20 Mai 2019
Câmara toma o poder de Bolsonaro, Senado negocia mudar sistema de governo. Bolsonarismo vai às ruas.
A reportagem é de André Barrocal, publicada por CartaCapital, 19-05-2019.
Jair Bolsonaro tenta acuar o Congresso sempre que ataca o que chama de “velha política”. O texto que compartilhou na sexta-feira 17, em redes de Whatsapp, diz que sua dificuldade de governar é culpa dos parlamentares. Pois se o presidente quer dar a eles uma banana, o sentimento é recíproco.
Na Câmara, desenha-se um parlamentarismo informal, com o objetivo de tocar uma agenda de votações que até se parece com a do governo, mas sem dar bola para o presidente. No Senado, há conversas e negociações sobre a instituição formal do parlamentarismo como sistema de governo.
Tudo isso em meio à convocação por apoiadores do presidente de atos pró-Bolsonaro em 26 de maio. Convocações feitas pelas redes sociais da seguinte maneira: #OpovoVaiInvadirOCongresso e #Artigo142Já. O artigo 142 da Constituição fala sobre o papel das Forças Armadas.
Fã antigo do parlamentarismo, o senador José Serra (PSDB-SP) colhe assinaturas de colegas para propor uma mudança na Constituição. No seu plano, o sistema seria adotado oito anos após o povo aprová-lo. O referendo popular ocorreria na eleição municipal de 2020 ou na presidencial de 2022.
Ao buscar apoios, assessores de Serra foram perguntados se o tucano toparia um acordo para não mexer na exigência de referendo e de carência de oito anos. Sem o compromisso, o debate do parlamentarismo enfraqueceria Bolsonaro ainda mais, ao oferecer um caminho para tirá-lo do poder.
Entre os deputados, Bolsonaro foi colocado de lado enquanto se parte para um parlamentarismo informal. É o resultado de decisões do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e de líderes da bancada direitista fisiológica autointitulada “Centrão”, todos cansados do desdém do ex-capitão.
A materialização do parlamentarismo informal se dá em discussões a respeito das reformas tributária e previdenciária. Duas propostas de muito interesse dos empresários, cada vez mais descrentes da capacidade de Bolsonaro de governar.
No caso da tributária, os deputados botaram para andar um projeto surgido entre eles, de autoria do líder do MDB, Baleia Rossi (SP). Não quiseram esperar por algo em elaboração pelo secretário da Receita Federal, Marcos Cintra. Nem deixar para depois da previdenciária, como queria Cintra.
A proposta de Rossi simplifica tributos. Unifica três impostos federais (PIS, Cofins e IPI), o ICMS (estadual) e o ISS (municipal). E batiza de IBS, o Imposto Brasileiro sobre Serviços. A proposta colide com a preparada na Receita. Cintra não quer juntar já os impostos federais com ICMS e ISS.
O projeto será debatido em uma audiência pública na terça-feira 21, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), para votação no dia seguinte. Se a aprovação ocorrer logo, poderá ser criada uma comissão especial, e aí a proposta do governo, quando chegar, ficaria escanteada.
Vão participar da audiência pública o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores da Receita Federal (Sindifisco), Kleber Cabral, um representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal, think tank sobre tributação.
Appy foi secretário-executivo do ministério da Fazenda no primeiro governo Lula, quando a pasta era chefiada pelo petista Antonio Palocci. Ele é a cabeça por trás do projeto de Rossi. Uma proposta que conta com o apoio do presidente da Câmara.
Rodrigo Maia quase se acertou com o governo, em um acordo que ressuscitaria dois ministérios, ambos para ocupação de indicados de parlamentares. Um destes seria indicado por Maia, o ex-deputado goiano Alexandre Baldy, hoje colaborador do tucano João Doria Jr. no governo paulista.
O acordo dependia da votação da medida provisória que fechou ministérios e jogou o Coaf, órgão de vigilância de movimentação bancária suspeita, da pasta da Economia para a da Justiça, a de Sergio Moro. O ex-juiz não abre mão do Coaf, nem o PSL, o partido do presidente e dos laranjas.
Agora há impasse. Bolsonaro não sabe de que lado fica: de Maia e dos deputados, que querem tirar o Coaf de Moro? Ou do ex-juiz? Se não for votada até 3 de junho, a MP vence. Bolsonaro teria sete novos ministérios. Uma derrota imposta pelo parlamentarismo informal.
Na reforma da Previdência, o parlamentarismo informal dá as caras também. A turma que manda na Câmara – Maia e o “centrão” – quer ajudar os empresários mas não quer lidar com Bolsonaro, que não dá muita bola para o assunto, nem permitir que, sem se esforçar, o presidente colha louros.
Os deputados planejam promover uma reviravolta na proposta e tirar dela o selo “Bolsonaro”. Um acordo selado na quinta-feira 16, na casa de Maia, segundo tem dito à imprensa o presidente da comissão especial da reforma, Marcelo Ramos (PR-AM).
Em 1o de maio, o deputado Paulinho (SP), presidente licenciado do Solidariedade, havia aberto o coração a respeito dos sentimentos dos colegas. “Precisamos de uma reforma da Previdência que não garanta a reeleição do Bolsonaro”, disse. “Qualquer idiota se reelege com esse dinheiro.”
“Esse dinheiro” é 1,2 trilhão de reais, em dez anos, que o governo calcula que poupará se conseguir dificultar o acessos dos trabalhadores às aposentadorias e induzir o pagamento de benefícios de valor menor.
E Bolsonaro, diante do parlamentarismo em curso, seja ele informal ou formal, que irá fazer? Qual o tamanho da parcela da população disposta a ir às ruas em defesa do presidente? A conferir dia 26.
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Parlamentarismo formal e informal avança no Congresso - Instituto Humanitas Unisinos - IHU