27 Agosto 2020
A quinta geração de rede móvel, supostamente para responder ao crescimento do tráfego, deve aumentá-lo e conduzir a inovações e também à renovação de equipamentos. Na verdade, não é sinônimo de sobriedade.
A reportagem é de Justin Delépine, publicada por Alternatives Économiques, 26-08-2020. A tradução é de André Langer.
Depois da Convenção Cidadã pelo Clima, que pede uma moratória para a implantação do 5G, a onda verde de junho nas eleições municipais trouxe novos prefeitos que fizeram a mesma promessa aos seus eleitores, como em Bordeaux ou Nantes. A oposição ao 5G também ganhou contornos mais consistentes, com incêndios de antenas retransmissoras por parte de ativistas, como a de Foncine-le-Haut, em Jura, atacada com um coquetel molotov em meados de abril. Raramente a introdução de uma nova tecnologia gerou tanta tensão.
Seus apoiadores o veem como uma ferramenta estratégica, ao passo que seus oponentes criticam uma corrida frenética por inovação, resultando em uma pegada ecológica cada vez maior das novas tecnologias. Apesar dessas múltiplas disputas, sua implantação já está praticamente dada na França: os leilões de alocação das frequências das ondas do 5G acontecerão no final de setembro e as operadoras de telecomunicações deverão oferecer os primeiros pacotes até o final do corrente ano.
Concretamente, o que é o 5G? Como seu acrônimo indica, é a quinta geração da tecnologia de rede móvel, que complementará o 3G e o 4G. Essa tecnologia, no entanto, é mais do que um mero aprimoramento das versões anteriores.
O desempenho da taxa de transferência deve ser multiplicado por um mínimo de dez e o tempo de latência dividido de acordo. Em consequência, um volume maior de dados – o combustível que move nossas telas de imagens, de textos ou de sons – poderá circular mais rápido. O suficiente para abrir horizontes para serviços futuros, como o carro conectado, a telecirurgia ou mesmo os chamados sistemas de cidades “inteligentes”, que prometem otimizar a gestão das diversas redes urbanas (água, eletricidade, tráfego rodoviário, etc.).
Uma das características do 5G é se desenvolver em bandas de ondas de maior frequência, neste caso a banda de 3,5 GHz num primeiro momento. Se a alta frequência permite o tráfego de um grande volume de dados, tem a desvantagem de oferecer um sinal menos resistente. Isso acontece porque ele se propaga por um raio menor e se depara com mais obstáculos, como paredes ou janelas. Assim, para cobrir o território, o 5G requer um número maior de antenas do que as versões anteriores.
Maior frequência de ondas e multiplicação do número de antenas, um coquetel ideal para despertar ainda mais a preocupação de quem questiona o efeito dessas ondas eletromagnéticas sobre a nossa saúde. A Organização Mundial de Saúde (OMS), assim como as autoridades de saúde francesas, no entanto, reiteram que tal efeito nunca foi comprovado cientificamente. Essa resposta não convence os oponentes que reivindicam o princípio da precaução.
Outra crítica dirigida ao 5G é seu caráter energívoro. Este é um grande problema em um momento em que as autoridades públicas estão começando a perceber que a tecnologia digital não é de forma alguma imaterial e depende de uma infraestrutura física que é insaciável de energia. Em termos globais, ela representa 10% da conta de eletricidade e quase 4% das emissões de gases de efeito estufa. Emissões que podem dobrar até 2025 e chegar a 8%, se uma estratégia de conservação de energia não for aplicada.
O 5G é a promessa de ganhos de eficiência energética, afirmam as operadoras de telecomunicações. “Para o mesmo volume de dados, o 5G consome muito menos energia do que o 4G”, resume Nicolas Guérin, presidente da Federação Francesa de Telecomunicações (FFT). Os promotores desta tecnologia também elogiam as características mais econômicas das antenas de retransmissão e, em particular, sua capacidade de ficar suspensa quando nenhuma atividade é detectada e, portanto, consumir menos energia.
Mas, embora os ganhos de eficiência energética com essa tecnologia sejam reais e significativos, eles podem não compensar o aumento no tráfego de dados, que já dobra a cada dois ou três anos. “Estima-se que até 2030 os ganhos de eficiência energética proporcionados pelo 5G serão multiplicados por dez, mas ao mesmo tempo, o tráfego de dados aumentará em 100, ou até mais”, explica Gauthier Roussilhe, designer e autor de um relatório sobre esta tecnologia. (1)
“As consequências ambientais do 5G dependerão do que fizermos com essa rede; se não fizermos nada e deixarmos o tráfego aumentar, sim, é possível que haja um aumento no consumo de energia, mas não é essa tecnologia que o produz e não é certo”, atenua Sébastien Soriano, presidente da Agência Reguladora das Comunicações Eletrônicas e Serviços Postais (Arcep).
Por que previsões tão alarmantes? Porque para avaliar melhor o impacto energético do 5G, devemos levar em consideração também o efeito rebote, que deve ampliar o aumento observado atualmente. Esse fenômeno se verifica a partir do momento em que uma melhoria permite que um produto ou serviço mobilize menos energia: em vez de estabilizar seu uso e, portanto, reduzir a conta de energia, observamos, ao contrário, uma intensificação que resulta in fine em maior consumo de energia.
“É um fenômeno que se auto-alimenta, o 5G acelerará o aumento do tráfego”, resume Hugues Ferreboeuf, do Shift Project. De acordo com esse think tank, que se mobiliza por uma economia de baixo carbono, o 5G deve multiplicar o consumo de energia das operadoras por 2,5 ou 3.
Outra desvantagem: a implantação do 5G vai desencadear um tsunami na renovação de equipamentos, em primeiro lugar, dos smartphones. Na verdade, nossos equipamentos digitais não estão equipados para captá-lo, uma vez que esse padrão tecnológico não estava definido no momento de sua concepção. “O 5G, portanto, corre o risco de acelerar a obsolescência dos smartphones 4G, com a substituição de vários milhões desses equipamentos somente na França”, prevê Frédéric Bordage, fundador da comunidade Green IT.
O suficiente para impulsionar um pouco mais a produção de seus componentes, dos metais raros, cuja extração exige muitos produtos químicos e combustíveis fósseis. No total, sua fabricação é responsável por dois terços da pegada de carbono digital dos franceses, que, por sua vez, representa 2% das emissões do país. (2)
Mas, basicamente, precisamos mesmo do 5G? Ele deve servir principalmente para absorver o crescimento do tráfego móvel, hoje impulsionado pelo tráfego de vídeo on-line. Este último representa dois terços do tráfego total, e as grandes plataformas americanas respondem por uma parte substancial do tráfego francês: 23% para Netflix e 15% para o Google e sua subsidiária YouTube.
Sobrecarregadas pela crescente quantidade de dados injetados na rede por essas grandes plataformas que oferecem resoluções de imagem cada vez maiores, as operadoras de telecomunicações, como Orange ou SFR, devem encontrar um pouco de margem de manobra graças ao 5G na rede móvel em centros urbanos onde se concentra o consumo. Com um certo exagero: o 5G permitirá especialmente que você assista a uma série da Netflix no formato 4K (ultra alta definição) em melhores condições enquanto estiver na fila do ônibus.
Em segundo lugar, o 5G acompanhará a explosão de objetos conectados de todos os tipos, milhões que se juntarão à rede, destinados a se tornarem bilhões. “Este enfoque no 5G, que é apenas uma evolução das redes, não nos deve fazer esquecer os verdadeiros desafios ambientais da tecnologia digital, nomeadamente a proliferação de terminais e o advento da internet das coisas”, alerta Sébastien Soriano, executivo das telecomunicações.
Do interruptor conectado a sensores em um poste de luz para fornecer iluminação apenas quando um transeunte estiver passando, uma infinidade de objetos conectados à rede deve invadir nossas casas e nossas infraestruturas dentro de alguns anos. No entanto, a produção destes equipamentos apresenta os mesmos problemas dos nossos smartphones, mas em uma escala muito maior. Enquanto alguns podem economizar energia durante o uso, medindo uma demanda real para se adaptar a ela, muitos outros aumentam os dispositivos ou o acréscimo de uma sobreposição digital a objetos sem valor agregado real, da geladeira aos óculos. Tudo isso traz o risco de criar novos usos, aumentando ainda mais a demanda por energia e matérias-primas.
Novos usos, explosão no tráfego: o 5G dificilmente parece sinônimo de sobriedade. Isso ilustra perfeitamente bem a ausência da questão ambiental quando se pensa a tecnologia digital: no momento da sua implantação, nenhum estudo analisando sua pegada ecológica foi realizado. No entanto, fazer o debate sobre a demarcação das novas tecnologias parece urgente, com ou sem o 5G.
1. Ver “La controverse de la 5G. Comprendre, réfléchir, décider ensemble”, abril de 2020.
2. Segundo estudo do Gabinete Citizing, encomendado pelo Senado.
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Temos realmente necessidade do 5G? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU