06 Junho 2016
O Santo Sínodo hierárquico da Igreja ortodoxa da Grécia reuniu-se em 25 e 26 de maio, para discutir correções e melhorias nos textos sinodais preparatórios, submetidos à sua consideração. Concentrar-nos-emos em alguns pontos desta discussão.
A reportagem é de Ioannis Maragos, publicada por Settimana, 29-05-2016. A tradução é de Ramiro Mincato.
Em relação ao texto intitulado "As relações da Igreja Ortodoxa com o conjunto do mundo cristão", emergiram as seguintes posições.
O metropolita Ierofeos de Nafpaktos, que publicou suas observações no site de sua Igreja, escreve: "Uma coisa é, quando falamos ou escrevemos livremente, usar os termos Igreja Católica Romana ou a Igreja Luterana; outra coisa é quando escrevemos textos confessionais: eles devem ser claros e precisos. Nos textos em mãos, tem-se a impressão de que, por trás de certas imprecisões, quer-se passar teorias precisas, que não são totalmente ortodoxas. Como se diz no jargão político parlamentar sobre alguns decretos que "fotografam" certas situações".
Como exemplo disto cita o diálogo ecumênico entre as Igrejas, e especialmente do Patriarcado Ecumênico com a Igreja Católica Romana, cujos representantes escrevem "que há um certo espírito de fraternidade, resultante do fato de que há um único batismo e que participamos dos mesmos sacramentos"; e ainda que " nossas Igrejas se reconhecem irmãs corresponsáveis na conservação da única Igreja de Cristo, fiel ao plano divino, numa unidade completamente particular".
O que não é verdade. Símiles trocadilhos e imprecisões em documentos oficiais da Igreja devem ser removidos. A Igreja Católica Romana não é Igreja, mas uma confissão; ou, quanto muito, uma comunidade cristã; assim sentenciou o Santo Sínodo da hierarquia da Igreja Ortodoxa Grega. O mesmo se aplica a outras igrejas, como a Anglicana e a Luterana. Os metropolitas de Piraeus e de Kithira (ilha ao sul do Peloponeso) sentenciaram que a Igreja Católica Romana e as outras são heréticas e, portanto, não nos é permitido reconhecer nelas seu caráter de Igreja.
Aliás, dos 24 metropolitas escolhidos como representantes da Igreja, 11 se demitiram por várias razões: porque não concordam com a modalidade de convocação do Sínodo; com o desenvolvimento dos trabalhos; por razões de consciência; por outras razões pessoais não declaradas. Para substituir um dos demissionários foi nomeado o metropolitana de Piraeus, chefe, por assim dizer, dos ultraortodoxos. Ele também, no entanto, renunciou. Comunicou sua decisão numa longa carta, em que elabora um catálogo detalhado de possíveis heresias e erros que devem ser declarados oficialmente como tal pelo próximo Sínodo, se quiser ser um verdadeiro Sínodo ortodoxo, o que não será feito. Diante deste catálogo, o Syllabus de Pio IX empalidece, se não por outro motivo, porque este está atualizado para o momento presente.
A hierarquia propôs, então, com este clima, que ao texto do documento "As relações da Igreja Ortodoxa com o conjunto do mundo cristão", sejam feitas as seguintes correções: em todas as passagens onde se usa a palavra "Igreja", se não se tratar da Ortodoxa, mas das relações com outros cristãos, sejam adotados os termos "confissão" ou "comunidade".
Assim, por exemplo, onde o texto da Comissão Preparatória relata: "As perspectivas dos diálogos teológicos da Igreja Ortodoxa com as outras Igrejas e confissões cristãs são sempre determinados com base nos critérios canônicos da tradição eclesiástica já estabelecida" (n. 20), com a intervenção da hierarquia da Igreja da Grécia dever-se-ia corrigir: "(...) da Igreja Ortodoxa com as outras comunidades e confissões cristãs (...)". No mesmo cumprimento de onda encontram-se os Patriarcas da Bulgária, Sérvia e Geórgia; ao contrário, o Patriarcado Ecumênico, o Patriarcado da Romênia, a Arquidiocese da Polônia, bem como os metropolitas de Demetrias, (Volos) Inácio, de Messinia, (Kalamata) Crisóstomo, de Peristeri, Crisostomo e de Nea Smyrni, Simeone, que renunciou da delegação da Igreja da Grécia, distanciaram-se das atitudes extremas dos conservadoras, declarando: "não podemos aderir a tais decisões, estimamos impensáveis semelhantes posturas".
Finalmente, a posição sobre o parágrafo relativo ao Conselho Mundial de Igrejas, que os componentes conservadores – mas, não só - queriam remover, juntamente com qualquer outra referência ao Conselho Mundial de Igrejas, não foi aceita.
O homem, a pessoa e Lesbos
Um tema, por nada secundário, foi levantado pelo mesmo metropolita Ierofeos Nafpaktos, com relação ao termo "pessoa", que propõe substituir pelo termo "homem".
Ierofeos escreveu: "Muitas vezes, falamos de "pessoa humana" e da "santidade da pessoa humana", da distinção entre "pessoa" e "indivíduo" e assim por diante, mas em fazê-lo, negamos a teologia de nossos pais".
Ele passa a explicar: "Li a declaração conjunta assinada em Mytilini pelo Papa e pelo Patriarca e Arcebispo de Atenas e de toda a Grécia. Fala-se de "proteção da vida e da pessoa humana", de "crise humanitária", de "violação da dignidade humana e dos direitos humanos e das liberdades fundamentais", mas não da "pessoa humana". Infelizmente, hoje, uma palavra bonita e teologicamente significativa, "homem", foi substituído por termos como "pessoa" e "pessoa humana", que me lembram a expressão "socialismo com rosto humano". Desta forma, a teologia chegou a ser confundida com a sociologia dos direitos humanos. Claro, nós respeitamos os direitos humanos, mas a teologia da Igreja Ortodoxa não pode limitar-se a eles.
Os termos "pessoa", "indivíduo" e similares, como quando alguém fala de "ontologia da pessoa", têm uma história que vai de Tomás de Aquino a Kant, ao idealismo alemão (Fichte, Schelling, Hegel), à teologia russa, ao existencialismo. O termo pessoa também é utilizado por alguns teólogos ortodoxos contemporâneos. É uma forma de "vírus", que afeta nossa teologia ortodoxa.
Pode-se, talvez, usar o termo na linguagem cotidiana, sem perceber, mas quando o termo entra em documentos oficiais e sinodais da Igreja constituem uma aberração teológica. Quando os teólogos modernos usam termos como "pessoa humana", "necessidade da natureza", "vontade ou liberdade da pessoa" violam claramente a teologia ortodoxa, segundo a qual a natureza é boa, e não forçada; a vontade e o desejo são impulsos da natureza e não a pessoa; a pessoa é identificada com o indivíduo etc. A conexão entre vontade e pessoa afeta o Deus Uno e Trino, porque introduz a tritheia (a trideidade), e a conexão entre a natureza e necessidade vem em demérito de Deus, o Criador do homem. No texto, portanto, a palavra "pessoa" deve ser substituída por "homem".
De opinião contrária é o metropolita de Messinia, (Kalata) Crisóstomo. Ele reconhece que é difícil traduzir a palavra pessoa nas línguas eslavas. Mas é completamente contrário, que tal termo seja substituído pelo termo “homem”, enquanto, em sua opinião, é mais fraco que o termo “pessoa”, que indica a comunicação com toda a alteridade. Crisóstomo vê sob esta proposta a "ideia de que não podemos dialogar com qualquer coisa diferente de nós mesmos e fora de nós mesmos, ou seja, uma tentativa de afastar-se do que é diferente e distinto e de comunicar-se com ele: uma maneira sorrateira para promover a ideia da própria exclusividade, originalidade e uniformidade. Em semelhante perspectiva o respeito pela alteridade não existe. O próximo passo será afirmar a excelência e unicidade do homem ortodoxo diante dos cristãos não ortodoxos, e assim por diante ...
O metropolita de Messinia vê nesta tentativa uma expressão da síndrome do medo de tudo o que vem do Ocidente.
Sobre o texto sobre o casamento e seus impedimentos, as opiniões divergem.
Há, a propósito, uma posição muito interessante, neste aspecto, a do professor Ghianaras. Ele afirma que pretender defender a instituição do casamento num clima global caracterizado pelo individuocentrismo e pelo hedonismo é, pelo menos, problemático. A boa notícia da experiência eclesial não pode ser enjaulada em discussões utópicas. Deve iluminar a diferença que intercorre entre a convecção-contrato e o "mistério". No mistério, o conhecimento vem não da inteligência, mas da experiência de comunhão e partilha. Um Sínodo deve considerar o casamento como acontecimento de amor verdadeiro (os esposos, assim como o atleta, combatem o bom combate, para auto-superar-se, auto-doar-se, indo ao encontro do amado).
Quanto ao decreto sobre o jejum, o mesmo Ghianaras recomenda, mais uma vez, para não abordar a questão com espírito legalista, tornando-o um ato meritório e individuocêntrico, mas como ascese em direção à liberdade, até mesmo da necessidade de alimento.
Ulterior interpretação do encontro de Lesbos
Em longa declaração, o metropolita de Pireu, depois de enumerar todos os erros papais, presentes e passados , afirma que a presença dos três líderes religiosos na ilha cancela o tratado entre a União Europeia e a Turquia, propenso a mandar de volta para a Turquia os migrantes, e os alinha às posições da Open Society Fundation de George Soros e dos seus seguidores, que "querem colonizar o continente europeu com populações muçulmanas".
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A Igreja Católica Romana não é Igreja, afirma sínodo da Igreja ortodoxa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU