16 Março 2018
De Noé até Jesus, Deus multiplicou as alianças com o seu povo. Alianças da parte de Deus alianças sempre generosas, mas inúmeras vezes ignoradas ou rompidas pelo povo. Então, Deus prometeu a Jeremias a Aliança das alianças: perpétua e impressa no fundo dos corações.
A reflexão é de Marcel Domergue (+1922-2015), sacerdote jesuíta francês, publicada no sítio Croire, comentando as leituras do 5º Domingo da Quaresma, do Ciclo B. A tradução é de Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.
1ª leitura: Concluirei nova aliança com a casa de Israel e não mais lembrarei o seu pecado (Jr 31,31-34).
Salmo: Sl. 50(51) - R/ Criai em mim um coração que seja puro.
2ª leitura: “Aprendeu o que significa a obediência e tornou-se causa de salvação eterna” (Hebreus 5,7-9).
Evangelho: “Se o grão de trigo que cai na terra morre, então produz muito fruto” (João 12,20-33).
Eis o texto.
«Pai, glorifica o teu Nome», diz Jesus no evangelho. Assim, mais uma vez, temos palavras que não dizem grande coisa. Glorificar ainda passa: podemos entender tratar-se de reconhecer que «Deus», «o Pai», só mereça elogios, que podemos colocá-Lo acima de tudo o que temos experimentado; que, diante d’Ele, ficamos boquiabertos, sem palavras. As Escrituras, no entanto, insistem numa palavra: no Nome. O nome é algo tão importante que se torna outro, quando a vida assume um novo rumo, como foi o caso de Simão que virou Pedro. Ora, em Filipenses 2-9, Paulo diz que Jesus recebeu «o Nome que está acima de todo nome». Nome, portanto, que não é um nome como outro qualquer: não é um nome que designe um ser entre outros, mas que o situa fora e acima de tudo. Ainda em Êxodo 3,14, Deus se deu um nome que propriamente não era um nome, e que se tornaria impronunciável: «Aquele que é» ou «Eu sou porque sou», ou «Eu sou Aquele que sou». São Justino explica que ninguém é capaz de atribuir um nome a Deus e que a palavra «Deus» não é um nome. São João da Cruz, em um de seus poemas, nomeia-O como «Este eu não sei o quê». Este Deus aí não poderá distinguir-se dos outros exceto pelo que colocarmos sob esta palavra. A Bíblia emprega-a, dizendo que «o Deus de nossos pais» (aquele que é Origem) é como isto ou como aquilo. Jesus finalmente é quem dará um conteúdo verdadeiro ao Nome divino. Ele o «glorificará». Por isso, o Nome de Jesus receberá a mesma glória, conforme diz Filipenses 2,10.
Diz o evangelho que alguns gregos convertidos ao judaísmo queriam ver Jesus. Ora, em certo sentido, Jesus ainda não estava visível em toda a sua verdade, pois ainda não se revelara tudo o que havia nele: a última palavra sobre o próprio Deus em Si mesmo. Mas eis que, para Jesus, havia «chegado a hora» de «tomar o poder» que até então estivera detido por um soberano perverso: «o príncipe deste mundo». O mundo governado pelo culto a si mesmo e à sua própria glória, pelo gosto do lucro e pela vontade de dominar os outros. Mas o «príncipe deste mundo» vai ser jogado fora. Eis que existe agora no mundo Alguém que, por sua conduta, nega tudo o que representa o príncipe deste mundo. Alguém que vai agora até o fim da sua verdade de Filho, imagem e semelhança perfeita do Pai. Alguém que, agora, vai ser a visibilidade do Deus invisível. E esta espécie de publicidade, de levar ao conhecimento de todos o que até ali estivera confuso e imperceptível, é esta a «glorificação». O Nome do Senhor já havia sido, de certo, glorificado pela Criação («Eu o glorifiquei»), e o será ainda mais, pela Páscoa do Filho («E o glorificarei de novo»). Teremos compreendido que vamos receber a revelação da última verdade sobre Deus. O que ainda, no entanto, só percebemos numa imagem confusa, como que num espelho de má qualidade (1 Coríntios 13,12). Ainda não estamos na visão “face a face”. Busquemos compreender por que.
O conhecimento que podemos ter de Cristo - e, por consequência, de Deus - não pode permanecer puramente intelectual. É verdade que podemos estar convencidos de que ser Deus é dar a própria vida, não colocar o «viver» acima de todas as coisas. Podemos estar persuadidos de que devemos apreciar os outros assim como a nós mesmos. Mas, enquanto nos contentamos somente com isto, a nossa compreensão permanece imperfeita. O que mais é preciso? Seguir o Cristo; passar por onde ele passou. Não estamos todos destinados à cruz, mas temos todos de viver para os outros, até o dia em que também nós conhecermos a morte. A imagem verídica que Deus nos dá de Si mesmo, em Cristo, não nos é imposta. Só podemos apreendê-la se livremente escolhemos e nos pomos a segui-lo, fazendo nossos os seus comportamentos. Acolher o seu Espírito. Esta mesma liberdade reproduz a de Cristo. Em João 10,18 lemos: «Minha vida, ninguém a tira de mim, mas eu a dou livremente: tenho poder de entregá-la e poder de retomá-la.» Quando Cristo vê que lhe querem tirar alguma coisa, antecipa-se ao rapto e, assim, o anula. Dá o que lhe querem tirar. Quem quiser entrar nesta lógica divina, não irá somente compreender o sentido da Páscoa, mas, ainda mais, tê-la-á sempre atual por toda a vida. Só pode verdadeiramente compreendê-la na medida em que revivê-la. A última luz lhe será dada somente na hora da sua morte. Então, retomará a vida que havia dado e, por sua vez, será «glorificado».
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O Deus das alianças - Instituto Humanitas Unisinos - IHU