06 Novembro 2019
"Bom número dos analistas perdem seu latim criticando as tolices do "coiso", sem perceber que o perigo está no que Guedes, poder real, destila, num projeto de destruição da nação e marginalização ainda maior de uma grande parcela da sociedade que nosso economista considera descartável e ainda por cima culpada por não produzir", escreve Luiz Alberto Gomez de Souza, sociólogo.
Eis o artigo.
"Pobre não poupa", disse o ministro Guedes, culpabilizando aquele... Poupar de onde, cara-pálida? Conclusão: há que privilegiar os ricos, que fazem a sociedade caminhar. Já Reagan e Tatcher disseram coisas parecidas.
É incrível o desconhecimento da realidade social. Como se produz e reproduz a pobreza? Onde a culpa, senão num sistema que mantém uma maioria num nível de subsistência? Não poupam por que não podem. E os ricos que amealham em paraísos fiscais tem sua poupança improdutiva. Esses sim devem ser declarados culpados.
Essa frase de Guedes ofende o bom senso de cada um. E mostra como as medidas que propõe são feitas para os ricos e os pobres que se lasquem. Há que fazer sacrifícios em "ajustes indispensáveis", diz esse economista a serviço dos "que poupam" . O sacrifício dos outros, os pobres, é natural e necessário. Afinal são culpados.
Poucas vezes a desfaçatez ou a inconsciência ficaram tão evidentes. E num governo cujo presidente não governa, mas se enreda em crises que ele mesmo produz, Guedes tem o caminho livre para repetir o experimento que fracassou no Chile e na Argentina. Por isso "os que mandam" toleram Bolsonaro e suas maluquices, desde que Guedes possa encaminhar suas propostas antinacionais e antipopulares. Em editorial de 5/11, a Folha festeja "uma ambiciosa agenda de reformas (de Guedes).... (que) apontam na direção correta". O mesmo os comentadores econômicos e políticos do Globo, independentemente dos ataques violentos que sofre de Bolsonaro.
Um incidente seria eloqüente. Foi anunciado que o presidente levaria pessoalmente ao Congresso um pacote de medidas econômicas. Nesta terça, dia 5 de novembro, Bolsonaro chegou ao legislativo, sem aviso nem agenda, no meio de uma sessão ordinária que festejava o dia do nordeste. Depois de um momento de incerteza, sem ter o que dizer, retirou-se de mansinho. A ida do chefe do executivo ao congresso, de um poder a outro, reveste-se de certa solenidade. Não se sabe a que se devia essa improvisação. Vários parlamentares indicaram que o presidente não estava preparado para o cargo que exercia. Tínhamos ali um governo figurativo e errático (Bolsonaro), e um de fato (Guedes).
Entretanto, logo depois o presidente, com Guedes a tiracolo, cuidando para que não falasse fora do combinado, levou um pacote de medidas ao presidente do Senado, que incluía três emendas à Constituição, ajuste fiscal, reforma administrativa, redução em saúde e educação, redução de jornada de trabalho e de salário de funcionários. O presidente da Câmara logo indicou que várias dessas propostas dificilmente seriam aceitas. Paralelamente corria um pacote de privatizações, com a entrega criminosa do pré-sal às grandes corporações petroleiras.
Bom número dos analistas perdem seu latim criticando as tolices do "coiso", sem perceber que o perigo está no que Guedes, poder real, destila, num projeto de destruição da nação e marginalização ainda maior de uma grande parcela da sociedade que nosso economista considera descartável e ainda por cima culpada por não produzir.
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