Feridas das guerras ainda sangram na Coreia

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24 Julho 2020

Participantes da Equipe de Peregrinas de Mulheres de Fé encerraram, na quarta-feira, 15 de julho, visita de quatro dias a Coreia do Sul, onde conheceram histórias esquecidas no Ocidente: de “mulheres de conforto” tomadas por militares japoneses na Segunda Guerra Mundial, que ainda deixa feridas em aberto.

A reportagem é de Edelberto Behs, jornalista.

Peregrinas tomaram conhecimento, então, que a estigmatização e o abuso não se restringiram apenas ao domínio japonês, pois o início da Guerra da Coreia e a militarização em curso resultaram na perpetuação da prostituição nos campos de soldados americanos em manutenção da paz. A jornada das peregrinas foi motivada pelas comemorações do 70º aniversário da Guerra da Coreia, que, segundo o reverendo Hyun Ju Bae, da Igreja Presbiteriana, “é uma guerra inacabada”.

Após o retorno do Japão, onde as “mulheres de conforto” serviram como escravas sexuais para soldados japoneses, elas foram estigmatizadas e envergonhadas na Coreia por sua condição de prostitutas. Ao morrerem, elas foram enterradas sem cerimônia em sepulturas não identificadas, seus nomes apagados e suas histórias esquecidas.

“Até agora, não apenas lutamos para restaurar a dignidade e os direitos humanos das vítimas que foram violadas, mas também trabalhamos ativamente para restaurar e dizer a verdade”, disseram integrantes do Conselho Coreano de Justiça e Memória para as Questões da Escravidão Sexual Militar em coletiva de imprensa. Há 30 anos, 37 organizações religiosas e de mulheres constituíram o Conselho.

Desde então, esse grupo tem exposto ao mundo a brutalidade de japoneses ao criarem os “bordéis militares” na primeira metade do século XX, forçando coreanas e outras mulheres à prostituição. “Muitas pessoas morreram, ficaram feridas e perderam suas famílias, mas as mulheres tiveram que sofrer dores duplas e triplas”, relatou o reverendo Moon Sook Lee, membro do Comitê de Mulheres do Conselho Nacional de Igrejas da Coreia, ao se reportar à ocupação japonesa e à Guerra da Coreia.

Outra organização, a Associação de Bem-Estar Social das Irmãs Ensolaradas, de caráter ecumênico, apoia mulheres idosas que foram forçadas à prostituição, ajudando-as a viver de maneira mais humana. Eun Jin Kim, diretor da organização DuReBang – que significa “um lugar onde as mulheres se ajudam e um lugar para descansar” – estima que mais de 200 mil mulheres trabalhadoras do sexo viviam em campos próximos às bases militares dos Estados Unidos.

O patriarcado abusivo precisa ser interrompido na Coreia e em qualquer parte do mundo, disse a vice-secretária geral do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), Dra. Isabel Apawo Phiri. Em 2017 e 2018, em visita à Equipe de Peregrinas, Phiri ouviu histórias de violência doméstica e institucional contra mulheres em países africanos. Mulheres foram obrigadas a se prostituírem para alimentar suas famílias. Meninas foram forçadas a se casar cedo para “protegê-las” do estupro por parte de soldados.

Na Colômbia, Equipe de Peregrinas ouviu relatos, em 2018, sobre violência sexual perpetrada por soldados do governo e da guerrilha. Em Bangladesh, mulheres tiveram seus rostos desfigurados por ácido jogado por cônjuges ou estupradores. Em Fuji, peregrinas ouviram mais histórias de mulheres mortas por parceiros.

As Peregrinas de Mulheres pela Fé empreenderam a 1.448ª marcha, desta feita para a Coreia do Sul, com o propósito de escutar e acompanhar mulheres da igreja coreana e seu pedido de acabar com o patriarcado, uma realidade sombria ainda presente nos dias atuais. Peregrinas foram tocadas por histórias de abuso sexual e escravidão, subproduto da militarização e seu impacto traumático sobre sobreviventes e seus filhos. Também se sensibilizaram com os esforços de coreanas em restaurar a dignidade daquelas que caíram no ostracismo pelas feridas do passado e do presente.

As Peregrinações de Justiça e Paz é uma iniciativa do CMI convocando as igrejas-membro a se envolverem, de modo colaborativo, nas “questões mais importantes de justiça e paz, curando um mundo cheio de conflitos, injustiça e dor”, explica o serviço de imprensa do organismo ecumênico internacional. 

A iniciativa foi aprovada na X Assembleia do CMI, reunida em 2013, em Busan, na Coreia. O chamado ecumênico conclama a Igreja de Jesus Cristo ao engajamento e à oração onde a paz e a justiça são ameaçadas ou destruídas.

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