08 Janeiro 2012
Éric Jaffrain, consultor de marketing de organizações sem fins lucrativos, tendo criado o conceito de gift economy, a economia do dom, faz uma análise de um negócio como nenhum outro, que combina marketing e religião. Jaffrain é autor de La Guérison de l'économie (Ed. Jouvence), que será publicado em 2012.
A reportagem é de Nadia-Moulaï Henni, publicada no sítio da revista Témoignage Chrétien, 28-12-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Você fala da Igreja como um "produto". O que significa?
Há diversos anos, a Igreja (católica) apresenta a religião como se apresenta um produto de consumo, utilizando a abordagem nascida do marketing comercial. A meu ver, trata-se de um erro estratégico fundamental: a Igreja não deve vender a si mesma, mas sim o seu produto central. Não se vende a fé como uma escova de dentes.
A Igreja seria, portanto, uma empresa...
Absolutamente! Mas que não possui clareza na sua visão, na sua missão e nos seus produtos. A sua estratégia de empresa está muito ligada à sua própria marca, à medida que tenta vendê-la como produto central. Hoje, a Igreja defende mais a sua própria empresa do que Deus, no sentido de que a embalagem (ritos, formas de devoção, atmosfera, hierarquia) se torna o modo de consumo inevitável. Nisso, a instituição substituiu a figura divina: acima de tudo, vocês não são fiéis crentes, mas sim católicos.
Por quê?
Porque o pensamento coletivo vem antes da devoção pessoal. Se um padre, por exemplo, quer se expressar de maneira diferente dos procedimentos estabelecidos, a sua iniciativa será limitada, senão impedida pela hierarquização. Todo dignitário católico depende dos seus "superiores", assim como o membro individual desse movimento. Mas podemos dizer que ela também teve os seus "indignados" desde os anos 1980, com o movimento carismático (le Renouveau), que obrigou a uma maior liberdade, como fizeram os jesuítas ou os dominicanos muitos séculos antes. Os dominicanos, recuperados pela instituição, reforçaram o seu poder administrativo.
Esse marketing muito especial não está na base de uma forma de proselitismo?
Em certo nível, sim. Os números recentes mostram isso. No mundo, o catolicismo mostra uma tendência à diminuição, ao contrário do protestantismo e do Islã. Toda a estratégia de marketing consiste em reconquistar "as quotas de mercado" perdidas, com o apoio de campanhas de comunicação, para dar uma imagem jovem e um new look para a instituição. Daí surge uma verdadeira estratégia de marketing implementada com relação aos indivíduos. Uma religião que quer conservar as suas quotas de mercado adota uma linha de conquista, como as empresas concorrentes.
Portanto, fala-se de modos de consumo e de religião...
Esse é o risco. A Igreja, como qualquer outra religião, que vende a si mesma em vez de tornar a espiritualidade acessível, toma o lugar de Deus. Mesmo que não se fale diretamente de marketing comercial, os métodos são extremamente semelhantes: a religião, para manter a sua liderança, multiplicará os modos de consumo: quase inevitavelmente, chegará a propor produtos apelativos, atraentes, populistas, opressivos, para melhorar a instituição, em detrimento do consumo do produto central, ou seja, a fé.
Mas talvez as coisas estejam mudando e obrigarão as religiões à mudança: o cidadão busca se afastar da instituição para estar mais perto de um Deus que ele reivindica ser o seu, antes de ser o da instituição. O produto exigido não é mais a Igreja, mas sim a fé, Deus, Jesus. A sociedade civil se apropria do religioso, que se torna "ecológico". Não nos esqueçamos que o valor de um produto é dado por aquele que o consome, e não por quem o vende. Um produto é "bom" só se, consumido, melhora a opinião e o bem-estar do consumidor.
O mesmo vale para a religião: não é ela que muda interiormente o ser humano, mas sim o que vem do alto. Se a religião não é um "bom produto do alto", ela só tem legitimidade para si mesma. De fato, ela será rejeitada e, com ela, toda a espiritualidade.
E o Islã em tudo isso?
Embora o Islã não tenha uma hierarquia como a Igreja Católica, certos movimentos muçulmanos ou cultura islâmica de certos países têm a mesma tendência para vender a sua ideologia como elemento central, incontornável, para o cidadão, o que dá a sensação de que o Islã também defende o seu próprio âmbito de influência. E, assim como na França antes de 1905 (data da separação entre Igreja e Estado), parece querer ditar as regras dos cidadãos segundo as suas próprias regras.
Daí derivam as polêmicas que o Islã levanta na França e na Europa. O medo de ver surgir um Estado religioso explica os enrijecimentos contra essa religião. Se uma ideologia política, uma religião ou até uma certa economia tenta se impôr na sociedade civil, criará conflitos ou desconfiança. O religioso ou, mais "ecologicamente", o espiritual é necessário para a sociedade, assim como a laicidade. E mesmo que o vertical e o horizontal não tenham os mesmos fundamentos, eles podem se cruzar.
O Islã, talvez, não tem essa abordagem, mas a Europa não entendeu dessa forma. Portanto, essa religião deve tranquilizar e afirmar que as liberdades são respeitadas. Nisso, eu penso que o Islã poderia fazer um verdadeiro marketing. Em compensação, certos movimentos ou eventos islâmicos me fazem pensar nos mesmos comportamentos católicos, que assumem um marketing de conquista, em vez de um marketing do dom.
Muitas pessoas se queixam do aspecto unicamente comercial do Natal. Você concorda?
Sim, o Natal se tornou um negócio antes de ser uma festa religiosa. E isso por duas razões. Em primeiro lugar, a Igreja é responsável por este estado das coisas. Como expliquei anteriormente, como a Igreja não é mais legítima, nem os seus produtos o são, incluindo Natal. Além disso, sendo o Natal uma referência histórica e cultural muito popular, ele foi conservado pela religião... comercial, que busca aumentar o seu volume de negócios. Hoje, as pessoas vivem essa festa sem realmente colocá-la em relação a Cristo. No entanto, a busca de espiritualidade se torna uma forte tendência: busca-se a Deus, mas não na Igreja.
Sim, mas os fiéis, mesmo assim, têm o seu livre arbítrio...
De fato, é por essa razão que é injusto ouvir a Igreja dizer ao mundo secular: "Vocês puseram Jesus para fora", porque a Igreja protegeu o seu âmbito de influência, tornando inacessível a figura de Cristo e a fé. Como todos os consumos devem passar pela instituição, isso suprime a liberdade de crer. Aceitando o Natal como uma festa comercial, o cidadão não manifesta necessariamente uma recusa a acreditar, mas sim uma reação a um poder.
O marketing religioso está, portanto, a serviço de interesses não espirituais?
Com efeito, pode estar. É uma das razões pelas quais o meu conceito de marketing está fundamentado no dom, e não no lucro nem na performance. O espiritual, assim como o secular, pode se legitimar a partir do momento em que não contribui com a economia totalitária que temos atualmente. Os industriários impuseram ao grande público um modo de comprar e de consumir.
A obsolescência programada dos produtos é um bom exemplo disso. Tudo é feito para nos empurrar ao consumo: o cidadão, antes de ser um ser humano, deve ser um consumidor e um objeto de recurso para a empresa. Mesmo usando palavras diferentes, a religião pode se comportar da mesma forma: recrutar praticantes para a sua ideologia e não responder à busca de espiritualidade, de liberdade e de felicidade.
A sociedade está em grave crise e está em busca de si mesma. Ela precisa de cura para os seus cidadãos de uma forma holística, ou seja, nos seus quatro componentes: fisiológico, social, emocional e espiritual. E o componente religioso e pode ajudar no trabalho para a reconciliação do homem consigo mesmo, com os outros e com o divino.
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''A fé não é um produto como todos os outros''. Entrevista com Éric Jaffrain - Instituto Humanitas Unisinos - IHU