28 Junho 2018
“Cheguei aos Estados Unidos com três anos: eu também uma pequena imigrante. O que eu falo, eu aprendi em minha própria pele. Desumanizar os migrantes, transformá-los em categorias abstratas, serve para fazer esquecer que por trás das estatísticas existem pessoas. Existem crianças. É isso, o que está fazendo a administração Trump."
Paola Mendoza, de 38 anos, é a artista e ativista de origem colombiana que, em janeiro 2017, foi diretora artística da Women’s March, a marcha das mulheres que no dia seguinte à posse de Donald Trump levou às ruas de Washington mais de um milhão de pessoas.
A reportagem é de Anna Lombardi, publicada por La Repubblica, 26-06-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
"Justamente para inverter aquela tentativa de desumanização, quando iniciaram as divisões das famílias que atravessaram a fronteira, com a fotógrafa Kisha Bari e a produtora Becky Morrison reunimos um exército de crianças - incluindo alguns filhos de imigrantes ilegais cujos pais correm o risco de deportação - e os fotografamos sob a sede do ICE em Manhattan, o prédio da polícia especial que lida com a imigração, carregando cartazes que expressam um conceito muito simples: I am a child. Eu sou uma criança".
As fotos logo viralizaram, nos Estados Unidos mais divididos do que nunca, metade do país dilacerado pelo som de lágrimas de pequenos migrantes arrancados dos pais. Mendoza conta isso ao jornal Repubblica no aeroporto JFK, antes de embarcar em um voo para o Texas para chegar a Tornillo, a cidade onde surgiu uma espécie de acampamento que abriga as crianças, e que se tornou o epicentro do protesto. "Fomos inspiradas pelas lições de Martin Luther King, que justamente 50 anos atrás fez marchar os garis negros de Memphis, em greve para denunciar as condições desumanas em que trabalhavam, com uma faixa trazendo uma mensagem instantânea: I am a man, eu sou um homem.
Eu mereço respeito. Pouco depois daquela marcha, o Reverendo King foi morto: e as imagens capturadas pela lente de Ernst Withers são agora ícones da história norte-americana”.
E aqui Mendoza se exalta.
"Infelizmente, a humanidade das pessoas deveria ser um conceito estabelecido. Em vez disso, durante seus comícios, Trump chama os latinos de estupradores, animais. Omitindo que essas pessoas muitas vezes fogem de violências inauditas: aquelas das gangues e narcotraficantes que em alguns países são uma espécie de estado paralelo. Meio século depois de Martin Luther King somos obrigados a reiterar que estamos falando de pessoas. De crianças e de suas famílias. E que as crianças têm direitos reconhecidos pelas leis internacionais".
Enquanto isso, dos 2.600 pequenos migrantes que nas últimas semanas foram separados de suas famílias, apenas 522 foram reunidos com seus pais. Os outros permanecem sob custódia daquele Office of Refugee Ressetlement, agora em colapso porque as suas estruturas (quem diz isso são as fontes oficiais) já estão lotadas em 95% por 12 mil menores que chegam desacompanhados nos EUA. Não importa se ontem a Casa Branca finalmente apresentou o tão aguardado plano que deveria esclarecer o destino das crianças ainda enredadas nas malhas da "tolerância zero" pretendida por Trump: antes de adicionar confusão à confusão, decidindo, na quarta-feira passada, que os pais e as crianças não deviam mais ser separados.
Criando o novo problema de onde colocá-los juntos. Um plano que chegou em meio de um dia já tumultuado, com The Donald mais interessado em discutir etiqueta que o destino das 2053 crianças no limbo: o presidente furioso no Twitter pelos protestos nos restaurantes que já obrigaram três de seus mais próximos colaboradores a deixar os locais em Washington onde estavam jantando.
Sem o mínimo respeito por aquelas infelizes crianças cuja situação, por enquanto, simplesmente não muda.
De acordo com as novas regras, de fato, elas continuarão a esperar para se reencontrarem com seus pais nos centros que já as hospedam. Se a mãe ou o pai forem soltos, poderão se responsabilizar pelos filhos, pedindo sua libertação e reunificação nos Estados Unidos. Mas se os pais forem condenados à deportação - como é provável na maioria dos casos, uma vez que as novas regras não reconhecem mais o direito de asilo para aqueles que em sua pátria são perseguidos por gangues ou traficantes de drogas - a reunião só acontecerá no momento da partida.
"A nossa campanha serve para dizer que tudo isso é inadmissível.
As crianças são crianças, independentemente de onde nasceram. Por isso, levaremos as fotos de I am a child para a grande manifestação prevista em Washington no dia 30 de junho. Esperando que outros espalhem essa mensagem que é universal.
Porque o que testemunhamos nos Estados Unidos, o que essas crianças sofrem, está acontecendo em outras partes do mundo. I am a child mira ao coração das pessoas: quem virar do outro lado na frente de uma mensagem tão simples terá que viver com a consciência de sua própria indiferença. Não poderá mais se esconder atrás de estatísticas. O coração não tem cor política.
Ele só conhece a empatia, o compartilhamento, da alegria ou da dor. Ou, só e sempre, a aridez".
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O desafio das crianças para Trump 50 anos depois de Martin Luther King - Instituto Humanitas Unisinos - IHU