A promessa da vida eterna. Artigo de Enzo Bianchi

Altar na igreja de Santa Lúcia, em Segusino, Itália depois da destruição da Primeira Guerra Mundial, . Foto: Austrian National Library

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16 Novembro 2022

A Igreja está empenhada em se consolidar como instituição e em sobreviver entre as potências do mundo. Para falar de vida eterna, em vez disso, é preciso dar um primado, uma centralidade, a Jesus Cristo, o Senhor.

A reflexão é do monge italiano Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado em La Repubblica, 14-11-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Nos últimos dias, Antonio Polito, jornalista que afirma não ter fé, ao participar do funeral de Francesco Valdiserri, de 18 anos de idade, com espanto, ouviu na pregação o anúncio da ressurreição dos mortos de Jesus e, portanto, também do jovem morto.

Ele diz que sentiu a força da mensagem cristã quase sempre esquecida, omitida e coberta de palavras consolatórias de bom senso, e se pergunta por que a Igreja não consegue mais anunciar e fazer o que conseguia fazer junto a pequenas comunidades de discípulos de Jesus em uma maré pagã.

Na verdade, a resposta é simples: a Igreja está empenhada em se consolidar como instituição e em sobreviver entre as potências do mundo. Para falar de vida eterna, em vez disso, é preciso dar um primado, uma centralidade, a Jesus Cristo, o Senhor.

Mas, se não se consegue realizar uma conversão desse tipo na instituição, isso significa relegar o cristianismo entre as religiões, uma religião como quaisquer outras. Especialmente em um período em que a Igreja é devastada por escândalos de todos os tipos, ela é levada a concentrar a atenção em si mesma. A Igreja não consegue sustentar aquela verdade que está simplesmente nua e suspensa em uma cruz.

É verdade que hoje em algumas terras ela é perseguida; em outras, marginalizada; mas não tem motivos para se lamentar, porque, nos últimos séculos, buscou como se fosse um direito o reconhecimento em detrimento dos outros. Não sei até que ponto os católicos se dão conta de que, durante décadas, voltaram sua atenção sobretudo para a Igreja.

Muito, senão tudo, está ordenado em torno da Igreja, sujeito e objeto de toda atenção, preocupação e solicitude. A pergunta que Paulo VI fez durante o último Concílio: “Igreja, o que dizes de ti mesma?”, não parece ter recebido respostas, não digo exaustivas, mas nem mesmo confiáveis, respostas que permitam ler a Igreja na linha do Evangelho.

A Igreja e suas estruturas, a Igreja e seus ministros, a Igreja e sua missão... sempre a Igreja e somente a Igreja é colocada obsessivamente no centro de todo discurso eclesial. Hoje também, quando a Igreja se mostra poenitens, em penitência, privada de glória e de aplausos mundanos, até mesmo humilhada, os cristãos significativamente não se sentem solidários com os pecadores e não ousam desviar de si o olhar narcísico para dirigi-lo a seu Senhor.

Esta hora de humilhação – e também de injustiça sofrida, que vê o Papa Emérito Bento XVI sendo arrastado a um julgamento e muitos outros tratados como verdadeiros bodes expiatórios – levará a vislumbrar um caminho de mudança para a Igreja, uma Igreja que quer refazer a maquiagem para resplandecer no mundo? Saberá recordá-la das palavras essenciais do anúncio da fé cristã não afogadas pela religião? Será que a levará a não se sentir como o Reino de Deus, mas a anunciar o Reino que vem? A Igreja saberá anunciar com esperança que há uma promessa de ressurreição, de vida eterna?

Porque, sem a esperança na ressurreição, o cristianismo é uma religião misérrima.

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