25 Junho 2017
O Papa Francisco está destinado a sofrer uma “crítica feroz” porque tomou algumas decisões “nada convencionais”, como criar cardeais clérigos inimagináveis, mas ele sabe disso e “encara isso com um senso de humor muito grande”, afirmou Gregorio Rosa Chávez.
A reportagem é publicada por Terra, 23-06-2017. A tradução é de André Langer.
O bispo salvadorenho, que receberá a dignidade de cardeal no próximo dia 28 de junho no Vaticano, insistiu em que o Pontífice “não cria problemas” nem “lhe tira o sono” o fato de que o critiquem, e isso deveria ser “uma grande lição”.
“A gente, às vezes, se deprime porque não sabe enxergar além, (mas) ele olha além, para Jesus que vai em frente com os pés ensanguentados. Ele põe seus pés nas pisadas do Senhor que, muitas vezes, não são de glória, mas de sofrimento”, indicou em entrevista à agência Notimex.
“O Papa nos ensina a enxergar uma cruz que se ilumina e dá ao mundo uma esperança; tão simples é a mensagem e tão atual e necessária é no mundo de hoje”, acrescentou.
Rosa Chávez é um dos cinco novos cardeais que receberão o barrete vermelho das mãos de Francisco na tarde do próximo dia 28 de junho na Basílica de São Pedro, durante um Consistório Público que surpreendeu a todos os observadores vaticanistas, que não chegaram a prever uma iminente rodada de cardeais.
O caso de Rosa Chávez é especial, pois será o primeiro cardeal na história de El Salvador e, além disso, o primeiro bispo na história da Igreja a alcançar essa dignidade sendo bispo auxiliar. Isso enquanto seu superior direto, o arcebispo de San Salvador, não goza dessa distinção.
Um caso inédito que provocou uma “surpresa total” no distinguido, como ele mesmo reconheceu. Ele disse que não tinha nenhum sinal prévio que lhe indicasse para onde o Pontífice argentino se inclinaria.
“Fiquei sabendo às 5 horas da manhã, quando em Roma eram 13h, quando uma religiosa me telefonou para me dar a notícia. Eu achei que fosse uma brincadeira, mas ela me explicou que não, que era algo totalmente confirmado. Então, permaneci um longo tempo em silêncio, desnorteado e assustado”, explicou.
Isso aconteceu no dia 21 de maio passado, quando, da janela do seu quarto pessoal, no Palácio Apostólico, Jorge Mario Bergoglio anunciou para a multidão sua decisão de “criar” cinco novos cardeais. Nenhum deles foi informado com antecedência.
Rosa Chávez é bispo auxiliar de San Salvador e seu caso é o exemplo mais claro da decisão do papa de ignorar o protocolo na hora de atribuir os barretes cardinalícios.
Em seus quatro consistórios, Francisco decidiu premiar figuras desconhecidas de países marginais e deixar de lado importantes arcebispos das chamadas “sede cardinalícias”.
“Eu estou surpreso, porque isso significa que nunca se poderia ter pensado no que aconteceu, apenas na cabeça do Papa podem passar coisas como estas”, acrescentou o cardeal, referindo-se à sua escolha.
Ele reconheceu que seu primeiro pensamento, quando ficou sabendo da notícia, foi que não merecia tal “graça” e “responsabilidade”. E depois se perguntou: “por que o Papa fez isso?” A mesma pergunta que passou pela cabeça de muitas pessoas, em Roma e em outros lugares de mundo.
Por que forçar uma situação inédita e até incômoda, eclesiasticamente falando, dando a púrpura a um bispo auxiliar? “Ainda não tenho a resposta objetiva para isso. Ouvi tantas coisas das pessoas a este respeito. Sei que Romero está por trás disso, mas o como e o porquê, o Papa já vai me dizer, não quero me antecipar”, disse.
Considerou que a desvinculação do título de cardeal da cidade ou da sede cardinalícia é uma decisão “revolucionária”, já que antes era obrigatório que esta ou aquela cidade tivesse um cardeal, recordou.
“Isso ficou totalmente superado e é uma revolução. Ele deixou muito claro que nos quer ao seu lado para governar a Igreja, porque necessita de pessoas em quem pode confiar”, acrescentou.
Destacou, além disso, como “muito bonito” não deixar-se influenciar pelas críticas, porque temos necessidade de homens livres em Cristo, como Bergoglio.
Para Rosa Chávez, tudo se deve a Óscar Arnulfo Romero, “dom Romero, o bispo dos pobres”, que foi assassinado enquanto celebrava a eucaristia no dia 24 de março de 1980 e cuja memória foi vítima de uma luta ideológica mundial travada na Igreja, em plena Guerra Fria.
“Penso que isso é uma homenagem a ele e vou receber o barrete em seu nome. Ele merecia isso. Deus lhe deu isso antes, quando lhe deu a púrpura do seu sangue martirial. Por isso, estou com muita paz, porque todos relacionam isso com Romero. Isso me dá muita paz e também muita tranquilidade”, explicou.
Disse que Francisco sonha com uma Igreja pobre e para os pobres, que é a mesma Igreja sonhada por Romero, e o Papa quer que essa Igreja, “um pouco nas sombras”, fique visível para o mundo.
“O Papa tem claro qual é o sonho de Deus neste momento. Um mundo com tanta notícia ruim, com tanta incapacidade para ser solidário, um mundo que levanta muros o tempo todo – temos o caso norte-americano neste momento”, afirmou.
“Estender pontes é a grande esperança do Papa; isso o toca, ajuda-o a construir pontes. E sem isso não há alegria no mundo, não há paz, nem um futuro digno para ninguém. Todos nós vamos perder se não formos construtores de pontes”, assinalou.
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O Papa está destinado a sofrer uma “crítica feroz”, afirma cardeal salvadorenho - Instituto Humanitas Unisinos - IHU