14 Agosto 2023
O teólogo dominicano holandês Edward Schillebeeckx, nascido em 1914, morreu em 2009. Às vésperas de completar 90 anos, ele foi entrevistado por Francesco Strazzari, padre vicentino, editor do Il Regno por muitos anos e agora editor do Week News. O resultado é um livro-entrevista ágil e interessante.
A reportagem é de Bruno Scapin, publicada por Settimana News, 11-08-2023.
Durante a longa conversa, o entrevistador pergunta: "Mas você, padre Schillebeeckx, em que Deus você acredita?" O teólogo responde: "Continuo a acreditar neste Deus vivo…, um Mistério vivo, que tudo transcende, um Mistério que caminha na nossa história e conosco por caminhos desconhecidos e incompreensíveis".
Mas essa não é a única resposta. Seu pensamento sobre Deus ressurge várias vezes no texto: é Ele "que nos transcende, é um Deus humano, um Deus que ama os homens, que se preocupa com sua história". Deus tem um "rosto transcendente e humano, gratuito e surpreendente". "Deus não é um Deus capaz de construir e destruir homens; não é um Deus dos mortos, mas dos vivos... é o Vivente absoluto, é um simples dom incondicional".
A investigação do problema de Deus envolveu muito nosso teólogo. Tomemos mais duas citações do texto: "Continuo fiel ao Deus humanissimus, a um Deus que é tudo para os homens, o Deus dos homens. (...) Precisamos de um Deus que seja pura gratuidade, graça imerecida e generosamente doada. Livre! Pode-se adorar, venerar e celebrar somente um 'Deus da vida', somente um Deus vivo".
Pode-se ver nestas declarações que o padre Schillebeeckx não é apenas um investigador do Mistério, mas também e acima de tudo um crente apaixonado.
Foi teólogo do Concílio, mas a Congregação para a Doutrina da Fé ficou de olho em suas pesquisas inovadoras e o submeteu a três processos, dos quais, é preciso frisar, saiu sem sofrer condenações.
Como ele viveu essa situação? Ouçamos de um dos mestres gerais da ordem dominicana: “Ele me disse, não sei quantas vezes já, que lhe ocorreu a ideia de deixar a Igreja e a ordem dominicana”. E o que ele disse sobre isso? "Não pense que, devido às minhas vicissitudes com a hierarquia, guardo rancor…, minhas reflexões nascem de um amor sincero pela Católica (como ele gostava de definir a Igreja)".
Capa do livro que reúne as conversas entre Francesco Strazzari e Edward Schillebeeckx. (Foto: Divulgação)
De onde vieram as suspeitas sobre sua teologia? Schillebeeckx regozijou-se com o fato de a teologia ter recuperado a humanidade de Jesus. A aposta era - escreve Queiruga no Prefácio - aprender a descobrir na "real, inteira e verdadeira humanidade de Jesus", o sentido da sua divindade, ou seja, "afirmar a plena humanidade em Jesus como fundamento da confissão de sua divindade". Uma tentativa de definir a identidade de Jesus, sabendo muito bem que estamos a entrar no mistério, tanto que o próprio Schillebeeckx confessa: "Recuo aborrecido com a pretensão de delimitar até ao osso, por assim dizer, o segredo de uma pessoa, sobretudo da pessoa de Jesus".
Partindo das muitas cristologias presentes no Novo Testamento, todas as "autênticas confissões de fé", chegamos a importantes conclusões: "Sem o Jesus histórico nunca teria havido um Cristo e sem Cristo não teria havido Jesus". "Jesus está no coração do cristianismo." “Em Cristo há o encontro do céu com a terra, da transcendência com a nossa humanidade”.
Além destes temas explicitamente abordados no livro, outros são apenas sugeridos, como a função da Igreja hoje: "Pedimos à Igreja um rosto humano e credível. (...) A comunidade de Deus, a comunidade cristã, foi definida como sacramentum mundi, ou seja, uma comunidade religiosa que se coloca a serviço dos homens".
E como as religiões devem ser consideradas? "A centralidade de Jesus de Nazaré exige uma atenção amorosa para com todas as outras religiões, pois Deus é o Deus vivo de todos os homens".
Grande parte da segunda parte do livro-entrevista se concentra no tema da mística, sua presença e importância na história da Igreja, suas manifestações, sua relação com a teologia. “A mística faz parte da vida normal de fé do cristão, ainda que seja uma forma intensa de vivência da fé em Deus”.
Por fim, cito uma confissão pessoal contida no texto. Como teólogo e crente, declara: "Na minha idade, depois de uma longa e laboriosa pesquisa, gostaria de dizer com tranquilidade que a bondade de Deus tem a última palavra em nossas vidas".
Os dois prefácios são brilhantes: o do teólogo Queiruga a esta edição e o do Pe. Timothy Radcliffe à edição anterior (2005). Preciosa é a introdução de Francesco Strazzari intitulada "O canto de Deus em um homem apaixonado pela teologia", na qual, resumidamente, apresenta algumas etapas da vida e algumas passagens do pensamento do "teólogo de Nijmegen".
O livro mantém o frescor do diálogo. Sua leitura enriquece a mente e o coração.
SCHILLEBEECKX, Edward; STRAZZARI, Francesco. Cerco il tuo volto: conversazioni su Dio. Bolonha: EDB, 2023.
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Schillebeeckx. Confissões de um teólogo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU