sul. Pertencente à família Fabaceae, subfamília Caesalpinioideae, a mesma do pau-brasil.
Desde sua descoberta chamou a atenção pela sua habilidade em mover rapidamente as folhas ao ser tocada, fechando os folíolos e baixando a folha. Por essa razão, foi nomeada por Linné com o epíteto específico de pudica. Que quer dizer, mesmo em português, “tímida”, “envergonhada”. E essa timidez pede respeito de você cidadão que passa pelas ruas e vê uma “Não-me-toques” quietinha no seu canto. Tudo o que ela quer é viver sossegada sem intrusos a mexerem com ela, a lhe perturbarem a paz, a roubarem o seu silêncio da alma, sim, porque planta também tem alma e sente o mesmo que sentimos.
Eu me lembro bem de quando era mais jovem que chegava num baile e ficava no canto da parede meio tímida e desconfiada olhando as pessoas dançarem enquanto eu não dava um passo. Achava que não sabia dançar ou que ia fazer feio e todos ririam do meu jeito engraçado no meio do salão. Assim acontece com as plantinhas não somente a “Não-me-toque”, mas todas elas temem fazer feio diante do público. Elas querem se apresentar bonitas e cheirosas para que sejam sempre visitadas e amadas por você.
Se avistar uma plantinha “Não-me-toque” não a perturbe. Seja cauteloso. Converse com ela antes de receber a autorização para tocá-la e dizer-lhe palavras bonitas. Tenha paciência com ela. Não a machuque. Ela também é um ser vivo que precisa de cuidados. Em toda a minha vida eu vivi perto das plantas dentro e fora de casa e conheci muitas delas que eram tão tímidas ao ponto de quando eram tocadas por um estranho suas folhinhas caírem ou murcharem completamente.
Você já ouviu falar em mau-olhado? Pois bem, a minha bisavó curava as pessoas com três raminhos de plantas tiradas do nosso jardim e elas logo murchavam quando as pessoas estavam com algum problema sério emocional ou físico. As plantas sentem as nossas energias negativas, transmitimos para o meio ambiente aquilo que somos e sentimos, por isso devemos ter cuidado ao tocar as plantinhas ou ao abraçarmos uma árvore mesmo frondosa e exuberante ela pode vir a morrer se não estivermos bem emocionalmente.
Eu amo plantas e sempre as peço licença para iniciar uma conversa com elas. Sim, também são boas ouvintes e conselheiras. Mesmo sem as entendermos muitas vezes porque não sabemos decifrar o que querem nos dizer as suas folhas quando nos escutam por sermos dotados de muita razão e pouca emoção ainda assim eu consigo receber do ambiente a energia que a plantinha transmite quando lhe conto algo triste ou alegre.
Respeite a privacidade das plantas e das árvores, peço mais uma vez. Só as abrace e as toque se tiver permissão para isso.
Em muitos parques ambientais existem placas proibindo o toque nas plantas e árvores, eu gosto disso, porque há pessoas tão ignorantes que adoram tocar nelas sem serem autorizadas. Às vezes a plantinha ou árvore está sendo curada de uma doença séria e precisa de repouso e silêncio.
Para terminar este pequeno ensaio deixo você com o poema do meu poeta maior português Fernando Pessoa no heterônimo de Alberto Caeiro que nos diz “Dizes-me: tu és mais alguma coisa / Que uma pedra ou uma planta. / Dizes-me: sentes, pensas e sabes / Que pensas e sentes. / Então as pedras escrevem versos? / Então as plantas têm ideias sobre o mundo? / Sim: há diferença. / Mas não é a diferença que encontras; / Porque o ter consciência não me obriga a ter teorias sobre as coisas: / Só me obriga a ser consciente. / Se sou mais que uma pedra ou uma planta? Não sei. / Sou diferente. Não sei o que é mais ou menos.”
Eu também não sei o que é mais ou menos, só sei que existo e amo plantas e árvores, e por isso respeito a sua timidez e sei bem o que é se envergonhar diante da multidão de fotógrafos querendo o melhor clique do nosso vestido novo.
As plantas trocam de vestes todas as noites no processo de fotossíntese. Outro tema para um novo ensaio este dos paparazzi das plantas e seus vestidos longos de festas. Até mais!
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As plantas também são tímidas. Artigo de Rosângela Trajano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU