21 Fevereiro 2022
O fato de uma pessoa como o monsenhor francês Tony Anatrella ser admitida para participar do simpósio sobre o sacerdócio, organizado no Vaticano pelo Centre de Ricerche et d’Anthropologie des Vocations (França), fundado há pouco tempo pelo cardeal Marc. A. Ouellet, é uma ofensa, e não só às suas muitas vítimas, mas é também um verdadeiro ultraje à dignidade humana. É um tapa moral de proporções gigantescas.
A reportagem é de Il Sismografo, 18-02-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A Sala de Imprensa da Santa Sé não quis dizer uma única palavra, nem para confirmar nem para negar. O prefeito da Congregação para os Bispos, o cardeal canadense Marc A. Ouellet, limitou-se a explicar que não sabia de nada e acrescentou: “Não cuidei das inscrições e repito que ele não foi convidado”. Muito bem. Anotado. Mas tudo como antes? Certamente não!
Todos aqueles que deveriam pelo menos pedir desculpas às vítimas agora têm que lidar com a sua própria consciência e com a memória do Povo de Deus. Essa delicada questão dos abusos diz respeito a toda a Igreja, hierarquia e fiéis também.
Se é verdade que os organizadores não sabiam que Anatrella estava no meio do público do simpósio, eles deveriam ter se desculpado duas vezes. Pela presença “non grata”, como disse o purpurado, e por não a ter impedido prontamente.
Não basta minimizar desse modo um fato tão grave, usando palavras banais justamente nos dias em que ainda refletimos sobre a carta de Bento XVI a respeito das investigações na Diocese de Munique-Freising. Talvez, entre aqueles que tinham a obrigação de ler essa carta, alguns se distraíram e não a leram.
De que adianta dizer e reiterar continuamente que as vítimas estão no centro do drama dos abusos sexuais na Igreja, se depois não se consegue distinguir, diante de evidências contundentes de arrogância e desprezo, como no caso do padre psicoterapeuta, a dor verdadeira e o arrependimento sincero pelos erros cometidos – que arruinaram milhares de vidas humanas – da tentativa de encontrar justificativas, álibis e truques linguísticos?
A luta real e autêntica contra a pedofilia clerical se faz com fatos e testemunhos concretos, assim como com estruturas adequadas e crescimento da cultura da proteção. O resto, isto é, a verborragia a esse respeito e os desfiles de oradores, já começam a fazer parte daquilo que, parafraseando Leonardo Sciascia, poderíamos chamar de “profissionais da antipedofilia”.
No jornal Il Messaggero, Franca Giansoldati faz uma síntese desse caso: “Na Congregação para a Doutrina da Fé, contra ele [Anatrella], há um processo canônico por agressão sexual contra um menor. Anatrella, 80 anos, já havia sido suspenso ‘a divinis’ em 2018 por outros abusos de pacientes maiores de idade. As agressões sexuais teriam ocorrido no contexto das atividades de psicoterapia realizadas por Anatrella, que no passado foi consultor de diversos dicastérios vaticanos. Ele teorizava percursos psicoterápicos para curar a homossexualidade. Em julho de 2018, uma investigação confiada pelo então arcebispo de Paris, Michel Aupetit, ao seu vigário geral, Eric de Moulins Beaufort – atual presidente da Conferência dos Bispos da França –, chegou a confirmar que as acusações eram procedentes, e foi decidida a suspensão ‘a divinis’. O prelado havia sido punido com a proibição de desempenhar a função de psicoterapeuta, de celebrar os sacramentos, de participar de eventos públicos sem o prévio acordo do arcebispo”.
O cardeal Marc A. Ouellet, prefeito da Congregação para os Bispos, com o apoio de um forte Conselho Científico internacional, fundou em novembro de 2020 o Centro de Pesquisa e de Antropologia das Vocações, independente da Santa Sé.
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Mons. Tony Anatrella, abusador em série, participa de simpósio vaticano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU