Ecologista e anticlerical, revolta juvenil nos Urais

Ekaterinburgo. | Foto: Wikipédia

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20 Mai 2019

Ecologista, anticlerical, radical. Explode inesperadamente em Ekaterinburgo - capital dos Urais e cidade natal de Boris Yeltsin - o primeiro grande movimento juvenil russo do século XXI contra a construção de uma catedral da igreja ortodoxa em uma praça do centro da cidade.

A reportagem é de Yurii Colombo, publicada por il manifesto, 18-05-2019. A tradução é de Luisa Rabolini

A catedral de Santa Grande Caterina foi construída na fundação da cidade em 1723 e foi demolida pela administração soviética em 1930, durante uma das campanhas antirreligiosas da época. Mas, em 2010, com o apoio do prefeito de Ekaterinburgo, a Igreja ortodoxa exigiu sua reconstrução em vista do tricentenário de sua construção. Mas isso é apenas parte da história. Quem financia a operação com custo de mais de 70 milhões de dólares são Igor Altushkin (magnata do algodão) e Andrey Kozitsyn (boss do setor metalúrgico nos Urais), que desde sempre fizeram negócios com o patriarcado de Moscou. Kozitsyn já participou da restauração do mosteiro de Valaam, o mais frequentado por Vladimir Putin, e é membro de muitas fundações que administram a construção de igrejas em todo o país. Como Altushkin - 4,4 bilhões de dólares de patrimônio de acordo com a revista Forbes - que recebeu agradecimentos no ano passado por seu fervor religioso com uma alocação de 60 bilhões de rublos pela Gazprombank para abrir uma grande planta industrial metalúrgica em Celyabinsk. Uma negociação perfeita se não tivessem se intrometido os jovens de Ekaterimburgo.

A Praça Outubro, escolhida como local destinado a abrigar uma montanha de concreto de 75 metros de altura, é conhecida entre os jovens da cidade simplesmente como "Square". Exuberante e banhada por um belíssimo lago artificial, sempre foi ponto de encontro noturno dos jovens de Ekaterinburgo durante o verão.

Assim, quando os primeiros tapumes apareceram em vista do início das obras na segunda-feira, a notícia disparou pelas mídias sociais levando à noite a concentração de milhares de jovens em torno do local. "Para dar lugar à igreja, 200 árvores serão derrubadas e toda uma área verde será cimentada", explicou uma jovem entrevistada em uma televisão local no começo da noite da mobilização. E um amigo acrescentou: "Nós não somos antirreligiosos, mas no centro já existem 4-5 grandes igrejas, outra seria inútil".

Uma mobilização que continuou a crescer nas noites subsequentes, transformando-se em um verdadeiro happening e flash-mob que já ultrapassa as próprias motivações iniciais. Há música, dança, bebe-se cerveja naquele que, apesar dos apelos da polícia para evacuar (as manifestações não são autorizadas), se tornou um espaço liberado. E os tapumes são demolidos, mesmo que no dia seguinte sejam reerguidos mais altos e reforçados.

São manifestações que preocupam, e muito, Putin. Na noite de quinta-feira, depois que afagos e ameaças do prefeito não conseguiram bloquear a ocupação, o chefe do Kremlin saiu pessoalmente a campo com uma entrevista na televisão. Ele acusou "os agitadores profissionais que vieram de Moscou" e argumentou que "a solução para o problema terá que ser decidida através de uma sondagem com toda a população interessada" e não por uma "minoria vociferante": palavras que só convenceram ainda mais os jovens dos Urais de estarem no caminho certo.

Sua mobilização pacífica foi atingida por uma repressão inexplicável. Já somam agora mais de 100 prisões administrativas efetuadas pela polícia, com condenações de detenção por uma ou duas semanas ou pagamento de multas salgadíssimas. Como aquela denunciada por Marina no Facebook, de mais de 40 mil dólares. E ainda há 7 jovens que serão processados penalmente.

"É um movimento moderno" - afirma o sociólogo Boris Kagarlitsky - que lembra o Occupy em Nova York e o parque Gezi em Istambul. Sem lideres, comunicação horizontal, objetivos concretos..

E, de fato, os jovens que podem ser vistos nas transmissões ao vivo do canal televisivo Dozd são tremendamente parecidos com seus colegas "ocidentais". "Ouvem a mesma música indie-rock, usam as mesmas camisetas e os mesmos tênis e não veem um futuro luminoso à própria frente", confirma Kagarlitsky.

Em suma, um dos milhares de fios de uma luta planetária. Que esta noite será reprisada em Ekaterinburgo.

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