Pedro, Paulo e Francisco: a gruta, a baixa estatura e a liberdade!

Três histórias que se entrelaçam na fé!

(Foto: Reprodução | Basílica Santuário do Senhor do Bonfim)

01 Julho 2023

"Em nossos dias, urge a união da Igreja em torno da pessoa do Papa Francisco, em sintonia com as igrejas locais, as comunidades, os padres, os leigos e os bispos a partir dos ensinamentos que a tradição da fé nos legou, de modo que possamos construir um mundo e um ser humano novos. Com Pedro, Paulo e Francisco, somos chamados a testemunhar o reino e a continuar a sua construção, lutando por um mundo de paz e de bem alicerçado ‘sobre e sob a rocha’ da vida moderna", escreve frei Jacir de Freitas Faria, em artigo enviado ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

Jacir é doutor em Teologia Bíblica pela FAJE (BH). Mestre em Ciências Bíblicas (Exegese) pelo Pontifício Instituto Bíblico, de Roma. Professor de Exegese Bíblica. É membro da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica (ABIB). Sacerdote Franciscano, autor de dez livros e coautor de quinze. YouTube: Frei Jacir Bíblia e Apócrifos.

Eis o artigo.

Pedro, Paulo e Francisco, o Papa. Três homens e três histórias que se entrelaçam na fé. Pedro é “pedra ou gruta, a casa dos pobres de seu tempo”. Paulo é “aquele de baixa estatura” ou “aquele implora” (Saulo). Francisco é o “francês (homem) livre” ou “homem forte” (Mário). Dois judeus e um argentino. São três personagens de fundamental importância para os quase um bilhão e meio de católicos, assim como para os 31,4% de cristãos do mundo.

Falar de três pessoas nos remete à importância do número três na revelação bíblica. A fé judaica se baseia no amar a Deus em três modos: coração, alma e posses (Dt 6,4-9). A fé cristã, filha do judaísmo, na Trindade do Pai, Filho e Espírito Santo.

At 12,1-11 diz que Pedro estava preso, pela terceira vez, por ordem de Herodes Agripa I. Pedro que havia negado Jesus três vezes (Mt 26,69-75), outras três, sido interrogado por Ele se o amava (Jo 21, 14-17); aqui, é três vezes preso por anunciar Jesus ressuscitado. Em Mt 16, 13-20. Jesus pergunta aos discípulos sobre o que o povo pensava sobre ele. A resposta consiste em três nomes: João Batista, Elias e Jeremias. São três profetas de sua importância para a fé judaico-cristã.

Seguindo a máxima do três, permita-me dizer três palavras sobre Paulo, Pedro e Francisco. Paulo lutou fervorosamente contra o cristianismo e a favor dele. De perseguidor, tornou-se o maior missionário no anúncio de Jesus ressuscitado. “Em vão seria a nossa fé se Cristo não tivesse ressuscitado” (1Cor 15,17), pregava com ardor, mesmo não tendo conhecido Jesus de Nazaré, o que o levou à morte, por volta do ano 67 E.C., por decapitação, em Roma. Quando a morte era inevitável, Paulo exclamou: “Combati o bom combate, terminei a minha corrida, conservei a fé” (2Tm 4,7). A imagem de Paulo esportista é fenomenal. Paulo, o pequeno, foi um lutador na fé. A coroa de sua vitória olímpica é outra, a da justiça e da imortalidade. Paulo tornou-se um atleta imortal do ressuscitado, jamais esquecido pelos guerreiros cristãos de ontem e de hoje.

Sobre Pedro, vale recordar o episódio no qual ele professa a fé em Jesus como Messias. Jesus, então lhe diz: “Tu és Kepha (cefas), e sobre ela edificarei a minha igreja.” Kepha é pedra e gruta escavada na rocha. Naquele tempo, o povo tinha o costume de escavar as rochas para daí tirarem pedras para construir casas. Os buracos formados nas rochas recebiam, na língua familiar, o aramaico, o nome de Kepha. Aos pobres restava o infortúnio de morar nessas cavernas ou grutas. Kepha traduz também o substantivo grego Pétros (Pedro).

Considerando o que foi dito acima, há espaço para duas afirmações hermenêuticas plausíveis: a) Pedro representa a rocha, a pedra da nova comunidade de fé, que sabe quem é Jesus e quer anunciá-lo e vivenciá-lo, tendo Pedro como seu líder; b) Pedro é a igreja dos pobres que vivem nas grutas de ontem e nas favelas e barracos de hoje, lugar onde a Igreja deveria estar, mas, infelizmente está cada vez mais se distanciando. As igrejas evangélicas proliferam porque os católicos não foram capazes de dar respostas aos problemas da pós-modernidade. Não que elas também saibam, mas, pelo menos, estão mais próximas dos empobrecidos, na vivência de seus problemas econômicos e existenciais, mesmo que tirando proveito da situação. Pedro tem as chaves que abrem portas e ligam todos com o Eterno, o divino. Mais tarde, as comunidades entenderam que a liderança de Pedro foi repassada para aqueles que o sucederam, os quais receberam o nome de bispo. Destaque para o de Roma, que se tornou também papa, chefe da Igreja católica (universal), apostólica e romana.

O Pedro atual se chama Francisco, em homenagem do pobrezinho de Assis, São Francisco. O Papa Francisco é homem de profunda intuição pastoral e próximo dos empobrecidos. Um home livre na fé, sem amarras do catolicismo tradicional. Escolheu, como ele declarou, posteriormente, que o nome Francisco é para recordar que o seu ministério é em favor dos empobrecidos, da paz e da ecologia. Que não entende isso o chama de “comunista” sem entender nem mesmo o peso desse adjetivo. O Papa Francisco tem lutado com fervor evangélico, na simplicidade e espontaneidade que lhe são peculiares, para direcionar a Igreja para as grutas escavadas das rochas modernas. Não tem sido fácil. Não são poucas as resistências encontradas entre os que querem uma Igreja forte e poderosa sobre a rochas do poder, uma volta ao passado.

Em nossos dias, urge a união da Igreja em torno da pessoa do Papa Francisco, em sintonia com as igrejas locais, as comunidades, os padres, os leigos e os bispos a partir dos ensinamentos que a tradição da fé nos legou, de modo que possamos construir um mundo e um ser humano novos. Com Pedro, Paulo e Francisco, somos chamados a testemunhar o reino e a continuar a sua construção, lutando por um mundo de paz e de bem alicerçado ‘sobre e sob a rocha’ da vida moderna.

Notas

[1] FARIA, Jacir de Freitas, O outro Pedro e a outra Madalena segundo os apócrifos 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2010, p. 28-31.

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