21 Fevereiro 2022
Um padre abusador entre os participantes do congresso sobre o sacerdócio no Vaticano. Causa repercussão a presença do Mons. Tony Anatrella, um presbítero da Arquidiocese de Paris punido canonicamente por abusos sexuais, no simpósio internacional “Por uma teologia fundamental do sacerdócio”, promovido pelo cardeal Marc Ouellet, prefeito da Congregação para os Bispos e pelo Centro de Pesquisa e de Antropologia das Vocações. O evento, que ocorre na Sala Paulo VI, no Vaticano, foi aberto por um longo discurso do Papa Francisco.
A reportagem é de Francesco Antonio Grana, publicada em Il Fatto Quotidiano, 18-02-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O Mons. Anatrella, como explicam no Vaticano, não foi convidado ao simpósio nem pela Congregação para os Bispos nem pelos organizadores do evento, mas simplesmente se inscreveu como participante do congresso. Uma presença como a dele, porém, tinha que ser pelo menos avaliada e aprovada, e não trivialmente ratificada, dado o seu passado.
O Mons. Anatrella, hoje com 81 anos, psicanalista francês, assediava sexualmente os seus jovens pacientes gays que lhe pediam ajuda para lidar com a sua homossexualidade. O padre explicava às suas vítimas que essa era a forma correta para “curá-los”, incutindo neles também a convicção de que a homossexualidade é uma doença.
Ambos os ex-arcebispos de Paris, o cardeal André Vingt-Trois e Dom Michel Aupetit, abriram uma investigação canônica, decidindo suspender o sacerdote abusador da atividade pastoral. Medidas tomadas após décadas de acusações que, no início, não haviam sido levadas a sério, permitindo assim que o padre continuasse abusando das suas vítimas de forma imperturbável.
Anatrella também é conhecido pelas suas campanhas contra os direitos das pessoas homossexuais. O sacerdote chegou até a defender que os homens gays criam filhos violentos e a descrever a homossexualidade como uma “confusão de sexo e sentimentos” que “leva a uma confusão das realidades, a um impasse”. Tudo isso enquanto continuava lecionando tranquilamente na Faculdade de Filosofia e de Psicologia de Paris e no Collège des Bernardins.
Por muito tempo, ele foi consultor do Pontifício Conselho para a Família e do Pontifício Conselho para a Saúde, ambos dicastérios abolidos por Bergoglio, e também foi membro da Comissão Internacional de Inquérito sobre Medjugorje, presidida pelo cardeal Camillo Ruini. Ele também foi professor visitante no Instituto João Paulo II de Roma e publicou muitas obras traduzidas para diversas línguas, incluindo “La teoria del ‘gender’ e l’origine dell’omosessualità” [A teoria de gênero e a origem da homossexualidade].
Em 2001, o então presidente do Pontifício Conselho para a Família, o cardeal Alfonso Lopez Trujillo, havia escolhido justamente Anatrella para compilar alguns dos verbetes mais delicados, inclusive precisamente os relativos à homossexualidade, do “Lexicon” dos “termos ambíguos e discutidos sobre família, vida e questões éticas”.
A presença pelo menos inoportuna, para usar um eufemismo, do Mons. Anatrella no simpósio sobre o sacerdócio organizado no Vaticano também emerge das palavras com as quais o cardeal Ouellet introduziu o evento na presença do papa.
“O que se pode esperar – afirmou o purpurado – de uma ‘teologia fundamental do sacerdócio’ no atual contexto histórico, dominado pelo drama dos abusos sexuais perpetrados por clérigos? Não se deveria, antes, se abster de falar do sacerdócio, quando pecados e crimes de ministros indignos estão nas primeiras páginas da imprensa internacional, por terem traído o seu compromisso ou por terem vergonhosamente encoberto os culpados de tais depravações? Não se deveria, antes, se calar, arrepender-se e buscar as causas de tais delitos? Estamos todos dilacerados e humilhados por essas perguntas cruciais, que a cada dia nos interrogam como membros da Igreja de Jesus Cristo. Esta oportunidade é propícia para expressar o nosso sincero pesar e para pedir novamente perdão às vítimas, que sofrem pelas suas vidas destruídas por comportamentos abusivos e criminosos, que permaneceram por muito tempo escondidos e tratados com leviandade, pela vontade de proteger a Instituição e os culpados em vez das vítimas”.
O cardeal Ouellet também especificou que o “simpósio reconhece o clamor e a raiva do povo de Deus. Estamos aqui, portanto, para unir a nossa voz à de quem clama por verdade e justiça, e para elevar a oração ao Senhor da messe para obter a graça de responder adequadamente aos desafios postos pela crise sacerdotal do nosso tempo. Em relação a isso, acreditei que era necessário organizar um evento como este para fazer um balanço dos estudos sociológicos em curso e analisar as causas históricas, culturais e também teológicas que podem revelar a raiz daquilo que o Papa Francisco chama de ‘clericalismo’. Esse termo é um vocábulo genérico e concreto ao mesmo tempo, que descreve um conjunto de fenômenos: abusos de poder, abusos espirituais, abusos de consciência, dos quais os abusos sexuais são apenas a ponta do iceberg, visível e perversa, que emerge de desvios mais profundos a serem identificados e desmascarados”.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Monsenhor francês suspenso por abuso sexual participa de congresso sobre sacerdócio no Vaticano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU