13 Setembro 2017
"como um muçulmano homem muçulmano levou seus pais por quase 100 km para escapar dos esquadrões da morte da birmânia." c j welerman
Ainda sobre o encerramento da exposição em Porto Alegre. Essa ação de protesto não foi obra de ativistas de direita, mas de pessoas comuns - ou melhor dizendo, o protesto foi convocado por ativistas, mas quem aderiu foram pessoas comuns. Quem mandou as mensagens para o Santander foi gente que nunca foi socializada nas artes e para quem, passados 150 anos, o modernismo ainda não chegou. Por um lado, estamos todos chocados com a difusão de expressões como "arte degenerada" que lembram demais a campanha anti-modernista do nazismo para o paralelo não ser levantado. Mas há um outro ponto a ser considerado: o fato da militância de direita que ainda é razoavelmente pequena ter conseguido fazer tamanho estrago. Isso mostra que ela estabeleceu conexões duradouras com as pessoas comuns, conexões que foram forjadas no movimento anticorrupção. Essa capacidade de mobilizar a opinião pública da gente comum, "não esclarecida" é um ganho que vai fazer ainda muita diferença enquanto a esquerda não abandonar o jargão e voltar a falar com a maior parte das pessoas.
"OS ÍNDIOS ISOLADOS FORAM MASSACRADOS! QUEREMOS DIVULGAR A NOSSA SITUAÇÃO NAS REDES SOCIAIS E NA MÍDIA. POR FAVOR, DIVULGUEM ESSE MEU DEPOIMENTO.”
De Paulo Marubo, coordenador-geral da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) em relato por telefone ao jornalista Felipe Milanez:
“Para o movimento indígena, não há dúvidas de que o massacre contra os ‘flecheiros’ ocorreu. Nós, indígenas, sempre fizemos esse tipo de alerta de violência contra os isolados para o Estado: que invasores irão matar os parentes isolados. Fizemos alertas para o governo tomar providências diante da situação que a gente vê, com relação aos invasores na terra indígena. A Funai nunca se manifestou sobre nossas denúncias, e nós sempre colocamos a gravidade disso. Começamos a pressionar o governo em 2014, mas, na verdade, o movimento indígena já vinha fazendo cartas alertando o Estado da gravidade que essas invasões poderiam provocar contra os parentes isolados: olha, vai acontecer um massacre.
Em fevereiro de 2015, teve uma troca de tiros na região. Isso foi na base do rio Ituí, bem na frente de proteção. Isso é muito grave. Sempre enfrentamos esses tipos de invasores, caçadores, pescadores aqui na região. E a situação piorou. Na parte da região sul da Terra Indígena [Vale do Javari, no extremo oeste do Amazonas], há outros invasores, como fazendeiros que já estão passando dos limites da demarcação da terra indígena. Mas a nossa região é muito grande, e a Funai diz que não consegue fazer a fiscalização, nem atender essa demanda do movimento indígena de fazer a proteção das áreas dos índios isolados.
As invasões estão acontecendo à vontade, sem que o governo tome qualquer providência. O governo não está nem aí, essa é a verdade. A gente faz as denuncias, mas o movimento indígena não tem recursos financeiros para fazer o trabalho do que é do Estado. Não temos recurso financeiros para tomar a frente do Estado na proteção de nosso território: dependemos de ajuda do governo.
Hoje, há invasores por toda a terra indígena do Vale do Javari. Eles estão por todos os lados: pelo rio Javari, vindos do Acre, pelo rio Jurá e até pelo Peru, onde nossas terras indígenas fazem fronteira. E, por estes pontos de invasões que eu estou citando, há os parentes indígenas isolados. Por exemplo, no rio Jutaí, tem os parentes isolados que já se movimentaram de uma outra área: os invasores expulsaram eles até para fora do limite da terra indígena!
Os isolados estão tentando fugir por causa dos conflitos provocados por estes invasores, que estão acontecendo com cada vez mais frequência por aqui. Estão fugindo por todos os lados.
Esse Massacre dos Flecheiros, que foram mortos pelos garimpeiros que entraram na região ocupada pelos isolados, nós soubemos por relatos de nossos parentes indígenas. E o Estado diz que não está acontecendo. A Funai diz que não tem prova. Falam que as aldeias continuam na região.
Para a Funai não teve conflito. Mas as informações que chegam dos parentes é que os isolados foram massacrados. Tem a visão indígena e a visão do Estado. O Estado não vai dizer o que está acontecendo. Para o Estado, está bom, tudo bem. Mas teve massacre.
Nós lançamos uma nota pública na XI Assembleia Geral da Coiab, no Pará, no final de agosto. A UNIJAVA encaminhou uma denúncia ao Ministério Público Federal sobre o massacre. Foi a partir daí que o MPF pressionou o Estado para tomar providências, para fazer as operações. O Exército com outros órgãos que estão fazendo operação na região contra os garimpos.
Nós sempre sofremos aqui. A base de fiscalização do rio Quixito está sucateada. Portanto, o rio está descoberto para a entrada de mais invasores. Nossos parentes falam que há pescadores entrando direto.
No próprio município de Atalaia do Norte, a gente vê no mercado carnes de caça, de quelônios, tracajá, tartaruga. São tiradas da terra indígena para abastecer o município. A gente encontra essas carnes de caças ilegais, de caçadas ilegais feitas dentro da terra indígena, que estão a venda no mercado. Nosso território está descoberto, sem vigilância. E a Funai alega que não tem recursos. E fica por isso mesmo.
Além disso, tem o narcotráfico direto na nossa região. A gente não sabe o que fazer. Por mais que a gente faça denúncias, parece que elas não valem para nada. Ninguém faz nada. Como os isolados não sabem se defender no mundo brancos, a gente está aqui, pelo movimento indígena, para defender eles.
Volto a dizer: o Estado só diz que não tem recursos, não tem recurso humano para atender a demanda de proteção do Javari, e isso nos deixa muito preocupados, pois ninguém sabe o que vai acontecer daqui para diante.
Para preservar o meio ambiente, uma reserva, não tem recurso. Mas para os garimpeiros, para as mineradoras, o agronegócio, sempre tem recurso. Para deputado tem recurso. Mas para as pessoas que precisam de fato, alegam que não tem recurso.
O Vale do Javari concentra a maior quantidade de índios isolados do mundo todo. Em toda parte da terra indígena tem parentes isolados, e eles estão aparecendo por todos os lados cada vez mais. Na Aldeia Marunawa, do meu povo Marubo, uma aldeia que fica bem no centro da terra indígena, agora estão aparecendo os isolados. Mas antes, a gente nunca tinha visto isolados lá. Eles estão aparecendo por causa dos invasores que estão invadindo por todos os lados, a terra indígena.
A gente não sabe mais para onde mandar denúncia da tragédia que está acontecendo no Vale do Javari. A gente está pedindo apoio de todas as pessoas que querem ajudar os povos indígenas: para encaminhar nossa situação e divulgar para que todo o mundo saiba a situação real de desespero no Vale do Javari.
QUEREMOS DIVULGAR A NOSSA SITUAÇÃO. DIVULGAR NAS REDES SOCIAIS E NA MÍDIA. POR FAVOR, DIVULGUEM ESSE MEU DEPOIMENTO.
O Estado brasileiro não acredita em nós, indígenas. Nós não fazemos um relatório técnico como os brancos: mas fazemos cartas, que, para nós, do movimento indígena, é o relatório dos índios. O que nos queremos agora é uma resposta do governo sobre a situação das invasões e das mortes dos isolados.
Nunca levam em consideração as nossas denúncias. Mas nós queremos respostas.
Semana retrasada, na área ocupada pelos parentes isolados Korubo, os indígenas Marubo, do meu povo, encontraram um grupo de pescadores na praia, na beira do rio, dentro da terra indígena. Tiraram até foto desses invasores.
É uma área de perigo e de muito risco, pois é uma área dos Korubo, não é permitida nem para nós: todas as semanas os Korubo passam ali. Isso é bem na região aonde os pescadores foram encontrados. Ninguém fez nada sobre a nossa denúncia.
Os pescadores estão lá na área dos Korubo isolados. E se algum pescador nessas últimas semanas atirou em algum Korubo e a gente não ficou sabendo?
Mas os isolados não morrem só de tiro, também de doenças. E se deixaram lá alguma roupa contaminada por gripe? Eles vivem num mundo diferente, não tem anticorpos, e podem pegar algumas doenças e morrerem rápido.
Se a gente diz isso para a Funai, a Funai quer um relatório técnico. Mas nós vamos falar por meio de nossas notas e nossas cartas.
POR ISSO, PEÇO: AJUDEM A DIVULGAR A SITUAÇÃO TRÁGICA QUE ESTAMOS VIVENDO NO VALE DO JAVARI" [Veja a notícia Aqui]
SERVIÇO DE UTILIDADE PÚBLICA
Conta-se que, em 1940, um oficial nazista, diante de uma fotografia de "Guernica", perguntou a Picasso:
– Foi você quem fez isso?
O pintor respondeu:
– Não, foram vocês.
Exposição - Eis aqui o que registrei na página do Santander Cultural, redigido de modo mais amplo:
Não se deixem afetar pelos marionetes do lixo fascista ou por "liberais" de araque que mostram sua verdadeira face quando algo questiona o estatuído, pois não cultivam senão culto a Mammon e ao dinheiro - naturalmente sob a fachada hipócrita de uma "moralidade" que não se escandaliza com a injustiça ou a obscenidade da miséria e da violência ou a destruição do ambiente. Só se escandalizam com coisas que podem lhes render dividendos midiáticos, como no presente episódio. E a massa de manobra, que segue seus líderes, de modo geral nem ao menos sabe do que está falando ou o que estão reivindicando. Como o assunto foi parar no New York Times, parecem ter conseguido seu objetivo, ainda que de forma inversa, fazendo, mais uma vez, testemunho do primitivismo, da incultura e da sociedade rudimentar na qual vivemos - em outras palavras, a vergonha recorrente na qual o Brasil está envolto nos últimos tempos.O ridículo não tem fim.
Passo os olhos na biografia de Ana Patricia Botín-Sanz de Sautuola O'Shea, a presidente do Santander, eleita pela família para suceder o pai, Emílio Botín, morto em 2014, no controle do banco espanhol. (Nacionalismo zero. O banco tem seu principal acionista na Holanda por motivos fiscais. O Santander também teve de pagar uma multa de 1 Neymar por ter mantido conta ilegal na Suíça desde 1937.)
Ana Patricia Botín trabalhou no JP Morgan e na Coca-Cola. É a 99ª mulher mais poderosa do mundo, segundo a Forbes.
Fiquei pensando nisso. "Quem é você?" "Bom, eu sou a nonagésima nona mulher mais poderosa do mundo". Por quê? "Porque eu sou banqueira". (Silêncio do interlocutor.) "Mas eu sou uma boa pessoa, tá? Até promovo umas atividades culturais por aí, incentivo a diversidade..."
(Claro que estou me referindo à exposição do Santander sobre diversidade, em Porto Alegre, a Queermuseu, cancelada um mês antes do prazo previsto depois que alguns defensores da heterossexualidade e dos bons costumes es-can-da-li-za-ram-se com uns pares de peitos, cenas de sexo e outras cenas tidas por eles como abomináveis, por "promoverem a pedofilia e a pornografia".)
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O primeiro-cavalheiro do Santander chama-se Guillermo Morenés Mariátegui, marquês de Borghetto. E não é que sua família andaluz é uma grande proprietária de terras? Não somente ela. Os próprios Botín possuem quase 8 mil hectares (vejo em outro canto 80 mil, mas me parece muito para o padrão espanhol) na região de Toledo. Leio no El Mundo que a fazenda abrange três povoados.
Encontra-se ali o maior aeroporto privado do país. Emilio Botin Sanz de Sautuola y Garcia de los Rios frequentava muito o local por ser um aficionado da caça - um prazer compartilhado por outros nobres espanhóis, entre eles Don Juan Carlos, o rei Juan Carlos Alfonso Víctor María de Borbón y Borbón-Dos Sicilias.
(Nem tudo no universo financeiro é virtual...)
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Em meio às nossas indignações pontuais deveríamos sempre pensar na dolce vita dos agiotas legalizados. Como eles se cansam, como torram o butim? Esse texto do El Mundo sobre o marquês é bastante instrutivo nesse sentido. Informa que o marido da "flamante presidenta del Santander" sempre foi a alma da festa que o casal realiza todo dia 31 de dezembro no Iate Clube do Grand Hotel Bellevue, de Gstaad, na Suíça. Ali nessa estação de esqui - onde possuem uma casa estimada em vários milhões de euros - eles passam todos os invernos, diz o jornal, rodeados da mais fina flor da elite europeia.
O casal também possui uma propriedade em Ribamontán al Mar, na costa espanhola. Ela fica a 250 metros da igreja de San Martín de Carriazo. Em 2005, sempre conforme a preciosa descrição de El Mundo, os pombinhos enviaram uma carta à diocese, queixando-se da contaminação acústica causada pelos implacáveis sinos da igreja. "Imediatamente", prossegue o jornal, receberam a negativa do governo local em variar o som das campanas. "Os senhores Morenés-Botín confundem os sons rurais de uma vila de 166 habitantes com os sons urbanos de um bairro residencial de Madri", escreveu o pároco.
Sinos e seios incomodam. E a vida imita Fellini.
Artistas de esquerda exigem o cancelamento de um filme sobre o Olavo de Carvalho em um festival de cinema. Militantes de direita exigem o cancelamento de uma exposição Queer patrocinada por um banco. É fácil ver o que existe de comum nos dois casos: em ambos desaparece a concepção moderna de arte, e tudo se torna expressão de um lugar de fala cujas qualidades são julgadas sempre em termos morais que buscam higienizar a linguagem, eliminando suas fissuras. O resultado é uma imbecilização geral de quem só é capaz de aceitar na arte aquilo que remete a uma imagem mais ou menos óbvia de si mesmo.
Mas é mais interessante ainda ver o que há de diferente entre os dois essencialismos, e que se observa sobretudo no campo dos resultados. Os cineastas de esquerda escreveram notas públicas e saíram do festival, preservando seu senso ético e moral contra a "regressão" direitista. Resultado: o filme sobre o Olavo não só participou do festival como ganhou até prêmio (não vi o filme, mas pra mim a premiação foi mais do que merecida. Justamente porque, dentro dessa lógica, assistir ou não ao filme pouco importa). E agora, depois do bafafá, tem muito mais gente ansiosa pra assistir.
A direita MBL, por sua vez, conseguiu fazer com que a exposição queer saísse de cartaz, revelando que talvez os interesses do banco estejam mais do lado do dinheiro do que da esquerda (sua nota de justificativa aponta pra isso). Mas é só uma suposição.
De todo modo, se a gramática é a mesma nos dois casos, fica evidente a quem ela mais beneficia na atual conjuntura. A falta de apoio de base faz a esquerda recuar do mundo em nome da autopreservação, enquanto a direita aproveita pra transformar o reacionarismo à brasileira em força política.
No fim, a esquerda que fugiu (mas lançou nota no face) é vista como 'intolerante", enquanto a direita é reconhecida como "corajosa" e "ousada" em seu confronto contra as estratégias vitimistas da esquerda caviar, que apenas justificam a degeneração dos costumes e a corrupção do PT. Concentrar a luta no plano da higienização politicamente correta do discurso é um erro estratégico cujo preço já começou a ser pago pela esquerda, que age como se ainda possuísse a mesma hegemonia discursiva pós ditadura, sem perceber os deslocamentos orquestrados por anos de retórica antipetista e equívocos do partido.
O problema do lugar de fala, complemento necessário da lógica caricatural do politicamente correto, é justamente que tais lugares estão dados de antemão, antes dos conteúdos, no estabelecimento ideológico de vilões e de mocinhos, e seus modos adequados de dizer. Só que o campo heroico não é mais o esquerdista, como quando se acreditava na aliança progressista imaginária que lutava com canções contra as armas bem reais da ditadura militar que, curiosamente, foi "derrotada".
(Um parêntesis algo deslocado, mas que ainda trata dos potenciais da arte: é por isso que o funk, que se especializou em produzir conteúdos a partir desse horizonte de rebaixamento de uma linguagem que tornou-se incapaz de abrigar/reconhecer o Outro, tornou-se assim, mais do que muitas obras mais "críticas", um lugar privilegiado para compreensão da selvageria generalizada que só por inércia continuamos a chamar de país).
A PF, o MP e o Judiciário devem ser discretos.
Mas o codinome "quadrilhão" dado a essa organização criminosa que na área política usa o nome fantasia de PMDB é perfeito.
Eu diria que ela é a maior expressão do crime organizado em atividade no país.
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