09 Março 2020
As comunidades eclesiais de base da América Latina, “verdadeiras experiências de sinodalidade no caminho da Igreja”, como as define o Papa Francisco em Querida Amazônia, estão reunidas em Guayaquil, Equador. Por mais de dez dias, em diferentes níveis, representantes de 15 países são chamados a refletir sobre os gritos dos pobres e da Terra, buscando ministérios para o cuidado, a proteção e a defesa da vida digna e da Casa Comum.
O primeiro passo foi o I Encontro Continental de CEBs de Jovens, uma novidade neste 2020, em que são comemorados 40 anos de caminhada continental. Participaram 40 jovens de 11 países, que durante dois dias, 7 e 8 de março, procuraram fortalecer o protagonismo como colaboradores jovens do Reino nas CEBs, a partir de processos locais e nacionais, tentando tornar visível sua contribuição para a Igreja de base.
A reportagem é de Luis Miguel Modino.
As diferentes origens, culturas, idiomas, não impedem que os jovens sonhem, querendo aprender com Jesus, gritar e ressonar os problemas do continente, assumir compromissos que ajudem a mudar a realidade de seus povos, da América Latina. Os jovens, que chegaram ao encontro movidos por um sonho, atitude que os ajuda a se levantar todos os dias, trouxeram diferentes realidades locais, mostrando aos outros o que está presente em sua vida juvenil.
Essa realidade é sempre vista de diferentes perspectivas, com diferentes lentes, com diferentes interpretações, algo presente em todos. Francisco Bosch, um jovem teólogo argentino, ajudou os participantes do encontro a aprofundar as quatro lentes que o Papa Francisco propõe para caminhar juntos, como povo, o que não significa que todos devemos pensar da mesma forma. É, segundo o teólogo leigo, construir uma cultura de encontro, em harmonia pluriforme, sem perder o que é próprio, mas também sem querer se impor ao outro.
I Encontro Continental de CEBs de Jovens (Foto: Luis Miguel Modino)
A primeira coisa a ter em mente na proposta do Papa Francisco é que a unidade prevalece sobre o conflito, uma unidade que não é obediência cega. Segundo, a realidade é mais importante que a ideia, fazendo autocrítica e olhando além do culto às idéias. Um terceiro passo é descobrir que o todo é superior à parte, o que leva a uma tensão entre o local e o global, experimentar que na comunidade existe um poder maior que a soma dos indivíduos que a compõem. Por fim, Francisco nos leva a ver que o tempo é superior ao espaço, a descobrir processos em uma realidade que deseja nos levar a ler fatos soltos, a gerar processos em vez de ocupar espaços.
Nesse contexto, as comunidades eclesiais de base são chamadas a organizar comunidades de vida digna, a deixar para trás a tentação de olhar apenas para os grandes e esquecer os pequenos, dos simples. Algo que pode servir de exemplo é a imagem do telescópio e do microscópio, como formas de contemplar a realidade, tendo sempre a paciência como atitude, o que nos leva a superar a ansiedade dominante. Ninguém pode esquecer que a fé é vivida na vida cotidiana e que é preciso entrar na realidade para transformá-la, sabendo que não há fé comprometida se não for comovida.
Os jovens foram desafiados a descobrir o clamor presente na realidade latino-americana. A discriminação contra os mais pobres, violência contra mulheres e jovens, cada vez mais vulneráveis, perda de direitos, poluição e destruição de biomas, clericalismo, insegurança, desemprego, abuso infantil, são gritos que eles percebem na realidade latino-americana. Mas os jovens não ficam à toa, não querem ser impassíveis, eles se envolvem em processos de formação, em conhecer a Bíblia a partir de uma leitura popular, saem para protestar, para fazer missão entre aqueles que têm a mesma idade, são solidários, eles cuidam da Casa Comum, como atitudes cotidianas.
Fazem isso da fé em Deus libertador, que é vida, próximo, misericordioso, humano e irmão, amigo e companheiro de lutas, justo, inclusivo e igualitário, revolucionário, o que nos torna corresponsáveis pelo cuidado da Casa Comum, um Deus do impossível, presente em Jesus Cristo, jovem, que se mistura com todos, em uma Igreja em saída, acolhedora, pobre com os pobres, mãe, que é comunidade. São jovens que acreditam que pequenas coisas podem transformar a realidade, que desejam construir o Reino na terra, fazer realidade uma vida digna, buscar a conversão interior e promover o espírito comunitário.
Os jovens são desafiados a se perguntar em que mundo sonham, que mundo desejam deixar para as gerações futuras. Isso os leva a realizar esses sonhos, a partir de uma construção coletiva e consensual, que provoca uma mobilização e ajuda a organizar a esperança. Que os sonhos devem basear-se em uma escuta atenta das comunidades, caso contrário eles não vão além das ilusões.
No âmbito do Dia Internacional da Mulher, os jovens presentes também refletiram sobre o papel das mulheres na sociedade e na Igreja, nas comunidades eclesiais de base, onde as mulheres mantiveram a fé e não deixaram desmoronar. a Igreja em tantos cantos do continente, sendo maioria entre aqueles que assumem os diferentes ministérios. É um bom momento para continuar promovendo os carismas femininos, exigir um reconhecimento mais expresso de tantas funções assumidas pelas mulheres, também pela hierarquia, para que elas definitivamente participem da organização, decisões e orientações mais importantes das comunidades.
São jovens que sonham com a transformação do sistema em que vivemos, com uma Igreja onde muitas igrejas se encaixam, uma Igreja e uma sociedade sem patriarcado. Eles querem uma Igreja diversificada com rosto de mulher, onde os oprimidos de hoje não sejam os opressores de amanhã. Os jovens sonham com uma uma comunidade popular, que trabalha nas áreas política e de vizinhança. Eles afirmam que os jovens são a consciência da sociedade, que tem "Um coração, um pensamento" e promovem um trabalho em rede com outros atores, para responder a problemas estruturais.
Por isso, eles fazem um chamado a acordar, a perceber que não vamos a lugar algum, sem desejo ... eles podem facilmente nos manipular ... se acordaramos, devemos nos unir aos nossos esforços. Para isso se faz preciso ser uma juventude consciente, desperta e destemida, chamada a acompanhar processos de escuta ativa de confiança, políticos. Também querem se aproximar aos povos originários. Estar com um ouvido no povo e no outro e no evangelho.
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Jovens das CEBs: sonhadores com o Reino e comprometidos com o cuidado da Casa Comum - Instituto Humanitas Unisinos - IHU