18 Mai 2017
Pela primeira vez, os principais movimentos que organizaram grandes protestos pelo impeachment de Dilma Rousseff pedem a renúncia - e até a prisão - do presidente Michel Temer, após a eclosão da notícia de que o presidente teria dado aval para a compra do silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha.
A reportagem é de Ricardo Senra, publicada por BBC Brasil, 18-05-2017.
Esses movimentos, fundados com base na luta contra a corrupção, vinham concentrando suas críticas em integrantes dos governos do PT. Em certa medida, muitos poupavam Temer, que já tinha sido alvo de denúncias, porém menos graves, pelo papel desempenhado no impeachment de Dilma Rousseff e pelas reformas econômicas defendidas em seu mandato.
A adesão dos grupos à onda de reprovações vindas de movimentos ligados à esquerda ou ao PT pode significar mais um obstáculo à sobrevivência de Temer no Planalto, já que Vem Pra Rua e Movimento Brasil Livre têm forte aceitação entre setores que até hoje davam apoio ao peemedebista.
Além de milhões de seguidores nas redes sociais e bom diálogo com empresários, os grupos têm forte interlocução no Congresso - onde seus representantes são vistos frequentemente discutindo apoio ou oposição a medidas legislativas com parlamentares de diferentes partidos.
Segundo reportagem publicada nesta quarta-feira pelo jornal O Globo e confirmada por outros veículos de imprensa, Joesley e Wesley Batista, donos do conglomerado de empresas que inclui a JBS/Friboi, teriam gravado, como parte de negociação para delação premiada à Procuradoria-Geral da República, um diálogo em que Temer teria pedido para que mantivessem o pagamento de uma mesada a Cunha e ao operador Lúcio Funaro, para que os dois não divulgassem atos de corrupção ligados ao governo.
Image caption Rogério Chequer, do Vem Pra Rua, foi um dos organizadores de atos contra o PT
Em nota enviada à imprensa após a divulgação da notícia, o Palácio do Planalto disse que o presidente Michel Temer "jamais solicitou pagamento para obter o silêncio" do ex-presidente da Câmara dos Deputados, nem "participou e nem autorizou qualquer movimento com o objetivo de evitar delação ou colaboração com a Justiça pelo ex-parlamentar".
Com o mote "Prendam Todos! Temer, Dilma, Lula e Aécio", o movimento Vem Pra Rua marcou uma série de protestos em grandes cidades do país para o próximo domingo.
O grupo, liderado pelo publicitário Rogério Chequer, divulgou o protesto na madrugada desta quinta-feira, pedindo "com urgência" que seus seguidores confirmem presença e convidem amigos. "Não temos muito tempo para divulgação."
"Obstrução à Justiça é crime gravíssimo", afirmam os organizadores do Vem Pra Rua, que sempre estiveram na linha de frente contra o PT e apoiavam medidas do atual governo.
Já o Movimento Brasil Livre (MBL), de Kim Kataguiri, publicou imagens pedindo a renúncia de Temer.
"No momento, não há nada que possam fazer para se livrar da Justiça ou da opinião pública, que irá massacrá-los pelos próximos meses", publicaram os coordenadores do movimento nas redes sociais, em referência a Temer e ao presidente do PSDB, Aécio Neves - que também teria sido gravado pedindo R$ 2 milhões ao empresário da JBS.
O valor teria sido entregue a um primo de Aécio, em momento também gravado pela Polícia Federal.
Em nota à imprensa, Aécio disse que tinha relação "estritamente pessoal, sem qualquer envolvimento com o setor público" com o empresário Joesley Batista.
"O senador aguarda ter acesso ao conjunto das informações para prestar todos os esclarecimentos necessários", afirmou o comunicado.
"Agora eu quero saber cadê aquela petistada que dizia que a Lava Jato era uma conspiração para ter um acordão para salvar o Temer, salvar o Cunha?", perguntou Kim Kataguiri, em vídeo divulgado nas redes sociais.
"Eu tenho liberdade para pedir a renúncia do Temer e para dizer que quero que Aécio seja preso. E vocês, podem dizer a mesma coisa sobre Lula e Dilma?"
Tanto o Vem Pra Rua quanto o Movimento Brasil Livre vinham elogiando, nos últimos meses, as reformas propostas pelo governo Temer e as propostas do presidente para melhorar a situação econômica do país.
Nas redes sociais, o MBL foi criticado por apagar fotos do presidente Temer em publicações favoráveis ao governo após a divulgação das gravações nesta quarta-feira.
Ao jornal Folha de S .Paulo, em setembro do ano passado, um dos líderes do movimento afirmou que não achava "má ideia" que o grupo ajudasse o governo "se for no sentido de apoiar as reformas e desde que elas não sejam abrandadas pela pressão de alguns grupos".
Marcello Reis, cabeça do grupo Revoltados Online, uma das vozes mais estridentes contra os governos petistas, também comentou o caso na noite desta quarta-feira.
"Michel Temer não presta! Outro corruPTo que está no poder do nosso Brasil."
Em espectro político diametralmente oposto, as Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo também convocaram protestos para o próximo domingo, pedindo o afastamento de Temer e a convocação de eleições diretas.
Os dois grupos defenderam a ex-presidente Dilma Rousseff durante o processo de impeachment.
"As provas divulgadas hoje de corrupção e suborno para calar o ex-deputado Eduardo Cunha comprovam o que há mais de um ano afirmamos, que o presidente ilegítimo Michel Temer não tem nenhuma condição de continuar na presidência da República", dizem os grupos.
"Só o voto popular pode resolver essa imensa crise política, resgatar a democracia e credibilidade na principal instituição brasileira. Qualquer outra saída será golpe dentro do próprio golpe", completa a descrição dos convites para os protestos.
O jornal O Globo informou que os diálogos e as entregas de malas com dinheiro foram filmados pela polícia. Além disso, as malas estavam com chips para que o caminho do dinheiro pudesse ser rastreado.
A delação da gigante dos alimentos teria sido fechada em tempo recorde, se comparada com a das empreiteiras Odebrecht e OAS. As conversas teriam começado em março e os depoimentos, realizados de abril a maio.
As conversas com Temer e Aécio teriam sido gravadas pelo próprio Joesley. De acordo com O Globo, em dois momentos em março, o dono da JBS falou com o presidente e o senador do PSDB levando um gravador escondido.
Para evitar vazamentos, segundo o jornal, Joesley entraria na garagem da sede da Procuradoria dirigindo o próprio carro e subiria para a sala de depoimentos sem ser identificado.
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Pela primeira vez, MBL e Vem para Rua pedem renúncia e até prisão de Temer - Instituto Humanitas Unisinos - IHU