24 Fevereiro 2020
A resposta formal às perguntas disciplinares sobre a ordenação de homens casados como padres ou de mulheres como diáconas só pode vir como resposta a um pedido formal. Que ainda não foi feito.
A opinião é da teóloga estadunidense Phyllis Zagano, pesquisadora da Hofstra University, em Nova York. Em português, Zagano é autora de “Mulheres diáconos: passado – presente – futuro” (Paulinas, 2019). Por sua vez, o Instituto Humanitas Unisinos - IHU, publicou o artigo de Phyllis Zagano intitulado "Diáconas na Igreja Maronita", em Cadernos Teologia Pública, no. 124. O presente artigo foi publicado em National Catholic Reporter, 21-02-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A exortação apostólica pós-sinodal do Papa Francisco é apenas o começo da história. Enquanto os conservadores e os progressistas da Igreja vão para a internet, e comentaristas supostamente neutros recorrem aos seus próprios círculos, todos estão esquecendo a floresta e as árvores. Trata-se da Bacia Amazônica, não de padres casados ou diáconas. Com a exceção de que se trata disso, também.
Existem várias camadas nesse documento, que ensina que tudo está interligado. Deus está presente na Amazônia, na criação e nas criaturas. Forças raivosas tentam destruir tudo isso. Enraizadas no poder e na ganância, seus tentáculos estrangulam os povos e a terra. O diabo, de fato, está nos detalhes: escravidão, drogas, tráfico humano, desmatamento, estocagem de água. A rapina da Terra ecoa na vida dos povos.
Essas histórias não são novas. Francisco lembra os povos indígenas da Venezuela, abusados pelos patrões do comércio de borracha há quase 50 anos: “As mulheres ye’kuana foram violadas e seus seios cortados; as grávidas desventradas. Aos homens, cortavam-lhes os dedos das mãos ou os pulsos” [n. 15].
Isso está acontecendo hoje? Nós realmente sabemos o que está acontecendo na Amazônia? Os povos e seus bispos foram a Roma e falaram (ou tentaram falar) do que queriam, do que precisavam. Francisco disse que os ouviu e escreveu a sua resposta.
O que pode salvar a Amazônia? O que pode salvar do seu sofrimento? O que pode trazer saúde e vida? Para Francisco, são o Evangelho e a Eucaristia.
Mas como?, você pode se perguntar. Como levar o Evangelho e a Eucaristia aos povos desprovidos de padres?
Francisco sugere que haja mais diáconos e ministros eclesiais leigos reconhecidos por seus bispos para administrar paróquias, assim como mais padres da Amazônia e de outros lugares.
Com isso, a direita e a esquerda começam suas saídas de campo independentes. “Nada de padres casados! Nada de diáconas!”, proclama a direita triunfante. A esquerda diz praticamente o mesmo, mas em tons incoerentes, até mesmo zangados.
Oi? Trata-se de uma exortação apostólica, não de um motu proprio, e certamente não é uma constituição apostólica, nem mesmo uma encíclica. Qual a diferença? Exortações apostólicas não esclarecem a doutrina nem criam leis. Isso ocorre, em vários níveis, com uma constituição apostólica, uma encíclica papal ou um motu proprio.
A exortação apostólica pós-sinodal “Querida Amazônia” é a resposta de Francisco como bispo de Roma ao documento final do Sínodo Amazônico. Ele apresenta tanto a exortação quanto o documento final a partir da sua catedral diocesana, São João de Latrão, e não da Basílica de São Pedro. Se o papa fizer algo a respeito dos padres casados e das diáconas, ele usará – ou, melhor, deverá usar – outro tipo de documento.
O poeta estadunidense E. E. Cummings escreveu uma vez: “Sempre a bela resposta é a quem faz uma pergunta mais bela”. É hora de fazer as perguntas. De fato, um bispo ou uma Conferência Episcopal deve pedir para que se restaurem as tradições dos padres casados e das diáconas.
Por exemplo, se os bispos da Amazônia, juntos ou individualmente, pedirem formalmente os padres casados, eles deverão escrever e pedir permissão para revogar a lei. Da mesma forma, se eles desejarem reconhecer o ministério diaconal das mulheres por meio da ordenação, eles deverão pedir isso formalmente. O documento final já pede isso? Parece que sim, mas não é o pedido formal de um bispo ou de uma Conferência Episcopal.
O documento final diz claramente que um grande número de círculos menores pediu o diaconato permanente para as mulheres. O pedido da maioria em relação aos padres casados parece restrito à ordenação de diáconos casados que já atuam há algum tempo. Os padres casados e as diáconas estão historicamente documentados, são doutrinalmente possíveis e pastoralmente necessários. Eles foram recomendados pelo Sínodo.
Mas a exortação apostólica não é a resposta. Nem pode ser. A resposta formal às perguntas disciplinares sobre a ordenação de homens casados como padres ou de mulheres como diáconas só pode vir como resposta a um pedido formal. A resposta provavelmente viria em um motu proprio, modificando o direito canônico.
A “Querida Amazônia” é o comentário sincero do papa sobre a situação como ela é. Cabe ao povo de Deus continuar pedindo o que ele precisa e cabe aos bispos agirem em seu nome.
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Padres casados e diáconas: é hora de fazer o pedido formal. Artigo de Phyllis Zagano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU