19 Outubro 2017
Mineração: Qual o preço do nosso futuro? Sob o tema, ocorreu entre os dias 9 e 11 de novembro, no Centro de Pastoral da Diocese de Cruzeiro do Sul, no Acre, um seminário para tratar do tema da mineração na região do Vale do Juruá. O objetivo do encontro estabeleceu-se na troca de informações, formação e narrativas de resistência. Participaram representantes dos povos Nawa, Nukini, Jaminawa Arara, Shawãdawa, Noke Kui, Puyanawa, Ashaninka, Marubo, Huni Kui, ribeirinhos, assim como representantes do Movimento Nacional de Luta por Moradia, entre outras organizações que assinaram a carta final (leia abaixo na íntegra).
A reportagem é de Lindomar Padilha, publicada por CIMI, 17-10-2017.
O seminário foi um importante marco para que os povos indígenas possam se organizar contra a destruição de seus territórios de vida pelo projeto de morte da mineração. Representativo, promoveu um diálogo plural sobre impactos na vida não apenas dos indígenas, mas dos ribeirinhos e população como um todo. Lamentável, porém, foi a tentativa de algumas pessoas ligadas à Comissão Pró-Índio (CPI) do Acre de tumultuar o seminário, em defesa e na venda de negócios com carbono - temáticas que não estavam em tela num encontro que tratou de uma das mais severas agressões sofridas pelos povos indígenas historicamente, a mineração.
Desrespeitosamente integrantes da CPI/AC, baseados em ofensas gratuitas ao Conselho Indigenista Missionário (Cimi), extrapolaram os limites da natural divergência de opiniões e partiram para agressões verbais contra integrantes do Cimi, sobretudo envolvendo a coordenadora regional da entidade, Rose Padilha. Tampouco estas pessoas tiveram a educação de reconhecer o não cerceamento da palavra, a eles garantida, em respeito à pluralidade de opinião, posto que o encontro era sobre mineração, não REDD. Numa conjuntura delicada vivenciada pelos povos, onde a unidade é essencial para a manutenção de direitos fundamentais, a postura dessas pessoas alimentou ainda a divergência fratricida, e não a construtiva, entre os indígenas.
O Cimi e nenhum de seus integrantes, bem como os próprios povos indígenas e demais participantes do seminário, podem ser submetidos a violências por parte de integrantes da CPI/AC porque não concordam com negócios de carbono, onde a natureza, os povos e comunidades são submetidos à servidão ao Capital em suas próprias terras - nos estranha defensores dos povos indígenas apoiarem algo absolutamente colonial. Tais violências, porém, são vistas na ação de mineradoras e demais grupos que enxergam nas críticas a suas ideias e ações ameaças a possibilidades de bons lucros e dividendos.
Tamanho autoritarismo e virulência, marcas indeléveis dos tempos obscuros em que vivemos, tem sido alvo de denúncias internacionais. Quanto a isso, cabe ressaltar que em agosto diversas entidades, organizações e lideranças do mundo inteiro assinaram uma moção demonstrando que sim, há pessoas e instituições que visam algo bom para todos todas e não só recursos financeiros. Além disso, ressaltaram que estas pessoas, lideranças indígenas e organizações que se opõem a mecanismos como o do REDD estão sendo vítimas de perseguição e mentiras:
"Mais de 80 organizações e indivíduos do mundo inteiro mandaram a carta abaixo para autoridades no Brasil, Alemanha e Califórnia/EUA, repudiando “toda e qualquer tentativa de intimidar ou censurar as pessoas e organizações que criticam e se opõem às políticas ambientais e climáticas que vêm sendo implementadas pelo governo do Acre”. E seguem: "Essas tentativas se intensificaram depois da realização em Xapuri no Acre do Encontro “Os efeitos das políticas ambientais/climáticas para as populações tradicionais”.
Na Declaração de Xapuri, os participantes do referido Encontro denunciaram os acordos negociados pelo governo do Acre com outros países. O principal exemplo é o acordo com o banco alemão KFW que já repassou 25 milhões de euros para o governo do Acre, sem transparência na aplicação destes recursos ou prestação de contas às comunidades que dependem da floresta e para toda a sociedade.
Importante ressaltar que a postura de integrantes da CPI/AC revela o que está em jogo quanto ao REDD. Da mesma forma ocorre com a mineração e a ação virulenta de seus defensores no Acre ou em Brasília e, poderíamos dizer também, com grandes empreendimentos que geram vítimas de um desenvolvimento que segue a beneficiar poucos em detrimento de muitos.
Nós, participantes do Seminário “Mineração: Qual o preço do nosso futuro?”, ocorrido entre os dias 09 e 11 de outubro de 2017, no Centro Diocesano de Treinamento no município de Cruzeiro do Sul, que contou com a presença de lideranças e representações indígenas dos povos Nawa, Nukini, Jaminawa Arara; Shawãdawa; Noke kui; Puyanawa; Ashaninka; Marubo; Huni kui; dos ribeirinhos, assim como representantes do Movimento Nacional de Luta por Moradia, CIMI, CPT, Assessoria Jurídica da Diocese de Cruzeiro do Sul, FUNAI, estudantes da Licenciatura Indígena, Licenciatura em Ciências Biológicas e Licenciatura em Letras/Inglês da UFAC, do curso Técnico em Meio Ambiente do IFAC, professores e pesquisadores de ambas instituições de ensino (IFAC/UFAC).
Vimos a público defender a importância das florestas para a manutenção dos modos de vida tradicionais e do ponto de vista ambiental. Pretendemos destacar que a mineração desmata e destrói paisagens naturais; ocasionando perdas de grandes áreas de ecossistemas e de áreas de uso humano. Trata-se de uma atividade que traz riscos: como o rompimento das barragens de contenção de rejeito. Ademais, desencadeia processos erosivos, resultando no assoreamento dos rios e igarapés.
Tal atividade demanda alto consumo de água e resulta na contaminação dos mananciais por substâncias causadoras de problemas de saúde: como alta incidência de câncer e de anomalias no nascimento. Deve-se salientar ainda a progressiva redução da qualidade da água, dos solos e do ar e seus efeitos danosos à saúde pública. Adicionalmente, a soberania alimentar também ficará comprometida em função da contaminação irreversível de peixes, bem como dos solos e dos alimentos neles produzidos.
Como muitos sabem, a cidade de Cruzeiro do Sul ainda não possui infraestrutura suficiente (moradia, saneamento básico, saúde, educação, transporte e segurança) para a população atual e certamente entraria em colapso se recebesse uma quantidade expressiva de novos habitantes. A promessa de novos empregos acarretará em problemas sociais decorrentes do aumento desordenado da população, como prostituição, alcoolismo, drogadição e violência urbana e rural.
Desta maneira os ganhos econômicos, que em geral ficam nas mãos de poucos, não compensam as perdas sociais e ambientais da atividade de mineração.
Ressaltamos a ausência das instituições governamentais convidadas: IMAC, Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Câmara de Vereadores de Cruzeiro do Sul, Câmara de Vereadores de Mâncio Lima, Prefeitura Municipal de Cruzeiro do Sul e Prefeitura Municipal de Mâncio Lima. Reiteramos a necessidade destas instituições tomarem parte do debate e do processo de construção de alternativas para a região.
Nossa floresta e nosso futuro não têm preço. Têm valor!
NÃO À MINERAÇÃO NO VALE DO JURUÁ!
Cruzeiro do Sul (AC), 11 de outubro de 2017
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Mineração: qual o preço do nosso futuro? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU