21 Agosto 2020
Publicamos aqui o comentário de Enzo Bianchi, monge italiano fundador da Comunidade de Bose, sobre o Evangelho deste 21º Domingo do Tempo Comum, 23 de agosto de 2020 (Mateus 16,13-20). A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Quem é Jesus? Essa pergunta central para a nossa fé, que perpassa todo o Evangelho de formas diferentes, ressoa no texto de hoje precisamente nos lábios de Jesus: a nossa relação com ele, Senhor da nossa vida, depende da resposta a essa interrogação.
Enquanto se encontra em Cesareia de Filipe, cidade situada no extremo norte de Israel, Jesus pergunta aos seus discípulos: “Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?”. Certamente com o título de “Filho do Homem” Jesus pretende se referir àquela figura de Salvador profetizada por Daniel (cf. Dn 7) e esperada pelos fiéis de Israel para o fim dos tempos.
Mas é importante notar que, desse modo, ele também se distancia misteriosamente de si mesmo, falando de si mesmo como de um outro, na terceira pessoa, sem qualquer autorreferencialidade...
Os discípulos relatam a opinião corrente que via em Jesus um profeta (cf. Mt 13,57; 14,5): segundo alguns, ele seria João Batista ressuscitado dos mortos, como Herodes já havia defendido (cf. Mt 14,2); segundo outros, seria o novo Elias, o grande profeta arrebatado por Deus ao céu (cf. 2Rs 2,1-18); segundo outros ainda, nele reviveria Jeremias, o profeta duramente perseguido pela classe sacerdotal do seu tempo.
Todas as respostas contêm uma parte de verdade, mas ainda são insuficientes para explicar a novidade, a singularidade de Jesus.
É por isso que o próprio Jesus pergunta diretamente aos discípulos: “E vós, quem dizeis que eu sou?”. É uma pergunta feita em tom confidencial àqueles que estão mais intimamente envolvidos com ele e, portanto, deveriam conhecê-lo em profundidade, muito além da opinião popular.
Apenas um deles, Simão Pedro, responde sem hesitação: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”. Ou seja, ele reconhece em Jesus o Cristo, ou seja, o Messias, o Rei de paz e de justiça esperado por Israel em favor de toda a humanidade; não só isso, discerne nele o Filho de Deus, ou seja, o revelador último e definitivo do Pai aos homens e mulheres (cf. Jo 1,18).
Na cidade que leva o nome de César, aquele que se fazia chamar de Deus e Senhor, Pedro expressa a confissão de fé que capta em plenitude a identidade de Jesus...
Ele faz isso não na qualidade de “porta-voz” dos Doze, mas sim movido por uma força interior, por uma revelação que só lhe podia vir de Deus, como Jesus sabe reconhecer: “Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi um ser humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu”.
E é precisamente como destinatário desse dom de graça que Simão recebe de Jesus um novo nome, Kefa, Pedro, acompanhado de uma missão precisa: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja”, imagem que remete à pedra de fundação do templo, “e o poder do inferno nunca poderá vencê-la” (cf. Is 28,14-18).
Pedro é proclamado por Jesus o fundamento da sua comunidade, a Igreja, e rocha capaz de confirmar os irmãos e irmãs na fé (cf. Lc 22,32): é somente por essa vontade do Senhor, não em virtude dos seus dotes pessoais, que ele aparece como “primeiro” na lista dos Doze (Mt 10,2) e recebe do próprio Senhor a autoridade de governo (as chaves do Reino: cf. Is 22,22) e a disciplinar (o poder de ligar e desligar).
Pedro não estará isento de erros e quedas: pelo contrário, como veremos na continuação imediata do nosso trecho, de rocha sólida ele se tornará pedra de tropeço, e por causa dos seus sentimentos mundanos será até chamado por Jesus de “satanás” (Mt 16,18).
Mas isso não deve nos escandalizar nem nos induzir a diminuir a autoridade de Pedro. Pelo contrário, devemos nos maravilhar com a extraordinária condescendência com que Jesus confiou a ele, homem pobre e frágil, o ministério decisivo para a comunhão e a unidade da Igreja; e, ao mesmo tempo, recordar que, na comunidade cristã, a autoridade só pode ser exercida conformando-se ao sentimento de Cristo, a única verdadeira Rocha sobre a qual se funda a Igreja (cf. 1Cor 3,11; 1 Pd 2, 4-8)!
O diálogo entre Pedro e Jesus desemboca no silêncio imposto por este aos discípulos a respeito da sua própria qualidade messiânica. Desse modo, Jesus pretende cavar nos nossos corações o espaço para a pergunta decisiva: que tipo de Messias ele é? O que significa que ele é o Cristo?
Será ele mesmo quem no-lo revelará, com palavras surpreendentes e “escandalosas”...
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Pedro, a rocha da fé no Cristo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU