Por: Caroline | 10 Julho 2014
O novo beato será o jesuíta Matteo Ricci, um dos pouquíssimos ocidentais homenageados pelas autoridades comunistas chinesas. Contudo o desgelo entre Pequim e a Igreja Romana ainda parece muito distante.
A reportagem é de Sandro Magister, publicada por Chiesa.it, 08-07-2014. A tradução é do Cepat.
Fonte: http://goo.gl/w3v7Rf |
Depois ter canonizado seis novos santos sem esperar que houvesse para cada um deles a verificação de um novo milagre após sua canonização, o Papa Francisco poderá proclamar logo, e de maneira rápida, um novo beato.
Este é o jesuíta Matteo Ricci (1552-1610), genial evangelizador da China.
Matteo Ricci é pertencente à primeira geração da Companhia de Jesus, os prediletos de Jorge Mario Bergoglio, junto a Pedro Fabro, proclamado por ele santo forçando as regras, com a denominada canonização “equivalente”.
Contudo, Papa Francisco tem outra coisa em comum com Matteo Ricci: a predileção de ambos pela Ásia e, em especial, pela China.
Bergoglio sempre apreciou o método adotado por Ricci para anunciar a novidade do Evangelho para uma civilização como a chinesa, muito distante do cristianismo devido sua religião e cultura.
Um método que, paradoxalmente, se parece muito com a intersecção entre fé e razão incansavelmente pregada pelo predecessor do Papa Francisco, Bento XVI, como ilustrou com detalhe nesse sítio o padre Gianni Criveller, missionário em Hong Kong do Pontifício Instituto de Missões Estrangeiras e responsável da causa de canonização de Matteo Ricci:
Ao visitar a Coréia do Sul em agosto, em sua primeira viagem ao Extremo oriente como Papa, Bergoglio deu a entender que, no crescente desenvolvimento do catolicismo nesse país, observava justamente um fruto do método evangelizado de Matteo Ricci.
De fato foram alguns literatos coreanos, convertidos ao cristianismo por missionários europeus que haviam trabalhado na China seguindo Ricci, que introduziram a fé cristã na Coréia no século XVII. E também hoje alguns leigos cristãos são os protagonistas da propagação do Evangelho no país.
Além disso, Francisco tem a esperança de que a beatificação de Matteo Ricci – personagem apreciado pelos chineses de todos os credos, incluindo as autoridades comunistas – possa melhorar as relações entre a China e a Igreja de Roma.
Atualmente estas relações continuam marcadas, por parte da China, pela desconfiança e a hostilidade, com verdadeiros e particulares atos de perseguição da comunidade católica local.
É verdade que, pela primeira vez na história, um presidente comunista chinês, Xi Jinping, tenha respondido por escrito uma carta papal de felicitações por sua nomeação, escrita por Francisco em março de 2013.
Contudo, também é verdade que, por parte da China, pouco ou nada mais de realmente positivo tenha sido feito, além de algum gesto de cortesia protocolar.
Mas justamente o contrário: como a ocasião da morte do bispo “clandestino” José Fan Zhongliang, na diocese de Xangai, as autoridade de Pequim proibiram que o sucessor designado em Roma, Tadeo Ma Dagin, em prisão domiciliar, celebrasse a missa, o que representou uma verdadeira descortesia para o atual pontífice.
O secretário de Estado Pietro Parolin tem uma trabalhosa negociação diante de si. A experiência anterior para melhorar as relações entre a Santa Sé e o Vietnã – um dossiê que tem muitas semelhanças com o chinês – o ensinou que, com Pequim, o trabalho também será longo, tortuoso e incerto até o último instante.
Sobre a especial preferência do Papa Francisco pelo continente asiático, Gerolamo Fazzini – diretor da “Mundo e Missão”, revista missionária europeia mais antiga e importante, e do MissionLine.org, portal do Pontifício Instituto de Missões Estrangeiras – publicou uma análise iluminadora no último número de "Vita e Pensiero", a revista da Universidade Católica de Milão.
A continuidade é publicada na parte final de sua análise, na qual menciona e explica a possível próxima beatificação do jesuíta Matteo Ricci, evangelizador da China.
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Matteo Ricci: Uma ponte entre Roma e Pequim?
De Gerolamo Fazzini
Um ponto de contato valioso no marco das relações entre o Vaticano e a China é (ou ao menos poderia ser) a figura de Matteo Ricci.
Não é um mistério que o jesuíta oriundo de Las Marcas – primeiro estrangeiro enterrado no coração de Pequim por desejo do imperador da época e que continua sepultado ali, na parte posterior de uma escola administrativa do partido comunista – é conhecido na China e também estimado em ambientes católicos.
Basta dizer que na China as pessoas de cultura média, pertencentes a qualquer tradição religiosa, conhecem o personagem de Ricci e sua história, ao menos de uma maneira geral. Não apenas: seu nome aparece no Monumento do Milênio, um enorme edifício que celebra a glória da civilização chinesa. Ali há apenas dois estrangeiros presentes, ambos italianos: um é Marco Polo, na corte de Kublai Khan; e o outro é Ricci, representando em hábitos confucianos enquanto examina o céu.
Agora, o Papa Francisco, primeiro pontífice jesuíta da historia, já demonstrou em várias ocasiões apreciar a missão de Matteo Ricci e seu desejo de querer colocá-la como um modelo também para os dias de hoje.
Para alguns perspicazes observadores como Lucio Brunelli e Gianni Valente, no número de março de 2014 da revista de geopolítica “Limes”, não escapou que a célebre expressão “quase no final do mundo” dita por Jorge Mario Bergoglio na tarde de sua eleição para a cátedra de Pedro para indicar sua procedência representa, não tanto uma referencia geográfica, quanto uma alusão explícita precisamente a “outro grande jesuíta que amava sair dos recintos católicos para ir até as periferias mais extremas do planeta, esse Matteo Ricci que desde Pequim, há quatro séculos, escrevia que se encontrava ‘neste final do mundo onde a obediência me lançou’”.
E há mais. Na entrevista de setembro de 2013 a "La Civiltà Cattolica", pressionado por seu irmão, o também jesuíta Antonio Spadaro, Bergoglio cita algumas das mais significativas etapas da história missionária dos jesuítas. Entre estas – junto ao exemplo de Malabar na Índia e a epopeia das “reduções” do Paraguai, imortalizadas no famoso filme “Missão” – menciona precisamente a extraordinária aventura de Ricci e seus companheiros.
Contudo isto não é tudo. Como observou o vaticanista Luigi Accattoli, uma das passagens mais interessantes do colóquio do último mês do novembro do Papa Francisco com os superiores gerais dos religiosos (também publicado por "La Civiltà Cattolica") está dedicado a Matteo Ricci e seu estilo missionário, que foi durante muito tempo incompreendido e até mesmo combatido.
Aqui as palavras de Bergoglio:
“O carisma não é uma garrafa de água destilada. Deve-se vivê-lo com energia, reinterpretando-o também culturalmente. Contudo ao fazer assim se corre o risco de equivocar-se, de cometer erros. (...) Isto não deve nos frear, porque há o risco de cometer erros maiores. De fato, devemos pedir sempre perdão e olhar com muita vergonha os fracassos apostólicos causados pela falta de valentia. Pensemos, por exemplo, nas intuições pioneiras de Matteo Ricci que, em sua época, foram abandonados”.
Um especialista em Ricci como o padre Gianni Criveller, missioneiro do Pontifício Instituto de Missões Estrangeiras, que presidiu a comissão histórica na fase diocesana do processo de canonização do jesuíta de Las Marcas, comentou na revista "Credere":
“As palavras de Bergoglio sobre Ricci são muito eficazes. João XXIII foi o primeiro Papa que, em 1959, falou de maneira positiva sobre Ricci, retirando-o da sombra da condenação que incidia sobre ele depois do dramático resultado da controvérsia dos Ritos Chineses, que tanto danos causaram para a missão na China. Paulo VI e João Paulo II o reabilitaram totalmente, enquanto Bento XVI é, sem dúvida alguma, o Papa que mais o estudou e melhor o conhece, e que tem falado dele com grande competência e apreço”.
Talvez seja atrevido dizê-lo, mas agora que a causa do grande missionário-intelectual, concluída a fase diocesana do processo, passou por Roma, não parece improvável que o jesuíta Bergoglio conceda um caminho preferencial até os altares a quem não apenas foi um dos homens da maior relevância da Companhia de Jesus mesmo que, de maneira geral, tenha sido um dos protagonistas absolutos da história missionária da Igreja universal.
O precedente de Pedro Fabro – o jesuíta saboiano canonizado em 17 de dezembro de 2013 por intervenção direta do Papa Francisco – autoriza esperar que seja assim. A práxis adotada para o beato Fabro – explicou Stefania Falasca em "Avvenire" – é a da canonização denominada “equivalente”, prática utilizada para figuras de especial relevância eclesial para as quais verificou-se um culto litúrgico antigo difundido e uma fama de santidade e pródigos ininterruptos.
Deve-se dizer que nos desejos de Bento XVI estava também que a beatificação de Ricci pudesse ser realizada ao mesmo tempo que a do mais famoso convertido chinês, Xu Guangqi (o “doutor Pablo”, como é chamado nos escritos jesuítas da época), discípulo também de Ricci e fundador da Igreja católica de Xangai.
Contudo a situação da diocese de Xangai, promotora da causa, é – hoje em dia – muito delicada. Em alguns meses morreram o bispo Aloisio Jin Luxian, jesuíta com mais de noventa anos, reconhecido pelo governo, e o bispo “não oficial” José Fan Zhongliang, também com uma idade avançada, enquanto seu auxiliar e sucessor Tadeo Ma Daqin continua submetido a graves restrições da sua liberdade pessoal.
“É certo que as atuais dificuldades da diocese de Xangai tornam mais lenta e complicada a causa da beatificação de Xu em relação a de Ricci”, admite o jesuíta francês Benoît Vermander, em um artigo publicado no último mês de maio, na página web do Instituto Ricci de Taipei. “Contudo justamente estas dificuldades deveriam empurrar Roma para instruir a causa com maior diligência: há muitos caminhos através dos quais uma causa deste tipo poderia avançar. Já se passaram mais de quatro séculos desde que Ricci chegou ao paraíso. Estou convencido de que esperaria com gosto mais alguns anos com o objetivo de ser reconhecido beato e santo em companhia de seu amigo Xu Guangqi".
"Ricci – insiste o jesuíta – iniciou em sua peregrinação chinesa publicando um pequeno livro intitulado ‘Sobre a amizade’”. Seu processo de beatificação deveria refletir o espírito com o qual realizou seu compromisso missionário. Em outras palavras: não beatifiquei a Matteo Ricci sem beatificar, ao mesmo tempo, a Xu Guangqi".
De acordo com o padre Vermander, são ao menos três as boas razões para unir aos dois amigos em uma causa comum:
“A primeira é que também Xu Guangqi é um homem cuja vida fala de santidade. A segunda é que isto irá mudar o modo como é normalmente apresentada à história missionária. A terceira é que isto seria, sem dúvida alguma, o melhor presente que Roma poderia fazer para a Igreja chinesa e para a China em geral”.
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Francisco guarda um presente para a China: um novo beato - Instituto Humanitas Unisinos - IHU