Por: Vitor Necchi | 11 Julho 2017
Dados cada vez mais alarmantes em relação a casos brutais de feminicídio e a outras formas de violência contra as mulheres indicam o alcance da situação na América Central. Honduras é um trágico retrato dessa realidade. Nos últimos 10 dias de junho, ocorreram 18 assassinatos no país. Em alguns casos, a gravidade das agressões indicava o ódio que motivou o crime. Entre as vítimas, havia estudantes em idade escolar, como Rebeca Torres, encontrada morta em Tegucigalpa no dia 23 de junho. A adolescente de 15 anos vestia o uniforme do colégio onde estudava, o Instituto Central Vicente Cáceres. Seu corpo apresentava golpes severos de pedradas.
O Observatório de Violência, da Universidade Nacional Autônoma de Honduras, informou que entre janeiro e março foram assassinadas 99 mulheres no país. Desse total, 73 tinham entre 15 e 39 anos. A entidade ainda registrou a ocorrência de 422 casos de estupro contra mulheres entre 10 e 19 anos. Em consequência dessas trágicas estatísticas, pelo menos 20 organizações declararam que Honduras se encontra em “alerta vermelho” e divulgaram um documento denunciando a situação.
Frente a esses dados, as autoridades contrapõem que os homicídios diminuíram 22% nos primeiros seis meses deste ano, mas as organizações que atuam na defesa e proteção de mulheres sustentam que o país se encontra em um novo nível de violência contra a população feminina, quadro agravado pela impunidade: 96% dos homicídios não são resolvidos.
No documento elaborado pelos grupos de mulheres, é exigido que as autoridades tenham atenção imediata a essa realidade. O texto acusa que a impunidade dos autores dos feminicídios se reforça com a falta de aplicação desta figura jurídica. Em 2016, houve 463 assassinatos de mulheres, mas apenas 15 casos foram investigados e dois sentenciados pela Justiça.
Alguns crimes apresentam caracterizações bárbaras, conforme o relato das organizações feministas. Martha Gómez, 42 anos, de Itibucá, foi estuprada e torturada com fogo até seu corpo ser incinerado. Irma Quintero e Dunio Xiomara, de 21 e 34 anos, respectivamente, foram assassinadas e esquartejadas em Choloma. Yareni Hernández, 22 anos, foi assassinada na localidade de Tela pelo marido, que depois se suicidou. Na análise desses episódios, as entidades consideram que os homicídios de mulheres apresentam circunstâncias piores se comparados às violências mais comuns em Honduras.
A violência contra mulheres é abrangente. A líder indígena e ativista ambiental Berta Cárceres foi morta de maneira brutal em La Esperanza, Honduras, na madrugada de 3 de março de 2016, na véspera de completar 44 anos. Os assassinos eram jagunços que invadiram a casa da ativista, que pertencia ao povo Lenca, grupo étnico mesoamericano com idioma próprio, presente em territórios de Honduras e El Salvador.
Em 1993, Berta foi uma das fundadoras do Conselho Cívico de Organizações Populares e Indígenas de Honduras (COPINH). Em 28 de outubro de 2014, teve atuação destacada no Encontro Mundial dos Movimentos Populares, no Vaticano. Na ocasião, o papa Francisco pronunciou o célebre discurso dos três T: Terra, Teto e Trabalho. Entre suas ações, destaca-se a luta pela preservação do rio Gualcarque, ameaçado pela construção de barragens.
A sua morte era anunciada, tanto que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) havia pedido que ela ganhasse proteção, pois vinha recebendo ameaças da polícia, de militares e de paramilitares. O governo tomou medidas e prendeu suspeitos somente depois que o Banco Europeu de Investimento cancelou um empréstimo de 40 milhões de dólares a Honduras, citando como motivo pela negativa a morte de Berta.
Se nada for feito, novo crime deve ocorrer, desta vez com a filha da ativista, Bertita Zúniga Cáceres, 26 anos, que está seguindo os passos da mãe nos movimentos sociais. No dia 30 de junho, ela e mais dois líderes indígenas sofreram um atentado. Escaparam ilesos.
A violência contra as mulheres adquire contornos diversos e em vários países. Em El Salvador, a estudante Evelyn Hernández sofreu abuso sexual de um integrante de uma quadrilha durante meses. Ela sangrava seguidamente e desconhecia que, em decorrência dos estupros, ficou grávida. No dia 6 de abril do ano passado, quando tinha 18 anos, começou a sentir dores no ventre e acabou expelindo um feto morto no banheiro de sua casa. Por conta do sangramento, perdeu a consciência e foi levada pela sua mãe a um hospital, onde acabou presa pela acusação de ter praticado aborto. No início de julho, recebeu uma sentença de 30 anos de prisão por homicídio. A juíza responsável pelo caso justificou o agravamento da pena alegando que Evelyn não buscou acompanhamento pré-natal.
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Violência contra mulheres assusta na América Central - Instituto Humanitas Unisinos - IHU