29 Mai 2020
Publicamos aqui o comentário de Enzo Bianchi, monge italiano fundador da Comunidade de Bose, sobre o Evangelho deste domingo, solenidade de Pentecostes, 31 de maio de 2020 (João 20,19-23). A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A festa de Pentecostes é o cumprimento do mistério pascal: as energias do Ressuscitado se derramam sobre a sua comunidade, que, graças ao Espírito Santo, confessa Jesus Cristo como Filho de Deus e Senhor (cf. 1Cor 12,3) e o testemunha na companhia dos homens e mulheres.
É por isso que o trecho proposto pela Igreja para a nossa meditação, a conclusão do quarto Evangelho, nos apresenta o dom do Espírito feito pelo Ressuscitado aos seus discípulos. Nessa página, há o cumprimento de uma expectativa que atravessa todo o Evangelho.
O Espírito, amor do Pai, desce sobre Jesus na forma de uma pomba no momento do batismo, como atesta João Batista, que acrescenta: “Aquele que me enviou a batizar com água disse-me: ‘Aquele sobre quem vires o Espírito descer e permanecer, é ele quem batiza com o Espírito Santo” (cf. Jo 1,32-33).
Essas palavras despertam a expectativa dessa imersão definitiva no Espírito por parte de Jesus, expectativa despertada novamente um pouco mais adiante pelo evangelista: “Aquele que Deus enviou fala as palavras de Deus, pois ele dá o Espírito sem medida” (Jo 3,34).
Jesus mesmo, no último e solene dia da Festa das Cabanas, de pé no templo, grita: “Se alguém tem sede, venha a mim, e beba quem crê em mim, conforme diz a Escritura: ‘Do seu interior correrão rios de água viva’” (Jo 7,37-38; cf. Is 55,1-3; Ez 47,1-12; Zc 13,1; 14,8).
E aqui, novamente, o autor do Evangelho comenta, com a sua costumeira inteligência espiritual: “Ele disse isso falando do Espírito que haviam de receber os que acreditassem nele; pois não havia ainda o Espírito, porque Jesus ainda não fora glorificado”.
Mais uma vez, nos “discursos de despedida” (cf. Jo 13,1-16,33), antes de passar deste mundo ao Pai, Jesus promete repetidamente aos seus discípulos que não os deixará órfãos: eles não deverão temer nada, porque Jesus rezará Pai que enviará no seu Nome o Espírito Consolador, que lhes ensinará toda as coisas e os guiará à plena verdade; ou seja, os conduzirá a fazer memória de toda a vida de Jesus e a assumi-la em profundidade, até torná-la a fonte da sua própria vida.
E eis que chega, pontualmente, a realização da promessa. Jesus profetizara várias vezes que chegaria para ele a hora da elevação, da glorificação: pois bem, elevado na cruz, depois de ter pronunciado a sua última palavra – “Tudo está consumado!” –, Jesus, “inclinando a cabeça, entregou o espírito” (Jo 19,30).
Para o quarto Evangelho, o momento da morte de Jesus, na verdade, é mais do que nunca a hora em que ele age como Aquele que vem e, repleto da glória de quem ama até o fim, faz o dom definitivo, aquele que dá início aos últimos tempos: Jesus dá o Espírito Santo à Igreja que está aos pés da cruz, representada pela sua mãe e pelo discípulo amado, e também o dá a toda a humanidade hostil ou indiferente a ele.
Como confirmação do cumprimento ocorrido, o evangelista atesta que “um soldado golpeou-lhe o lado com uma lança, e imediatamente saiu sangue e água” (Jo 19,34), o sangue da aliança e a água sinal do Espírito...
Mas Jesus quer que o dom do Espírito seja acolhido conscientemente pela sua comunidade, dispersada na hora da cruz. Por isso, na noite do dia da ressurreição, manifesta-se aos discípulos fechados no seu medo, volta a assumir o lugar central que cabe ao Senhor e anuncia-lhes a sua paz, aquela que o mundo não pode dar.
Por fim, depois de mostrar as feridas do amor que permanecem indeléveis no seu corpo, “soprou sobre eles”, gesto que marca uma nova criação (cf. Gn 2,7) “e disse: ‘Recebei o Espírito Santo’”. O dom é ao mesmo tempo responsabilidade, tendo em vista a missão essencial confiada por Jesus à Igreja: remitir, perdoar os pecados a todos os homens e mulheres, sem excluir ninguém. Sim, “o Espírito Santo é a remissão dos pecados”, como diz uma bela oração litúrgica.
Neste dia de Pentecostes, enquanto fazemos memória de toda a vida do Senhor Jesus que resultou no dom do Espírito, devemos invocar esse mesmo Espírito para que ponha em nós o seu fruto por excelência: a capacidade de fazer gestos concretos de perdão e de reconciliação nas nossas relações cotidianas.
Isso é viver como con-ressuscitados com o Senhor e ser na história testemunhas credíveis do grande dom do Espírito Santo.
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Onde está o Espírito Santo, aí está o perdão - Instituto Humanitas Unisinos - IHU