22 Agosto 2016
A notícia vinda de Roma na manhã desta quarta-feira, 17-08-2016, é animadora: a decisão do Papa Francisco de nomear Dom Kevin Farrell para chefiar o novo dicastério sobre a família, o matrimônio e os leigos não é somente uma boa notícia em si porque Farrell é um dos administradores mais competentes da Igreja e que acontece também de possuir o “cheiro das ovelhas”. Além disso, tal decisão mostra novamente que o Papa Francisco tem uma ideia muito clara do que está acontecendo na Igreja nos Estados Unidos, e sabe bem quem entre os hierarcas é favorável à sua visão. Como a escolha, dois anos atrás, de Dom Blase Cupich para liderar a Arquidiocese de Chicago, Francisco escolheu a pessoa a quem eu teria colocado no topo da minha terna se isso me fosse permitido fazer. E, devemos notar, Farrell é um dos bispos mais engraçados do planeta.
A reportagem é de Michael Sean Winters, publicada por National Catholic Reporter, 17-08-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
A nomeação ocorreu simultaneamente com o motu proprio que estabeleceu o novo dicastério. O motu proprio é aberto com as palavras “La Chiesa, madre premurosa”, ou “a Igreja, como uma mãe diligente”. Também poderíamos traduzir “premurosa” como “trabalhadora”, uma repreensão leve, se não sutil, aos que se queixam de que Francisco não tira férias.
“Em duas ocasiões nestes últimos meses, o Papa Francisco emitiu um motu proprio: ‘Como uma mãe amorosa’ em junho sobre a proteção das crianças e agora ‘Uma mãe diligente’, que criou este novo e importante departamento. Ao se referir à Igreja como uma mãe que é, ao mesmo tempo, amorosa e diligente, ele nos lembra dessas qualidades em nossas próprias mães, inspira-nos a renovar a Igreja, sem medo do trabalho duro que isso envolve, trabalho que vemos as mulheres a fazer diariamente – e sempre fazendo-o com amor”, disse Cupich via e-mail enviado a mim esta manhã. “Congratulo-me com a notícia de que o Papa Francisco criou um novo departamento para os Leigos, a Família e a Vida assim como fico feliz com a informação de que ele designou Dom Kevin Farrell, de Dallas, para ser o seu prefeito. Farrell é uma pessoa particularmente qualificada para esta tarefa e tem o meu total apoio”.
O novo dicastério será responsável por ajudar a Igreja universal a inculturar as deliberações dos dois últimos sínodos e de Amoris Laetitia, emitida com base nessas deliberações. “Numa época em que o Santo Padre chama a atenção de toda a Igreja para o papel dos leigos e para a importância de uma atividade pastoral e robusta, para um apoio às famílias e à vida de casado por meio da criação deste novo dicastério visando focar e coordenar este trabalho, a liderança que Farrell irá ser uma bênção para todos nós”, disse o Cardeal Donald Wuerl em um pronunciamento esta manhã. É muito apropriado que logo depois da publicação da exortação apostólica pós-sinodal, Amoris Laetitia, com a sua recepção generalizada e franca na Igreja, nós agora tenhamos um novo departamento no Vaticano para aprofundar esse importante ministério. Nós nos regozijamos em saber que este desafio foi confiado ao mui competente Dom Kevin Farrell”.
Eu faria notar as palavras do cardeal sobre a recepção “generalizada e franca” que Amoris Laetitia teve. Esta é a sua resposta (e a resposta do Santo Padre, já que Wuerl é um dos principais assessores do Santo Padre) aos que têm se queixado de ser Amoris Laetitia confusa ou mesmo herética. Qualquer um que acha que pode falar mal do texto, ou de qualquer coisa escrita pelo papa, deveria saber que Farrell não é uma pessoa disposta a lidar com tolos nem é o tipo de pessoa que aceita disparate.
Além de chefiar o novo dicastério, Farrell tem duas outras funções em Roma que são dignas de nota. Primeiro, ele será designado para servir em outros dicastérios onde a sua influência será sentida. Eu diria que sua experiência em lidar com casos de abuso sexual clerical em Dallas vai ser particularmente importante, já que ele pode ajudar habilmente o Cardeal Sean O’Malley na implementação de normas universais de responsabilização episcopal. Segundo, Farrell vai servir como uma referência para os bispos americanos nas relações deles com a hierarquia, e para o papa na obtenção de uma boa informação sobre a Igreja nos EUA. Mal posso pensar em alguém mais capacitado para ser um filtro a tais informações. Farrell goza do respeito de seus colegas, como demonstrado pelas suas eleições para cargos de liderança na Conferência dos Bispos, mas ele também não é, de forma alguma, um “guerreiro da cultura”.
O Cardeal Theodore McCarrick foi seu mentor no episcopado e McCarrick não era nenhum “atirador de bomba” cultural. E, apesar do que os conservadores possam pensar, McCarrick e Farrell não são progressistas no sentido de que os leitores do National Catholic Reporter empregariam o termo. Eles não são líderes diretamente associados com a esquerda.
A “Equipe de Francisco”, aqueles bispos que têm saudado com entusiasmo o pontificado atual, não conteve a animação advinda da notícia que falava da nomeação. “Dom Kevin Farrell é uma escolha excelente para prefeito do novo dicastério”, disse-me O’Malley via e-mail esta manhã. “Ele tem o talento administrativo, a habilidade linguística e, o que é mais importante, a visão pastoral do Papa Francisco. Ele também põe um americano na Cúria Romana, o que é bem importante para a comunicação entre a nossa conferência dos bispos e os membros da Cúria do Santo Padre. Estamos todos voltando as nossas orações e o nosso apoio a Farrell no momento em que ele começa este ministério fundamental a serviço do Santo Padre e da Igreja universal”.
Conforme observei em minha postagem no início da manhã quando vi pela primeira vez a notícia, Farrell assumiu o Centro Hispânico aqui em Washington após o seu fundador, Sean O’Malley, ter sido ordenado a bispo. O centro era um local que agregava – e agrega – vários serviços sociais junto à comunidade latina aqui na capital do país. Nele não se faz distinção entre pessoas com ou sem documentos. Ajudam-se as pessoas que estão em situação de vulnerabilidade e empobrecidas. O centro é a Igreja Católica em seu melhor. Foi assim que Farrell adquiriu o cheiro das ovelhas. Ele é, como também o Cardeal O’Malley, um latino honorário, e se nunca ouviu alguém falar espanhol com um sotaque irlandês pesado, você está apto para ter uma bela surpresa. Farrell circula com a mesma facilidade entre os migrantes pobres no Centro Hispânico como circula entre os diplomatas afluentes e influentes que povoaram a sua paróquia alhures.
Em outro artigo, observei que logo veríamos as diferenças de opinião sobre Amoris Laetitia surgirem por conta da expectativa de que um importante comitê da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA publicaria uma espécie de relatório em setembro, e que o presidente deste comitê, Dom Charles Chaput, havia emitido diretrizes para a sua própria arquidiocese as quais, a meu ver, ficaram aquém e representaram uma contradição evidente ao que temos ouvido da parte do Cardeal Christoph Schönborn e lido nas páginas da Civiltà Cattolica. Agora, esta nomeação acrescenta a ideia de que o Santo Padre quer mover-se a uma clara direção, e esta não é a direção que os opositores iriam propor.
Portanto, parabéns a Farrell e, ainda mais, ao Papa Francisco, que ganha um assistente extraordinário o qual irá fazê-lo dar risadas! Um dia triste para Dallas, agora uma outra grande diocese está aberta para que o papa designe um bispo que vá realizar a sua visão por estas terras de cá. Eis um grande dia.
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Dom Kevin Farrell vai para Roma: O que isso significa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU