15 Agosto 2019
A situação de instabilidade na Venezuela continua a desequilibrar a população em todos os níveis e desafia a missão da Igreja. Na cidade de Caracas, como nas metrópoles da América Latina, a maioria da população não tem acesso aos recursos e oportunidades que garantem melhores condições de vida. A pobreza, a desigualdade e as diferentes formas de exclusão social afetam as famílias e se tornam um grande desafio para a evangelização. Estamos em Carapita, um bairro de aproximadamente 100 mil habitantes na periferia da capital venezuelana, onde trabalham os padres Rodrick Tumaini Minja e Beni Kapala, missionários da Consolata, na paróquia de San Joaquim e Santa Ana. O bairro se estende por colinas com casas empilhadas. As ruelas são íngremes o que torna difícil chegar ao topo sem um carro de tração. No bairro tem muitos desses carros que sobem e descem carregando pessoas e mercadorias.
A reportagem é de Jaime C. Patias, publicada por Revista Missões, 12-08-2019.
Fundada em 25 de janeiro de 1990, a paróquia está organizada em sete setores que são comunidades de base muito ativas, incluindo a igreja matriz que fica na parte baixa. Cada capela tem uma religiosa responsável que são as Irmãs dos Sagrados Corações e as Irmãs da Caridade, moradoras na vizinhança e um diácono permanente.
O pároco Rodrick Tumaini Minja. (Foto: Divulgação)
O pároco, P. Rodrick é tanzaniano e nos conta sobre a missão em Carapita e seus desafios na atual situação de crise no país. “Aqui adotamos a pastoral missionária buscando em primeiro lugar os que que estão afastados. Diante da crise econômica, social e moral, encontramos tantas necessidades. De uma forma ou outra temos que atender com as nossas pastorais”. O missionário conta que a falta de transportes e espaços, afeta as atividades. “Temos que cancelar reuniões, reduzir os deslocamentos e inventar coisas para nos adaptar à situação. Não temos espaços adequados para as atividades e por isso estamos construindo salas para a catequese, mas também para a formação do espírito crítico dos cristãos. Está bem atender as emergências, mas a solução é mais complexa. Por isso, a importância da formação para que eles mesmos façam escolhas acertadas e não sejam manipulados”, afirma o padre e conclui: “Vamos caminhando com o que o Cardeal de Caracas, Dom Baltazar Enrique Cardozo chama de Pastoral da Esperança, pois a nossa missão aqui é consolar”.
Sopão da solidariedade. (Foto: Divulgação)
A crise é mais perceptível nos serviços e na falta de recursos para comprar produtos básicos, principalmente alimentos. Hoje o salário mínimo é de 40.000,00 bolívares (apenas 3.35 dólares). Com esse valor não se pode comprar quase nada. (1kg de leite em pó custa 78.000,00; 1 kg de arroz: 12.000,00; 1kg de carne: 25.000,00; 1kg de frango: 14.000,00; uma caixa de ovos: 28.000,00). Por outro lado, a gasolina sai quase de graça. Você pode encher o tanque e se não tiver notas para pagar, segue viagem. Então como vive a população mais humilde? Os venezuelanos fora do país já somam mais de 4 milhões. Muitos enviam dólares para suas famílias. A cada dois ou três meses o governo doa uma cesta básica para uma parcela da população cadastrada. Os que ganham algo alimentam os demais. É comum ver pessoas jovens catando e comendo restos de comida no lixo. Uma cena forte que revela a gravidade da situação.
Nessas condições, a criatividade e a solidariedade fazem a diferença. Como forma de amenizar as dificuldades, na paróquia de Carapita, todos os domingos um grupo de voluntários prepara um sopão que é servida para cerca de 400 pessoas. Os ingredientes são fornecidos pela Pastoral Social com o apoio da Caritas e doações, mas a iniciativa conta com a solidariedade de muita gente. Em tempos de crise os cristãos vivem com mais fervor o mandamento do amor, a exemplo de Eugênio Euclides Camejo, um dos coordenadores da iniciativa. “Aqui está tudo organizado. Aos sábados compramos a verdura e quando não temos lenha, eu e meu filho saímos a procura e trazemos aqui para igreja. Eu me sinto bem nesse trabalho. Temos fé que o país vai melhorar para a gente poder comer bem. Enquanto isso, nós vamos levando”, diz.
A paróquia conta com pastorais, grupos e movimentos: Pastoral da Missão, Pastoral Social, Pastoral Juvenil, Pastoral Familiar, Catequese, Legião de Maria, Movimento Luís Variara, Eu tenho Sede e Laços de Amor Mariano. Cada comunidade possui um Conselho Pastoral e um Conselho de Administração. A comunidade e os coordenadores compõem o Conselho Pastoral da Paróquia.
O coordenador da catequese, Wilmer Daniel Ramírez, fala sobre o trabalho de evangelização. “A situação social e política do país também afeta a catequese, já que muitos jovens e crianças estão migrando. O número na catequizandos que era de 250 já caiu para 120. Estamos passando por uma situação difícil. Mas nós não perdemos a esperança. Continuamos apostando no país confiando na misericórdia de Deus que tem pena de cada um de nós. Queremos voltar aos canais democráticos para reconstruir Venezuela”, afirma Wilmer.
Outro projeto ousado da paróquia de Carapita em tempos de crise é a construção do Centro Pastoral com salas para catequeses e reuniões, incluindo residência para os padres. O trabalho já começou graças à doação de material por alguns benfeitores da Venezuela. Uma vez assentadas as bases e levantadas as estruturas, a comunidade espera agora obter recursos para completar a construção ao lado da igreja paroquial. Em meio a tantas dificuldades, o que chama a atenção é o olhar de esperança em quem acredita na vida da comunidade.
Na Venezuela trabalham 13 missionários da Consolata com a Pastoral Afro, a Pastoral Indígena e nas periferias urbanas e existenciais, a Animação Missionária e Vocacional, entre outros serviços.
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Venezuela: os desafios da evangelização na periferia urbana - Instituto Humanitas Unisinos - IHU