25 Mai 2016
Luiz Carlos Bresser-Pereira demonstra tranquilidade. Vestido com uma camisa de mangas longas abotoada até o pescoço e uma calça social, o economista mantém o olhar centrado nas páginas de uma revista colocada ao lado de uma taça de água sobre a mesa. Enquanto ele permanece sentado, o barulho aumenta o Auditório Central da Unisinos, em São Leopoldo. Estudantes e professores lotam o espaço para assistir à palestra do homem que, em 1987, ocupou o cargo de ministro da Fazenda no governo de José Sarney.
A reportagem é de Leonardo Vieceli, publicada por Beta Redação, 18-05-2016.
Economista também exerceu funções no governo FHC (Foto: Henrique Standt)
Após ser apresentado ao público, Bresser se levanta para dirigir as suas visões sobre a economia brasileira a uma plateia atenta. Do alto de seus 81 anos, analisa as diferentes épocas que o país vivenciou na área. Contudo, não deixa de externar a preocupação com o atual momento, que, segundo ele, é resultado de uma sucessão de medidas equivocadas. “Desde 1980, crescemos muito pouco”, sintetiza.
Ao tocar nesse ponto, Bresser salienta que “talvez o Brasil possa reagir”. No entanto, minutos depois, revela não vislumbrar grandes modificações no curto prazo com a ascensão do governo interino de Michel Temer. Para sustentar a tese, menciona, entre outros fatores, o retorno ao poder do agora ministro da Fazenda de Henrique Meirelles, que esteve à frente do Banco Central no período em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ocupou o Palácio do Planalto (2003-2010). “Não nos esperam grandes coisas nos próximos anos”, projeta.
Durante a explanação, Bresser destaca as principais ideias contidas em seu livro A construção política do Brasil. Na obra, ele explica as razões da estagnação econômica por meio do embate entre liberalismo e desenvolvimentismo, além de coalizões de classes ao longo das décadas. “Nosso desenvolvimentismo entrou em crise nos anos 1980. O Brasil aderiu ao liberalismo econômico nos anos 1990, até 2002”, declara.
Com uma das mãos dentro do bolso da calça e a outra segurando o microfone, Bresser relata que avaliou a conjuntura histórica nacional para propor o que chama de novo desenvolvimentismo. De acordo com o economista, a teoria prega menor dependência do capital externo e mira na qualidade de vida de toda população. “O novo desenvolvimentismo precisa e deve ser social. Você só consegue governar o Brasil se tiver esses grandes serviços”, comenta Bresser, cujo currículo também registra passagens pelos ministérios da Administração e Reforma do Estado e da Ciência e Tecnologia durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.
Ao seguir a lógica do novo desenvolvimentismo, o Estado deve, além de promover programas que estimulem o avanço social, intervir em questões macroeconômicas. Entretanto, aos olhos de Bresser, o governo não pode exercer interferência sobre o setor competitivo.
De maneira geral, o economista enaltece que o seu modelo prega a responsabilidade fiscal aliada à política monetária com forte controle da inflação e da taxa de câmbio. “Quando você se endivida em moeda estrangeira, assim como a gente, você está sujeito a quebras cíclicas”, destaca.
Depois de aproximadamente uma hora de discurso, Bresser ouve atentamente os questionamentos do público. Anota as perguntas que são direcionadas a ele e os nomes dos respectivos autores. Um deles é o professor Edelberto Behs, que coordena o curso de Jornalismo da Unisinos e deseja saber de que maneira o “complexo de vira-latas” asfixia o desenvolvimento do país.
Após um breve sorriso, o economista ressalta que a expressão, criada pelo escritor Nelson Rodrigues, também serve para descrever o senso de inferioridade que muitos brasileiros têm a respeito da economia nacional. É, segundo Bresser, um pensamento de natureza “colonial” de que outros países possuem maior capacidade para crescer. “O Brasil não precisa de capital estrangeiro. Definitivamente. Mas precisa, sim, de tecnologia estrangeira”, pondera.
Assista um trecho da palestra clicando na imagem:
Na visão do professor Gilberto Antonio Faggion, que mediou a palestra, no último dia 9, estudar as propostas defendidas pelo economista é uma tarefa importante em meio ao atual cenário de incertezas. “Se estamos em um momento de risco, que já se estende por um bom tempo, é porque não ouvimos muito as pessoas. É interessante a teoria que ele propõe. Não que ela represente uma redenção. Talvez abra um pouco os olhos de quem tem o poder de tomar decisões”, avalia o professor, que é graduado em Administração de Empresas e Comércio Exterior.
A exemplo de Faggion, Behs também elogia o pensamento de Bresser. O professor de Jornalismo, aliás, mostrou, ao final do evento, que o seu faro de repórter de outrora permanece intacto. “Perguntei se aceitaria um eventual convite para voltar ao Ministério da Fazenda. Ele disse que não, já que os tempos são outros, e que já tem mais de 80 anos de idade”, revela o professor, sem esconder o sorriso.
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“Desde 1980, crescemos muito pouco”, aponta o economista Bresser-Pereira - Instituto Humanitas Unisinos - IHU