16 Outubro 2017
E quem disse que é só a direita que precisa ser criticada? Parte da esquerda assusta. Dá medo imaginá-la com plenos poderes.
Já há sinais de que essa esquerda inescrupulosa sairá brutalmente das tocas em 2018. Ou os militantes que estão em partidos com cauda à esquerda, mas bastante adaptados ao sistema. Com métodos pouco dignos de demonizar adversários, desde que o objetivo seja proteger tal guru, tal membro do partido, tal candidatura. Como ocorreu em 2014.
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Escrevo isto por causa de um post sobre o padre Julio Lancelotti. Era uma cobrança (bastante nada a ver) de um colega, como se a imagem de Nossa Senhora de Aparecida estampada no vidro de ração do João Dória devesse inspirar alguma manifestação instantânea do religioso, defensor do povo de rua. Até aí, uma grande bobagem. Fiscalização da agenda do padre. Problema maior foi o que veio a seguir.
Um dos comentaristas chamou o padre de "filho da puta", outro invocou uma acusação sórdida (e falsa) contra ele, uma das figuras mais dignas - e incansáveis e coerentes - desta Pauliceia. Quem já viu como Lancelotti é respeitado pelo povo de rua fica indignado com tanta leviandade. Nem o padre Julio está a salvo dos que atacam (à esquerda, insisto) da cintura para baixo.
E com qual motivação, no caso? Proteger o ex-prefeito "tranquilão". Como se tivesse sido o padre o responsável por Haddad não ter ido nem para o segundo turno. E como se a cobrança feita por Lancelotti em relação à retirada de cobertores dos moradores de rua, pela GCM, durante a gestão petista, tivesse sido um fator determinante na vitória de Doria no primeiro turno.
O curioso é que se acusa o padre - e qualquer um que faça críticas saudáveis aos governos que se autointitulam progressistas, críticas ao poder público - de ter feito o "jogo da direita". Ora, fazer o jogo da direita é jogar como ela, sem respeito a nada, nenhuma biografia. (Minto. Parte da direita não faz isso, simplesmente não faz. Uma fração da direita e boa parte dos alienados é melhor que a esquerda inescrupulosa.)
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Tem também a esquerda "a culpa é do Gregório Duvivier". Não importa o que esse rapaz diga - ele será culpado de antemão. Ou seja, a gente sempre lamenta que celebridades não sejam politizadas, que não tomem posição. Aí, quando aparece uma que se coloca, como no caso do humorista, surgem os "fiscalizadores de Duvivier". Tudo porque ele ousou não pensar exatamente-como-todos-pensamos. O que, obviamente, é impossível.
(Nesse caso eu vi alguém defini-lo como "estrume" por ter dito que se posiciona contra ditaduras de direita ou de esquerda. O que é exatamente a minha posição - e a do Ernesto Sabato, por exemplo. E por ter criticado Lula - para alguns, algo fora do espectro possível - sobre apostas que ele teria feito em produtos como carne e carro. Dá para discordar? Lógico. Ele se torna um "estrume" por isso? Claro que não.)
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Em 2014 um dos principais alvos dessa esquerda justiceira foi a candidata Marina Silva. A mesma esquerda que invoca causas identitárias foi machista, racista e raivosa contra ela, como se a discordância em relação a seus projetos devesse significar uma destruição da mulher. E ninguém - jamais - fez mea culpa em relação a isso. Essa movimentação fez Aécio ir para o segundo turno. E o resto do filme a gente está vendo.
Tudo indica que em 2018 veremos mais do mesmo. Muita distração em relação a atores importantes da direita, a setores inteiros do empresariado, do rentismo e mesmo da bandidagem de gravatas, e muitíssima atenção - raivosa - em relação a quem, na visão stalinista dessas pessoas, ousar discordar do projeto tal, da personalidade Y. Ou mencionar a corrupção de esquerda. Ou... qualquer coisa.
Capitalistas, patrões, líderes de grupo de extermínio (na cidade e no campo), exploradores de trabalho escravo, mineradores, especuladores (especuladores de países inteiros), fascistas de todo o Brasil agradecem de coração. Pois o importante, para essas pessoas, é emplacar o próprio projeto de poder - mesmo que a cauda à esquerda esteja cada vez mais distante de seu ponto de partida.
Enquanto a direita gargalha.
Danilo Gentili pediu, e a Folha concedeu, a cabeça do repórter Diego Bargas, encarregado de fazer uma reportagem crítica sobre seu filme irrelevante e infame. "São tempos sombrios", resume o jornalista, desconcertado com a decisão do jornal.
Gentili é o mesmo que ofereceu vodka para uma adolescente de 15 anos (sem que ela soubesse), apresentadora de televisão que vem tendo sistematicamente seus direitos violados por sujeitos de idades diversas, do dono do SBT a apresentadores sem escrúpulos.
O humorista do SBT teve o auxílio de seus milhões de seguidores no Twitter e do MBL. Conseguiu classificar o cara de petista (nem é, mas eles agem de modo macarthista, como se isso fosse um pecado original) e divulgar sua joça a partir de um vilão conveniente.
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Vamos recapitular: um profissional do jornalismo foi demitido por fazer perguntas. Nos tempos do CQC, programa que promoveu Gentili e intimidava entrevistados em Brasília (coisa que Bargas não fez), fazer perguntas era apresentado como um direito sagrado.
Como diz o jornalista, estamos todos em risco. Esses fascistas movem-se em bandos e não sossegarão até que seja vertido o sangue do próximo "vilão". Qualquer um que ouse desafiar - a rigor, apenas questionar - esse tipo de entretenimento mentecapto e oportunista.
Insisto e insistirei: estamos rodeados de covardes. Entre covardes ativos e passivos, assistimos ao fascismo avançar fazendo de conta que seus efeitos não vão nos atingir, não vão atingir nossos filhos, o conjunto da sociedade.
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Sabemos que o moralismo dessa gente é de fachada. O cantor Roger, do Ultraje, saiu em defesa do fornecimento de vodka fazendo uma comparação sexual abominável (já que se trata de uma adolescente), que incluía a palavra "rola". Para eles, vale-tudo.
Evidente que Gentili, em si, comemora repercussões quaisquer. Ocorre que o caldo transbordou. Não podemos mais ignorá-lo. Ele já tem esse poder midiático, já tem os milhões de seguidores. E, de olho nessas multidões, a Folha preferiu degolar seu profissional.
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Otávio Frias Filho vende jornais como venderia amendoins ou barbatanas de tubarão. Mas ele já posou de democrata em outros tempos. Participou das Diretas, Já, nos anos 80, e fez texto escandalizado, durante o governo Collor, sobre uma visita da PF ao jornal.
Agora dá as mãos para o apresentador grandalhão e suas piadinhas escrotinhas. Esse humor a serviço do poder - esse humor covarde - ganha aliados diversos, do dono da Folha a cada um que silencie diante da truculência embutida nessa comédia de horrores.
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