"Ameaças [1] têm o poder de gerar temor, medo e um certo pânico, ainda mais quando o armamento de certos setores da população (“dos cidadãos/pessoas de bem”: brancos, religiosos, heterossexuais, defensores da família tradicional, de Deus e da propriedade) é emulado pelo próprio presidente da república, sendo, sem maiores surpresas, seus súditos mais fervorosos. O receio era de que acontecessem provocações entre os pró e contra governo, podendo acabar em tumultos, confusão, tiros e mortes, abrindo espaço para intervenção federal e, quem sabe, até mesmo decretação de estado de sítio", escreve Iael de Souza, doutora em Educação pela UNICAMP/SP; Mestre em Ciências Sociais pela UNESP/Marília; pesquisadora do NESPEM (Núcleo de Estudos e Pesquisa em Emancipação Humana), UFPI/Teresina.
7 de setembro de 2021. Por volta de um mês antes dessa data, o atual presidente Jair Bolsonaro conclamou suas bases de apoio a tomarem as ruas para “mudar o Brasil”, afrontando o Supremo Tribunal Federal, disparando várias ameaças que fizeram com que muitas das lideranças e figuras proeminentes das esquerdas e setores “progressistas” recuassem de participar do tradicional Grito dos Excluídos, que também ocorre nessa data. Mobilização e desmobilização se interdeterminaram.
Ameaças [1] têm o poder de gerar temor, medo e um certo pânico, ainda mais quando o armamento de certos setores da população (“dos cidadãos/pessoas de bem”: brancos, religiosos, heterossexuais, defensores da família tradicional, de Deus e da propriedade) é emulado pelo próprio presidente da república, sendo, sem maiores surpresas, seus súditos mais fervorosos. O receio era de que acontecessem provocações entre os pró e contra governo, podendo acabar em tumultos, confusão, tiros e mortes, abrindo espaço para intervenção federal e, quem sabe, até mesmo decretação de estado de sítio.
O presidente Jair Bolsonaro mantém seus apoiadores através das ameaças, que funcionam como tática de dois passos à frente, um atrás, mas sempre avançando. Como dito por Jones Manoel, através do 7 de setembro ele demonstra que
a máquina de Fake News que gera pânico ainda é muito eficiente e teve uma vitória tática fundamental, porque um deputado bolsonarista vai para o (programa) Metrópoles e diz que tem 50 ônibus cheios de policiais militares para fazer o ato da Paulista, isso é repercutido e aí deputados e figuras de esquerda (...) repercutem isso. Ou seja, a máquina de Fake News bolsonarista consegue pautar, sem problemas, a deputada de esquerda do PSol. Uma vitória tática importantíssima! Eles acabaram de perceber que a investida no pânico moral pelas notícias falsas via um possível medo de violência tem um efeito gigantesto e aí pode ter certeza que eles vão usar muito esse artifício daqui pra frente. E se chegarem a uma força política expressiva, o que os impede de usarem isso para 2022? De fazer, inclusive como recomendam alguns manuais de guerrilha, ações de propaganda armada, como, por exemplo, criar um boato de violência onipresente nas ruas, faz um ataque aqui outro ali, dois ataques, e aí cria um clima de pânico moral generalizado para que as esquerdas tenham medo de sair às ruas para fazer campanha, paralisando as ações. Então, isso é a primeira coisa, eles conseguiram uma vitória tática, conseguiram mostrar a força de sua máquina de Fake News e conseguiram mostrar como grande parte das figuras de oposição com alguma representatividade institucional vão recuar sem que eles precisem avançar, basta o bolsonarismo ameaçar que vai avançar. Vitória tática fundamental! Segunda vitória tática, a se confirmar, é de que o bolsonarismo amanheça com a narrativa de que eles já tomaram as ruas (o que aconteceu, pois as redes sociais bolsonaristas fizeram com que muitos caminhoneiros acreditassem que havia sido decretado estado de sítio pelo presidente). Se isso acontecer vai colocar o bolsonarismo numa situação mais confortável, porque o Bolsonaro pode jogar nos próximos meses com a ideia de ameaçar repetir a mobilização de 7 de setembro sem repetir. Então ele vai ter um blefe, por um tempo, muito eficiente. Qualquer coisinha ele ameaça: vamos de novo. Não vai, mas não precisa ir, porque (as esquerdas, os progressistas) já vão recuar. (...) O terceiro (fator) mais importante, muito significativo, que é: quer dizer que mesmo com 600 mil mortos o bolsonarismo consegue manejar de maneira eficiente o sentimento de medo e a gente não consegue manejar o sentimento de ódio?!... Isso é uma arma política fundamental, porque política não é só a fria análise de conjuntura. Política, na política e na guerra, a questão da moral, da confiança, do medo, da iniciativa, da coragem é fundamental. Um exército de 100 pessoas motivadas tem um impacto e uma capacidade político-militar muito maior do que um exército de 100 pessoas desmoralizadas e desmotivadas. (...) “Circulação de afetos e sentimentos”. “Criar relação de afeto” (JONES MANOEL, 2021. Os itálicos e parênteses são meus).
Antes de adentrar na questão dos sentimentos, emoções e ânimo das massas (o que na ciência política, história, filosofia e sociologia atualmente se designa por afetos), cabe ressalvar que Bolsonaro consegue ditar as pautas jornalísticas e midiáticas em geral. Após o 7 de setembro, pouco se ouviu ou comentou sobre o Grito dos Excluídos. O que passou a dominar as redes e jornais televisivos e da internet foram as análises sobre o significado do 7 de setembro – apesar de não atingir o número esperado de manifestantes, o contingente foi sim expressivo, não se pode olvidar – e as ameaças não concretizadas de Bolsonaro e dos fanáticos bolsonaristas [2].
Há algo que o movimento bolsonarista – anterior ao próprio Bolsonaro, fruto do crescimento e fortalecimento da direita e extrema-direita no Brasil, como também em escala mundial desde a década de 1980 – aprendeu a explorar de forma exímia: os sentimentos, emoções, ânimo, enfim, o que se denomina de afetos das camadas médias, da pequena burguesia urbana e rural e da facção da classe trabalhadora que teme a deterioração do seu frágil status social e padrão de vida, invariavelmente ameaçado pela precarização.
Desde a década de 1990 (Olavo de Carvalho), e de modo mais intensificado a partir de 2000, as redes sociais são utilizadas para difundir ideias distorcidas da realidade, teorias conspiratórias, rumores que alimentam incertezas, insegurança, medo, receio, angústia, ódio, aversão, raiva, ressentimentos em relação à política, aos políticos, às instituições sociais representativas do Estado de Direito, estimulando um sentimento antissistêmico, além do antilulismo, antipetistmo (acentuados com o escândalo do Mensalão em 2005 e a Lava-Jato, a partir de 2012), antiesquerda e o eterno retorno da “ameaça comunista” no Brasil, elegendo, assim, os inimigos a combater e a justificativa para a guerra cultural a ser travada.
O problema é que o conservadorismo e o reacionarismo não estão presentes somente na direita e extrema-direita, também faz parte do modo de ser e pensar dos segmentos subalternizados e subproletarizados da classe trabalhadora. Algo detectado por André Singer e compartilhado por Francisco de Oliveira, como demonstra Anderson (2020), sendo também corroborado por Mascaro (2018):
(Os pobres brasileiros formam) um subproletariado que compreende quase metade (48%) da população, movido por duas emoções principais: a esperança de que o Estado possa mitigar a desigualdade e o medo de que os movimentos sociais gerem desordem. Na leitura de Singer, a instabilidade é um fantasma apavorante para os pobres, seja qual for a forma que assuma – luta armada, inflação dos preços ou greves operárias. Enquanto a esquerda não foi capaz de compreender isso, a direita conseguiu capturar seus votos para o conservadorismo. Em 1989, Lula conquistou todos os demais segmentos do eleitorado, mas Collor, brandindo o perigo da anarquia, arrebatou os pobres e obteve uma vitória confortável. Em 1994 e 1998, o controle da inflação levada a cabo por Fernando Henrique garantiu-lhe margem ainda maior de voto popular. Em 2002, Lula finalmente entendeu que não eram apenas empreiteiros e banqueiros que precisavam de garantias de que ele não faria nada excessivamente radical no poder, mas – e de modo ainda mais crucial – camelôs e moradores de favelas. (...) A ortodoxia econômica do primeiro mandato de Lula e a cautela menor, mas contínua, de seu segundo mandato eram, portanto, mais que simples concessões ao capital. Elas respondiam às necessidades daquela parcela de pobres que, por não contar com emprego formal, não pode se defender da inflação e repudia as greves ainda mais que os ricos, como uma ameaça à vida cotidiana. (...) O medo da desordem e a aceitação da hierarquia, que ainda distinguem o Brasil na América Latina, são herança da escravidão (ANDERSON, 2020, p. 68, 69 e 89).
(...) posição chave das massas como garantidoras dos processos de transformação social. Exatamente sua desmobilização e o descuido com sua formação ideológica – do que resulta sua constituição sob moldes conservadores e reacionários – implicam a queda do único bastião que garante solidez a movimentos de mudança dos padrões econômicos e políticos. Contra o capital, contra as armas e contra os aparelhos ideológicos, somente as massas, por sua imensidão e pela condição de classe trabalhadora, produtora da vida social, podem servir de contraponto transformador. Abandoná-las e não as formar politicamente é decretar o fracasso de qualquer ação superadora das condições da sociabilidade presente (MASCARO, 2018, p. 64).
Jones Manoel está lucidamente correto ao afirmar que o fazer político da política joga com os afetos, com sua circulação e cadeia de relações. É esse jogo que a direita e, principalmente, a extrema-direita vem jogando com maestria desde a década de 1990 e como mestres a partir das Jornadas de Junho de 2013 e as eleições de 2014. Como afirma Fonseca (2021, p. 121):
O medo é um afeto político. Um sentimento que tem dimensão política quando atravessa relações sociais. (...) O medo que compõe a vida política é o que trespassa vínculos sociais: medo da violência urbana, medo do desemprego, medo da impossibilidade da aposentadoria, medo de epidemia com alto risco de contaminação, medo de conflitos sociais, medo dos rumos da economia do país, medo de não alcançar a plena formação escolar, medo do estrangeiro, medo de políticas de gênero, raciais e feministas, medo de tudo quanto se refira a si e ao outro em sociedade.
São esses medos por parte das camadas médias, ressentidas pela entrada no mercado interno de consumo das camadas populares – ameaçando seu antigo status social e privilégios, diminuídos pelas políticas públicas de minorias e focalizadas –, como também o medo da precarização (uberização) das condições de trabalho e, por decorrência, de vida, de um contingente cada vez mais significativo dessas camadas e da classe trabalhadora escolarizada, qualificada, que acabam proporcionando as circunstâncias e condições para os oportunistas populistas [3].
Momentos de crise de hegemonia (dominação e direção políticas) e de insegurança econômica repercutem nas demais esferas da produção da vida social – como ocorreu no governo Dilma, de 2013 até o golpe jurídico-parlamentar-midiático de 2016 –, criando a situação propícia para a tomada da cena política por todos os estereótipos nazifascistas e fascistóides que ficam à espreita, nos bueiros e esgotos, aguardando oportunidades como essas para atuar como personagens principais, arvorando-se como encarnação dos interesses do povo, da nação. O outsider populista é legitimado socialmente, porque uma parcela da sociedade enxerga nele seu “salvador”. Há uma adesão afetiva entre o líder e seus seguidores e, assim, estabelece-se um pacto
no qual o poder soberano é exercido em nome do povo, mas por alguém fora deste acordo e supostamente legitimado a exercer uma força sem limites e responsabilidades, em nome do medo que atravessa a sociedade, e isso seria argumento suficiente para a alienação de direitos em troca de paz e segurança. (...) Os regimes autoritários que eclodiram a partir do século XX têm em comum a narrativa das suas lideranças políticas de ali se encontrarem em nome do povo (soberania popular), que lhes confiou o poder porque já muitos medos que singram pela sociedade, e, por isso, o povo conta com eles como intérpretes de suas esperanças de paz e segurança, e para tal propósito agem com poderes e força sem se constrangerem aos mesmos controles, limites e responsabilidades do cidadão comum (FONSECA, 2021, p. 43 e 44).
Como alerta o cientista político estadunidense Jason Stanley: “A política fascista substitui o debate fundamentado por medo e raiva” (STANLEY, 2018, p. 66). O medo gera a sensação de pânico [4] que se apodera da mente e espírito dos indivíduos sociais. Assim, terminam transferindo para um outro seu poder de decidir e executar. De forma legítima o “soberano” absorve por aderência afetiva – porque outorgada, consentida e concedida – a soberania de cada indivíduo particular. Os direitos de cada indivíduo são transferidos ao “soberano”, que se investe de um poder quase ilimitado e o exerce sem responder à sociedade, fazendo valer a sua vontade política e subordinando a ela o Direito, utilizando da violência institucionalizada para fazer cumprir seus preceitos, como evidencia Fonseca (2021, p. 46).
A disseminação do medo cria as condições para o estabelecimento do clima de perpétuo terror, funcionando como uma arma ideológica poderosa, um instrumento político de inestimável valor, “porque interdita a participação e a crítica” (FONSECA, 2021, p. 124), tornando os indivíduos mais dóceis e resignados, menos resistentes e mais dispostos a obedecer por se sentirem ameaçados e inseguros (procura de paz e segurança), prontos a legitimar medidas de exceção que acabam se normalizando e virando a regra, institucionalizando a violência, como é o caso do Estado policial/militarizado e do Estado penal.
Tem-se, assim, a seguinte chave de interpretação: “medo como mote, violência como recurso de combate num paradoxo discurso de promessa de paz e segurança, isento o poder soberano exercido por ele de qualquer responsabilidade” (FONSECA, 2021, p. 46. Os itálicos são meus). Eis como se efetiva o uso da tática afetiva do medo e da intensa mobilização de outros afetos (ódio, ressentimento, raiva, decepção, angústia, frustrações pessoais, etc.) para proporcionar a adesão afetiva dos indivíduos a figuras que escamoteiam seu autoritarismo utilizando de discursos que usam, de forma distorcida, os valores democráticos (da democracia burguesa).
(...) a sociedade consente, acredita necessário ceder seus direitos, os direitos que qualificam a condição e humanidade que nos habita para tentar conter o que lhe apavora, as suas angústias, as suas frustrações. O desejo de “paz e segurança”, o medo de perder o emprego para estrangeiros, o medo imaginário de destruição do modelo tradicional de vida familiar porque surgem casamentos homossexuais e crianças por eles adotadas, um vasto conjunto de medos; o ódio contra promessas não realizadas por políticos ou partidos políticos; o ressentimento por se sentir desprezado, posto de lado porque substituído profissionalmente por novas gerações; etc. São muitos os afetos que podem ser utilizados politicamente, sentimentos que se avolumam e lançam-se à realização de promessas de reparação e pretendem justificar estados de exceção (FONSECA, 2021, p. 124 e 125).
Aqueles que aderem consentem com abusos de poder e autoridade, uma vez que são justificados como meios de combater e eliminar os inimigos da pátria, da nação, da família tradicional, da moral e bons costumes, dos “cidadãos de bem”. Importante ressaltar que é necessário a criação de um inimigo [5] (grupos, minorias; personagens do passado – mortos –, do presente – vivos –; ideias que ameacem o status quo e o establishment; etc.) comum a fim de canalizar todas as energias, os ânimos, os sentimentos, as ações para vencer o mal. Aliás, essa é a grande narrativa [6]: “a luta do bem contra o mal”, contra a ameaça comunista e contra todos aqueles que destoam do pensamento único do “soberano”, a ser cultivado e acreditado cegamente como a única verdade, sendo inquestionável.
As vozes dissonantes devem ser silenciadas, assim como todos(as) que se atrevam a revelar os fatos, apurando-os e comprovando-os mediante o processo histórico-social, o que é feito através de ataques pela fabricação de Fake News que destroem a reputação pessoal desses indivíduos, onde mentiras passam a ser acreditadas como verdades pelo grande público, provocando prejuízos, constrangimentos e danos morais àqueles que são seu alvo, mesmo que sejam inverdades, como demonstra o caso de Patrícia Campos Mello (2020).
É assim que “eles” correspondem a todos aqueles que discordam do “soberano” e o “nós” à parte que compactua afetiva, sentimental e racionalmente com ele, sendo o verdadeiro “povo”. No entanto, “eles fazem parte do povo, mas são rejeitados pelo soberano, são os inimigos internos” (FONSECA, 2021, p. 129). Como inimigos internos, devem ser vigiados, perseguidos, punidos, presos e mesmo eliminados (acabando com sua reputação ou mesmo fisicamente).
Isso nos permite compreender melhor a razão do ataque do chefe do executivo, e seus asseclas, ao pensamento crítico, à cultura, à educação, já que são instrumentos que contribuem para a capacidade de refletir sobre o real, discernindo os fatos dos rumores. São, por isso, inimigos a ser subjugados ou mesmo eliminados. O ataque aos professores como esquerdistas subversivos se dá pelo reconhecido temor da relevância do registro histórico (fatos) e da valorização da memória (relação processual entre passado, presente e futuro) como condições para a construção da consciência histórica dos indivíduos sociais e seu potencial para minar, ainda na raiz, qualquer tentativa de atualização das atrocidades, absurdos e desumanidades da história humana, como o fascismo, nazismo, xenofobia, homofobia, genocídios, racismos, dentre outros, pois constrói uma consciência comum que reprova e repudia, incondicionalmente, toda forma de opressão, exploração, dominação e exclusão.
A memória das relações sociais é uma construção continuamente elaborada a fim de distinguir e vincular o passado em relação ao presente e ao futuro. (...) É o processo no qual algumas recordações são valorizadas, enquanto outras são descartadas ou alocadas em setores periféricos. O que se desvaloriza na elaboração presenta da memória é o que será esquecido (TELES, 2015, p. 37 e 41).
Cientes do significado dos afetos e das consequências advindas da manipulação de sua circulação na política e no fazer político, precisamos estar cada vez mais atentos às jogadas da direita, extrema-direita e dos oportunistas populistas, às suas ameaças, blefes e táticas que produzem a cultura do medo e o pânico moral, favorecendo medidas legais e legitimadas de exceção, amedrontando e acovardando as esquerdas e “progressistas”, fazendo-os recuar, quando deviam criar táticas para avançar, aproveitando dos momentos de fragilidade e exposição de seus adversários.
Não se deve esperar até 2022 para plasmar as insatisfações, a indignação, a revolta, os medos, as inseguranças, as agruras, as mazelas, os males, as angústias, o desamparo, o desespero dos segmentos da classe trabalhadora do campo e da cidade. As eleições NÃO SÃO a catarse. Esta se faz processualmente, no médio e longo prazo, por intermédio de um trabalho de elevação da consciência político-social da classe trabalhadora, das camadas populares e subalternos, mediante a disseminação da criação de centros de formação política-cultural nas comunidades, bairros, periferias, em contato direto com as diversas camadas geracionais, focando principalmente na juventude, porque dispõe de energia, vontade e quer fazer/ver acontecer as transformações necessárias para que possa vir a viver uma outra vida.
Se tivermos que recuar, que seja para poder avançar em seguida, cada vez mais! Não devemos nem podemos deixar que o medo nos paralise. O medo deve servir como alerta ao perigo, fazendo com que nos preparemos ainda mais e melhor para enfrentá-lo, mas jamais pode nos fazer deixar de combate-lo. O medo é salutar quando nos deixa de sobreaviso, mas a única forma de vencê-lo é pelo enfrentamento. Talvez esteja mais do que na hora – mesmo passado – de nos apropriar (e atualizar) das lições militares registradas na história através dos embates entre trabalho e capital, como demonstra Engels (2021), aperfeiçoando nossas táticas e estratégias (a arte da guerra) para responder, à altura, à distopia gerada pelo atual estágio de barbárie social da sociabilidade capitalista do século XXI. Escolhamos nossas armas com argúcia, pois, se ainda não se deram conta, estamos em guerra!
ANDERSON, Perry. Brasil à parte: 1964-2019. Trad. Alexandre Barbosa de Sousa ... [et. al.] 1 ed. São Paulo: Boitempo, 2020.
FRIEDRICH, Engels. Escritos Militares. Trad. Euclides Vasconcelos ... [et. al.] 1 ed. São Paulo: Baioneta, Instituto Caio Prado Junior, 2021.
FONSECA, Luiz Manuel Pires. Estados de Exceção – a usurpação da soberania popular.
JONES MANOEL – As manifestações em 2021 e o 7 de setembro. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=8ej-VXzdBrk.
MASCARO, Alysson Leandro. Crise e Golpe. 1 ed. São Paulo: Boitempo, 2018.
MELLO, Patrícia Campos. A Máquina do Ódio – notas de uma repórter sobre Fake News e violência digital. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.
STANLEY, Jason. Como funciona o fascismo: a política do ‘nós’ e ‘eles’. Porto Alegre: L&PM, 2018.
TELES, Edson. Democracia e estado de exceção: transição e memória política no Brasil e na África do Sul. São Paulo: Ed. Fap-Unifesp, 2015.
[1] “A gestão mafiosa opera por ameaça e oferece ‘proteção’ aos ameaçados em troca de lealdades para manter todos em dependência mútua” (FONSECA, 2021, p. 98).
[2] Sendo que uma parte ficaria completamente decepcionada por seu “mito” não cumprir suas promessas, além de solicitar aos caminhoneiros que desbloqueassem as rodovias que haviam congestionado para provocar o desabastecimento e fazer pressão sob o Congresso Nacional. Por fim, recebeu a pecha de “traidor”, “arregão” e “frouxo” por parte de seus apoiadores, cuja decepção aumentaria ainda mais após a divulgação da nota escrita por Michel Temer e assinada por ele para apaziguar os ânimos.
[3] “(...) o líder carismático encarna a voz do povo, não como seu representante, mas como se o povo, por ele, estivesse presente” (FONSECA, 2021, p. 69).
[4] A cultura do medo contribui para a constituição de um “(...) elevado nível de ‘preocupação’ com o comportamento de grupo ou categoria e as consequências que o comportamento causa para a sociedade”, gerando, por conseguinte, “(...) pânico moral”, cujo principal produto é, sobretudo, a “ansiedade, e ela se revela em diversas maneiras: conversas, emoções, crimes de ódio ou frenesi da mídia. A hostilidade em relação a certo grupo ou categoria, elemento que constitui o pânico moral, desenvolve-se por consenso de que a ameaça é real” (FONSECA, 2021, p. 161).
[5] “Não é preciso que o eleito à condição de inimigo tenha feito algo, ameaçado, nada disso. O que é necessário é existir um inimigo, qualquer um, alguém a ser indicado como um oponente comum a permitir, por congregação de afetos políticos, o consentimento ao soberano para tornar imperante sua vontade política sobre o Direito” (FONSECA, 2021, p. 129).
[6] “(...) O líder populista (...) precisa mobilizar o ódio para aniquilar, ‘purificar’ a sociedade, combater todos aqueles que, em sua estreita ótica, não deveriam fazer parte do povo, do ‘seu povo’” (FONSECA, 2021, p. 71 e 72).