Sangue, símbolo de vida ou de morte? Artigo de Philippe Liesse

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09 Janeiro 2024

"Na sua carta aberta sobre a situação em GazaJohan Bonny repete que a única solução é a existência de dois Estados. Solução destacada por alguns, em diversas ocasiões, mas estrategicamente boicotada, para que o terrível dia de 7 de outubro de 2023, aquele do inaceitável ataque, sirva de álibi para a operação 'Vingança'", escreve Philippe Liesse, professor e diácono belga, em artigo publicado por Garrigues et sentiers, 08-01-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis o artigo.

As guerras continuam a ferir a nossa humanidade em quase todo o mundo. O sangue se torna um símbolo de morte, ao mesmo tempo que é um símbolo de vida! O Médio Oriente arde novamente em chamas. É terrível. O que dizer, sem cair na geopolítica barata? Cada lado tem esperança de paz. Mas que paz? Um tesouro a salvaguardar à custa de uma solidariedade que deve sempre prevalecer sobre o “cada um por si”!

É sem dúvida nessa perspectiva que Johan Bonny, bispo de Antuérpia, se expressou nas mídias flamengas em 9 de novembro de 2023. Vivendo numa cidade flamenga que tem a maior comunidade judaica do país, ele se dirige aos seus amigos judeus sobre a situação em Gaza: Israel tem o direito de existir e de se defender, ninguém questiona isso. Mas os palestinos também têm o direito de existir e de se defenderem.

Johan Bonny quer quebrar um silêncio culpado. A reação do Ocidente peca por confusão e contradição. Enquanto o porta-voz da Unicef ​​declara que Gaza é um cemitério para as crianças, e um inferno para todos, as grandes potências militares apoiam o Tsahal, o exército israelense, em nome de um dever de assistência a Israel, Estado democrático!

Na sua carta aberta sobre a situação em Gaza, Johan Bonny repete que a única solução é a existência de dois Estados. Solução destacada por alguns, em diversas ocasiões, mas estrategicamente boicotada, para que o terrível dia de 7 de outubro de 2023, aquele do inaceitável ataque, sirva de álibi para a operação “Vingança”. Milhares de inocentes morreram em Gaza e o Tsahal continua o seu trabalho de destruição sistemática em nome do desejo de aniquilação do Hamas. Johan Bonny se diz “exasperado” quando constata que determinados políticos e militares israelenses usam e abusam de termos bíblicos para legitimar as suas ações de morte. Ele se expressa como cristão e não hesita em escrever que nenhuma palavra de Deus no Antigo Testamento pode legitimar uma recuperação violenta ou uma expansão militar do chamado “país bíblico”.

É interessante deter-nos um pouco nos termos “chamado país bíblico”. Na realidade, trata-se do termo “Terra Prometida”!

Mas essa expressão, enraizada nas mais profundas tradições religiosas, torna-se uma arma de destruição quando reduzida à sua dimensão geográfica. A “Terra” que Deus promete é uma “nova humanidade”. Afinal, quando os profetas falam da terra, querem dizer “os seres humanos”. E o ser humano sempre ocupará o lugar central em detrimento da terra. Por exemplo, o salmo canta que “O céu é o céu do Senhor; mas a terra, deu-a aos filhos de Adão”. Além disso, a terra é símbolo de fidelidade à aliança. E a fidelidade não é “geográfica”, porque é um caminho de “comunhão”.

Os profetas são muito claros a respeito desse curto-circuito geográfico: “Ai dos que ajuntam casa a casa, reúnem campo a campo, até que não haja mais lugar, e fiquem como únicos moradores no meio da terra!” (Is 5,8).

E quando o profeta fala do futuro, coloca na boca de Yahweh essa promessa que vai além qualquer dimensão geográfica: “Eis que crio novos céus e nova terra” (Is 65,17)... “o lobo e o cordeiro se apascentarão juntos” (Is 65, 25).

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