24 Junho 2016
Enquanto o Papa Francisco se prepara para embarcar em uma viagem de três dias para a Armênia nesta semana, especialistas e líderes da Igreja esperam que a visita destaque os laços entre católicos e comunidades cristãs ortodoxas e traga oportunidades de reaproximação política em sua região, que se alastra entre dois continentes.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 22-06-2016.
Um dos líderes da Igreja Apostólica Armênia, uma comunidade Ortodoxa Oriental que inclui 93 por cento da população de três milhões de habitantes da Armênia, espera que o Papa possa ajudar a encorajar relações mais amigáveis com os países vizinhos da Turquia e Azerbaijão.
"Oro para que o Santo Padre, por sua forte liderança, ajude na criação de melhores relacionamentos", disse o arcebispo Khajag Barsamian, Primaz da Diocese Oriental da Igreja Armênia da América do Norte.
"Às vezes, os líderes religiosos podem desempenhar um papel mais forte do que o dos líderes políticos, cujos interesses são diferentes", disse Barsamian. "Ao Santo Padre interessa a paz no mundo, a reconciliação".
A Armênia, uma ex-república soviética na região do Cáucaso, localiza-se entre os mares Negro e Cáspio e faz fronteira com a Turquia a oeste e com o Azerbaijão a leste. Essa posição coloca o país entre a Europa, a Ásia, o Oriente Médio e a Rússia.
O Papa Francisco vai visitar o país de 24 a 26 de junho, na primeira parte de uma turnê mais ampla na região do Cáucaso. Ele visitará o Azerbaijão e a Geórgia no final do ano, nos dias 30 de setembro e 2 de outubro.
No ponto central da visita à Armênia está uma relação política complexa com a Turquia. Os dois países, ambos ex-membros do Império Otomano, não têm relações diplomáticas formais e sua fronteira comum é fechada com cercas de arame farpado.
O Papa também causou um rebuliço diplomático com os líderes turcos no ano passado ao descrever as mortes de 1,5 milhão de armênios do período da Primeira Guerra Mundial como o primeiro genocídio do século XX, descrição à qual líderes turcos há muito tempo resistiram.
O massacre começou em 1915, quando o governo otomano começou a cercar e prender os líderes da comunidade armênia. A Turquia, país sucessor do império, afirma que a palavra "genocídio" não descreve com precisão o que aconteceu.
Em um dos momentos mais esperados da visita à Armênia, o Papa Francisco visitará um museu dedicado à memória dos assassinatos, em 25 de junho. Um especialista em políticas turcas disse que a reação do governo à viagem provavelmente dependerá do que o Papa disser nessa visita.
"Eu não acho que será um problema, pois qualquer líder de Estado em viagem à Armênia visita o memorial do genocídio", disse Aybars Görgülü, especialista do Centro de Políticas Públicas e Estudos Democráticos (PODEM), uma organização de pesquisa e ativismo situada em Istambul.
Mas Görgülü acrescentou: "Depende do que ele vai dizer."
"Se ele reiterar o que disse no ano passado, em outra declaração forte, a Turquia reagirá", disse ele, mencionando que o país retirou temporariamente o seu embaixador no Vaticano, após as palavras do Papa em 2015.
Barsamian, cuja diocese ministra para cerca de um milhão de membros da Igreja Armênia nos EUA, disse que a visita de Francisco é uma "grande oportunidade para o povo armênio também expressar sua gratidão" por sua descrição do genocídio.
"Dizer que este foi o primeiro genocídio do século XX e que é importante que reconheçamos os erros do passado foi uma mensagem muito forte, muito clara e muito pastoral para o mundo", disse o arcebispo.
"Esta será uma grande oportunidade de o povo armênio expressar a sua gratidão, o seu apreço ao Santo Padre por um passo tão corajoso e pela forte liderança espiritual que desempenha", disse ele.
Além da dimensão política da questão do genocídio, Barsamian disse que o Papa Francisco também tem uma oportunidade na Armênia para demonstrar a liderança ecumênica e a amizade à comunidade ortodoxa durante as suas visitas.
A igreja Apostólica Armênia, cuja fundação se originou nos apóstolos Bartolomeu e Tadeu, é uma das seis Igrejas que formam a Ortodoxia Oriental. Essas igrejas, que têm cerca de 84 milhões de membros no total, reconhecem apenas os três primeiros concílios ecumênicos, tendo rompido com as outras igrejas cristãs no século V.
A Igreja Armênia é liderada pelo seu bispo Karekin II, conhecido como o 'Católico'.
O Papa Francisco se encontrará com Karekin após o seu desembarque no país, em 24 de junho, com quem realizará uma oração ecumênica pela paz em 25 de junho e participará de uma liturgia da Ortodoxia Armênia em 26 de junho, antes de assinar uma declaração ecumênica conjunta.
O padre Ronald Roberson, diretor adjunto da Secretaria de Assuntos Ecumênicos e Interreligiosos dos Bispos dos EUA, disse que os católicos e os ortodoxos armênios têm uma relação "muito próxima".
Roberson mencionou a visita do Papa João Paulo II à Armênia em 2001, quando o pontífice celebrou uma missa para a comunidade católica local usando o mesmo altar que os ortodoxos usam em suas celebrações.
"É um exemplo clássico da comunhão 'quase perfeita' entre a Igreja Católica e muitas das Igrejas Orientais", disse Roberson, acrescentando que há um "alto nível de respeito mútuo" entre elas.
Barsamian disse que ele espera que as reuniões entre o Papa Francisco e Karekin ajudem católicos e ortodoxos em todo o mundo a praticar a amizade, em níveis locais.
"Essas reuniões enviam uma mensagem significativa para as pessoas, para os fiéis em todos os lugares, para que, em nível local, os leigos e o clero vejam que tal ligação e comunicação existe em um grau superior", disse o arcebispo.
"Quando os pastores e os fiéis perceberem que há uma relação tão calorosa e fraternal neste nível, as pessoas se tornarão mais próximas também em nível local", disse ele.
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Viagem papal à Armênia: amizade ortodoxa e reaproximação política - Instituto Humanitas Unisinos - IHU