22 Setembro 2017
"Parece que esta perspectiva de ação, semelhante à conhecida expressão em administração “apagar incêndio”, inspira algumas empresas que pretendem ter RSC como estratégia competitiva e não como orientação gerencial" escreve Roberto Naime, doutor em Geologia Ambiental e integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale, em artigo publicado por EcoDebate, 12-09-2017.
Esta é a terceira parte de um artigo em quatro.
Cruz, (2013) assinala que a primeira teoria que compõe o que hoje se caracteriza como Responsabilidade Social Corporativa é apresentada com um viés do retorno que algumas práticas podem gerar a uma determinada empresa. Entretanto, esta teoria não tem como objetivo a busca pela rentabilidade econômica das atividades estruturadas.
Embora semelhante no que diz respeito às ações, a principal diferença para a Teoria dos Acionistas é que os princípios da ação socialmente responsável são construídos a partir de uma orientação organizacional que considera políticas, programas e resultados tangíveis na relação com a sociedade (Barbosa, 2010).
Esta teoria genérica, assinala que o Desempenho Social Corporativo é construído com base na legitimidade do negócio perante a sociedade e a responsabilidade da empresa com a sociedade, na Responsabilidade da empresa, quando gera resposta aos interesses a um ator interno ou externo e nos Resultados do Comportamento Corporativo que são apropriações que analisam o impacto sociais da ação da empresa. Em conjunto com a Teoria dos “Stakeholders” ou “partes interessadas”, esta primeira teoria fornece a base teórica para o que hoje se concebe sobre RSC.
A teoria dos acionistas, diferentemente das demais, tem como foco o acionista. Embora o foco fosse aumentar a lucratividade dos acionistas, isso aconteceria por meio de ações socialmente corretas. Assim, a Teoria do Valor ao Acionista é definida por Melé (2008) como um conjunto de ações sociais de um negócio que busca incrementar os lucros de uma empresa para os acionistas, além de aumentar o seu valor de mercado.
Para esta corrente teórica, a partir do momento que ações com foco social são planejadas e implementadas, pode-se gerar valor ao acionista. Para isso, é necessário destacar que o executivo é diretamente responsável pelos seus colaboradores e também por atender aos interesses dos proprietários ou acionistas. Entretanto, não se pode afirmar que sempre a implementação de práticas sociais resultará em benefícios aos acionistas.
Para Melé (2008), a partir de uma análise crítica, a Teoria do Valor ao Acionista fica mais clara quando se analisa, na perspectiva das possíveis perdas econômicas, que impactos sociais negativos podem causar a uma empresa. Um clima organizacional inadequado, problemas relacionados à qualidade de vida no trabalho ou situações internas que resultam em problemas sociais externos podem gerar perdas para a empresa.
O desempenho econômico pode ser afetado por questões sociais, e os gestores passam a se preocupar com estas questões. Numa análise mais crítica, bem mais parece uma estratégia de apagar incêndio.
O termo “stakeholder” ou “parte interessada” não tem tradução literal e foi popularizado pelas normas técnicas internacionais de padronização. Entretanto, entende-se o termo como um ator de uma organização ou um conjunto de pessoas físicas, que mantém diretamente ou indiretamente uma relação com uma empresa.
Este termo foi usado pela primeira vez em 1963 em uma reunião de departamento do Stanford Research Institute (Melé, 2008). De acordo Donalson e Preston (1995, p.81), o termo “stakeholder” tem como objetivo evidenciar as relações existentes entre a empresa e outros atores. Neste contexto, o sucesso da empresa dependerá de como o gerenciamento dos interesses destes “stakeholders” será conduzido e como isso poderá afetar a organização.
A empresa gerencia os interesses individuais de seus atores buscando encontrar uma situação ótima em que todos sejam beneficiados. Assim, o sucesso de uma firma pode depender que como se gerencia os interesses de um “stakeholder”.
Cruz (2013) apresenta alguns “stakeholders” que podem ser considerados no contexto brasileiro, tais como funcionários, acionistas, fornecedores, sociedade e meio ambiente, governo municipal, estadual e federal, ONGs, comunidades vizinhas a uma empresa, parceiros estratégicos, milícias e organizações ilegais, associações de bairro, escolas e grupos religiosos.
Que se entende por governança. Não é pretensão cristalizar uma conceituação completa e inquestionável, até mesmo porque esta situação não existiria.
Governança transcende a assistencialismo social. Conceito transposto da área empresarial, e evoluído do incremento da responsabilidade social corporativa, significa mediar de forma sistêmica, os interesses envolvidos de todas as partes interessadas, buscando a máxima satisfação possível com a conciliação das demandas emergentes.
Mediar e compatibilizar interesses legítimos e que transcendem caráter pessoal ou financista. E que ampliem a conceituação de preservação de meros interesses em empreendimentos, procurando satisfazer as demandas de todo o conjunto de agentes atingidos.
Conforme aponta Melé (2008), é sensato pensar que alguns interesses de alguns “stakeholders” são mais importantes do que os interesses de outros. Por isso, é uma habilidade gerenciar tais interesses. Uma das grandes vantagens desta teoria é que ela não separa a Ética dos Negócios pois não é uma teoria de ética desconectada de gestão (Ashley, 2005).
Uma vez que a empresa entende os interesses das partes, ela age de acordo com os princípios éticos, pois respeita todas as partes entendida como sociedade, meio ambiente e colaboradores.
A última corrente teórica sobre Responsabilidade Social Corporativa está relacionada à Filantropia. Entende-se aqui que a empresa se engaja em atividades sociais internas ou externas. De acordo com Birch (2001) apud Melé (2008, p. 69), é necessário não confundir cidadania corporativa com Responsabilidade Social Corporativa.
Esta última está preocupada com as responsabilidades sociais da empresa e o relacionamento externo, sendo que a cidadania corporativa entende a empresa como uma parte da sociedade, e, portanto, deve estar envolvida em atividades sociais.
A empresa atua no desenvolvimento educacional de um grupo ou envolve questões relacionadas à saúde e proteção ao meio ambiente. Em outras palavras, Cidadania Corporativa pode ser conceituada a partir da ação da empresa em gerar contribuições para a sociedade através de atividades que estejam associadas ao seu “core” business, seus investimentos sociais e programas filantrópicos (Melé, 2008, p. 70).
De acordo com os autores que contribuem para a construção desta corrente teórica, uma empresa que atua na perspectiva da Cidadania Corporativa não pode se preocupar somente em atender às questões mínimas da legislação social ou ambiental.
Para Gardberg & Fombrun (2006), uma empresa que atua na perspectiva da Cidadania Corporativa vai além das obrigações mínimas, como, por exemplo, o voluntarismo corporativo, as contribuições caridosas, os programas ambientais, educacionais e profissionais.
Ou seja, para as empresas chegarem neste estágio de envolvimento com a sociedade, elas devem atender anteriormente os desejos de todos os “stakeholders” envolvidos. Por exemplo, não se pode pensar em ajudar uma comunidade carente e contratar na cadeia de suprimentos um fornecedor com trabalho escravo.
Parece que esta perspectiva de ação, semelhante à conhecida expressão em administração “apagar incêndio”, inspira algumas empresas que pretendem ter RSC como estratégia competitiva e não como orientação gerencial.
Ocorre enfatizar que nada é contra a livre-iniciativa. Que sem dúvida sempre foi e parece que sempre será o sistema que melhor recepciona a liberdade e a democracia. Mas uma nova autopoise sistêmica para o arranjo social, é urgente.
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Atitude de consumo como gesto engajado, Parte 3/4 - Instituto Humanitas Unisinos - IHU